Preto no Branco

Maria Gal lança talk show antirracista e desabafa: “Democracia racial no Brasil foi lavagem cerebral”

Atriz da novela Poliana Moça, do SBT, fala à coluna sobre estreia como apresentadora no canal pago BandNews TV

Publicado em 26/05/2022

O assassinato de George Floyd, em 25 de maio de 2020, provocou uma mobilização mundial e constante em torno do tema racial. Neste contexto, a atriz Maria Gal, atualmente na novela Poliana Moça (SBT), se lança como apresentadora em um talk show com potências negras. O programa Preto no Branco, que estreia nesta quinta-feira (26) no canal pago BandNews TV, mantém viva a luta antirracista no Brasil, onde casos como o de George Floyd ocorrem quase diariamente.

A coluna entrevistou Maria Gal um dia após a chacina na Vila Cruzeiro, onde 26 pessoas (até a última atualização) foram assassinadas na segunda operação policial mais letal da história do Rio de Janeiro, e antes de Genivaldo Alves ter sido asfixiado até a morte no porta-malas de uma viatura da Polícia Rodoviária Federal, em Sergipe. Dois casos nada isolados do projeto de extermínio da população negra para o qual a luta antirracista tenta alertar e o que motiva a atriz a expandir o tema com seu programa de entrevistas.

“Meu primeiro contato com essa pauta foi no final da adolescência, quando comecei a fazer teatro em Salvador, há mais de 20 anos. Vivemos o mito da democracia racial durante muito tempo. Estamos começando a ver mudanças a partir de 2015 e, mais ainda, só depois do assassinato do George Floyd, e nos Estados Unidos, sendo que aqui a gente sabe a grande mortalidade em relação aos jovens negros. Vemos a adesão de mais empresas, mas é um processo lento. Estamos falando de uma mudança de cultura. Quantos CEOs negros temos no Brasil? Quantos protagonistas de TV negros temos no Brasil? Acredito que é uma pauta que precisa ser levantada e aprofundada na sociedade como um todo para termos uma maior equidade racial. Vejo no assassinato do George Floyd um portal que se abriu para o mundo de que tem que mudar. Não dá para a gente cansar de falar sobre isso, porque realmente é muito injusta a nossa sociedade. Olha o setor audiovisual, o setor da comunicação, o setor político! Mesmo as pessoas mais esclarecidas ou ditas de esquerda, mais progressistas, têm questões em relação ao racismo a serem resolvidas, justamente porque esse mito da democracia racial foi uma lavagem cerebral feita no Brasil”, desabafa a atriz.

Insatisfeita com a falta de espaço para ela e outros talentos negros no audiovisual, Maria Gal decidiu ser a fomentadora de oportunidades ao criar sua própria empresa, Maria Produtora, destinada principalmente a artistas e outros profissionais excluídos do mercado por racismo. Como CEO, idealizou o talk show e bateu na porta de grandes companhias e emissoras atrás de dinheiro e espaço na TV para tirar seu projeto do papel. Preto no Branco quase estreou em outro canal que tentou se apossar dos direitos do programa, e as negociações não avançaram.

“As emissoras querem ter os direitos sobre a obra, e a gente sabe que o audiovisual é uma cauda longuíssima. O fato de o patrocinador ter vindo através de mim e da produtora fez com que a gente tivesse esse patrimônio em relação ao programa. Não posso falar o canal, mas depois fomos para a BandNews. Não abro mão da autonomia, de ter esse lugar de liderança e poder escolher com quem quero trabalhar. Ter representatividade racial por trás das câmeras faz toda a diferença”, explica Maria.

Sob liderança da atriz, Preto no Branco nasce como um dos programas mais inclusivos da TV brasileira no âmbito racial. A equipe é formada por 58% de profissionais negros, e o percentual sobe para 76% entre as mulheres.

“Eu nunca trabalhei em um produção que tivesse essa representatividade! Lembro que fui chamada para uma campanha que falava sobre esse tema, mas eu era a única negra. Toda a equipe era branca, para você ver o tamanho da hipocrisia. Temos diretora negra, roteirista negra, escritor negro, produtores negros, diretora de produção negra, alguns dos ‘cabeças’ da equipe são negros. Não tem como ser diferente. Esses talentos estão aí, sempre existiram. A questão está nas oportunidades que não são nos dadas”, analisa.

Com seis episódios exibidos semanalmente, às 23h30, Preto no Branco abordará o racismo no mercado financeiro e no mundo corporativo, privilégio branco, intolerância religiosa, racismo na publicidade e no esporte. Liliane Rocha, Aranha, Renato Meirelles, Júlio César Andrade, Erica Malunguinho, Gabriela Moura, Felipe Silva e Cláudia Luna estão entre as personalidades entrevistadas por Maria Gal, que deseja continuar como apresentadora em outros projetos.

“Estou humildemente me inspirando na Oprah Winfrey (risos). Espero que tenha segunda, terceira, décima temporadas, que se torne um programa semanal. Eu apresento eventos para empresas, mas é óbvio que na TV é completamente diferente. Quero sim continuar fazendo outros trabalhos como apresentadora e liderar como uma showrunner, que pensa no conteúdo, fala com os roteiristas, também está na produção. É extremamente desgastante, porque são muitas funções, mas gosto de liderar”, conclui.

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