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Judeu em série, ator volta à Globo como nazista em Além da Ilusão: “Eu me senti no filme do Tarantino”

Fluente em alemão, Lucas Drummond comemora papel por falar idioma pela primeira vez em cena

Publicado em 20/04/2022

Em apenas quatro meses, um ator passou de perseguido por nazistas para soldado alemão a serviço de Adolf Hitler. Lucas Drummond estreou na última terça-feira (19) na novela Além da Ilusão, em meio à Segunda Guerra Mundial. O papel marca seu retorno à Globo após a série Passaporte para Liberdade, sobre a história de Aracy de Carvalho e sua atuação no resgate de judeus contra a ditadura de extrema-direita.

Em entrevista exclusiva à coluna, o ator de 30 anos avaliou a coincidência de voltar à guerra, mas do outro lado do conflito: “Eu achei interessante. Em Passaporte para Liberdade eu era da resistência, lutava contra o regime nazista. Desta vez, luto a favor do regime nazista. São duas lógicas completamente diferentes, personagens completamente diferentes, e nós como atores temos que virar a chave, faz parte do nosso trabalho. Foi muito prazeroso. Eu me senti de fato em um filme do Tarantino, como Bastardos Inglórios, e digo isso no melhor dos sentidos, porque não estamos acostumados a interpretar esse tipo de personagem no Brasil, é algo distante da nossa realidade, e as coproduções vêm viabilizando isso. Fiquei muito feliz e empolgado porque é um set diferente, de época, e um desafio muito grande, ainda mais pensar com a cabeça de um soldado nazista na Alemanha durante um regime extremamente autoritário, totalitário, fascista. Há algumas semelhanças com nosso período atual”.

Em sua primeira cena, dirigida pelo cineasta Jeferson De (M8 – Quando a Morte Socorre a Vida e Doutor Gama) o ator encurralou Silvana (Thayla Luz), jovem da Resistência Italiana que tentava salvar Bento (Matheus Dias). Ela finge ser enfermeira socorrendo um homem com tifo. Sádico, o nazista aponta a arma para a mulher e ri com sarcasmo, mas vai embora sem feri-la. Uma curiosidade: Lucas Drummond é fluente em alemão e falou o idioma pela primeira vez em cena, qualidade fundamental para conquistar o papel na novela das seis.

“Estudei em uma escola alemã a vida inteira e aprendi a falar alemão ainda criança. Inclusive, no último ano, fiz o vestibular alemão que me possibilitava fazer uma universidade lá fora, mas já tinha começado a trabalhar em musicais e, por isso, não fui. Também falo inglês, francês e espanhol. Fiquei sabendo [do papel] por outro amigo ator e mandei uma mensagem para o Fábio Zambroni [produtor de elenco]. Dois dias depois, ele já me chamou para a participação. Foi muito legal, porque pela primeira vez pude usar o alemão, que nunca tinha usado profissionalmente. Não é todo dia que a gente tem um trabalho em outra língua”, comemora o ator, que falou em inglês em Passaporte para Liberdade.

A “fluência” em armas, no entanto, é nula. Antes de interpretar o nazista, Lucas teve ajuda da equipe de preparação de elenco da novela e do Exército brasileiro para transformas as cenas de guerra imprevisíveis como em uma batalha real.

“Nunca tinha pego uma arma antes. Tive que aprender na hora porque é um personagem que já está acostumado a fazer isso diariamente, mesmo que não por vontade própria. Toda cena com arma tem um consultor, geralmente do Exército, que diz aos atores como segura, como atira, como carrega. Sobre esse ponto de vista, estávamos muito bem amparados, mas, ao mesmo tempo, há outro lado muito interessante. A maior parte dos jovens foi convocada para a guerra sem saber, muitos caíram por acaso e tiveram que lidar com aquela situação extremamente opressora e difícil. Foi muito interessante, porque é a oportunidade de fazer um personagem mau, que para qualquer ator é um presente, vilões sempre são mais interessantes”, analisa.

Lucas Drummond no curta-metragem Depois Daquela Festa
Lucas Drummond no curta-metragem Depois Daquela Festa

Musicais e filme premiado

Lucas Drummond consolidou sua carreira artística no teatro, em musicais como Gypsy, Chacrinha – O Musical e Chaves – Um Tributo Musical, vencedor de cinco prêmios Bibi Ferreira, um dos mais importantes do segmento. Na TV, começou em 2013, na série Questão de Família (GNT), e acumulou pontas em Malhação e Órfãos da Terra, ambas novelas da Globo.

No cinema, um de seus papéis mais lembrados é o de Aécio Neves em O Paciente – O Caso Tancredo Neves. O ator também se aventura atrás das câmeras. Como roteirista, assinou o curta-metragem Depois Daquela Festa, que participou de 62 festivais em 26 países diferentes. O sucesso do filme surpreendeu Lucas, que celebra o lançamento da produção no Telecine e no Globoplay, disponível desde 9 de abril.

“Foi meu primeiro projeto como roteirista, produtor e protagonista em cinema. Escrevi junto com a Mel Carvalho em 2018, rodamos no final de 2018 e estreamos em 2019. Superou todas as nossas expectativas! Ganhamos nove prêmios, inclusive o meu primeiro de melhor ator. Meu personagem, Leo, descobre que o pai é gay depois de vê-lo beijando um homem em uma festa. O Leo aceita o pai desde o início, mas não sabe como contar a ele o que viu. É um filme sobre amor, aceitação, respeito e união entre pai e filho. Geralmente vemos filmes em que os jovens se assumem para os pais, e dessa vez é um pai que precisa se assumir para o filho. Foi o que chamou a atenção dos festivais, e poder estreá-lo na TV e no streaming comprova que é possível fazer um projeto independente, de qualidade e atingir o grande público. Fizemos por financiamento coletivo, 126 pessoas doaram dinheiro e acreditaram na ideia. Depois Daquela Festa tem um lugar muito especial na minha carreira e no meu coração. Perdi meu pai em março de 2019, antes de estrear, e o filme tem um valor ainda mais significativo para mim por causa disso. Acredito que tem uns dedinhos dele lá em cima”, lembra, emocionado.

O próximo projeto audiovisual é o curta Todos os Prêmios que Eu Nunca te Dei, que será lançado no Festival de Cinema LGBT da Polônia, um dos maiores do gênero na Europa. A temática da diversidade sexual não é coincidência. Ativista da causa LGBTQIAP+, ele namora o ator, diretor e roteirista Vitor Rocha, dos espetáculos Bom Dia Sem Companhia e Cargas D’Água – Um Musical de Bolso (vencedor do Bibi Ferreira). Atualmente, ele escreve a primeira novela independente para o streaming, Um Trem no Peito (título provisório), dirigida pelo ex-global Pedro Vasconcelos. Será que, após a experiência em Além da Ilusão, Lucas tem espaço na trama do companheiro? A coluna provocou, e o ator respondeu com elegância.

“Acho o Vitor um cara extremamente inteligente, um grande artista, admiro muito o trabalho dele. Inclusive, essa admiração é uma das coisas que temos em comum, acho que temos essa trajetória mais autoral e acho que isso aproximou a gente. Acredito que admirar profissionalmente a pessoa com que você está é extremamente importante. Ele conseguiu coisas muito significativas com a idade que ele tem [24 anos]. Certamente, se tiver espaço para mim e ele me quiser nesse projeto, e se o Pedro Vasconcelos, que dirige o projeto, me quiser e a gente conciliar as agendas, vou amar fazer. Ele está construindo um universo lindo para a novela e acho que vai ser uma obra de muito sucesso. Se houver espaço, se ele e o Pedro me quiserem e a gente conseguir fazer dar certo, vai ser um trabalho que vou ter um prazer gigantesco de fazer”, conclui Lucas Drummond.

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