Crítica

‘The Last of Us’, da HBO Max, continua escorregando, entretanto, acerta ao pontuar as angústias do crescimento em um meio polarizado

Roteirista também abordou um dos problemas do capitalismo na sociedade

Publicado em 02/03/2023

Assim como A Casa do Dragão – spin-off de megassucesso da HBO – observamos The Last of Us, caminhando pelas mesmas vias, ou seja, é bom abrir o olho, pois nem tudo é só mil maravilhas, como se imagina.

Tal comparação deve ser justificada, lembrando que a série derivada de Game of Thrones, contém no cerne da narrativa, assuntos e temáticas de maior profundidade e complexidade, porém, existe uma ação sistemática viciosa que acaba por dissolver algumas destas potências em frivolidades, muito pela falta de empenho em como dissertar assertivamente tais conceitos.

É (quase) inquestionável fugir daquilo que está sendo transmitido pelos atores do elenco, todavia, percebemos que muito do que tiramos dali, surge mais pelo talento individual e coletivo daqueles em cena, do que pelo texto que acerta na argumentação, mas mostra deficiências na abordagem.

The Last of Us 1
The Last of Us

Os problemas do capitalismo

Toda vez que faz-se qualquer crítica ao sistema capitalista, assim como também ocorre quando apontamos as falhas da filosofia socialista – sendo ambas baseadas pela subjetividade humana – encontramos uma forma de gritaria que busca defender, em alguns casos, a qualquer custo, aquilo em que se baseia a sua vida, assim como a de outros próximos, que também partilham do mesmo ideal de como deveria ser a trajetória da vida humana.

Se mantivermos a interlocução dos lados, apenas baseados na prática de desmentir e punir o outro, usando das variáveis daquilo do que pode ser considerado certo ou errado, sempre cairemos no mesmo poço, onde gritamos para o alto: desamparados e imóveis.

Dito isso: é importante pontuar uma crítica cirúrgica a uma característica do capitalismo, existente no episódio mais recente de The Last of Us, ‘O Que Deixamos Para Trás’. Um ótimo título para explicar o que, literalmente, ficou para trás.

The Last of Us 2
The Last of Us

No atual capítulo, somos transportados por um flashback, de pouco antes da história de Joel (Pedro Pascal) e Ellie (Bella Ramsey) começar, quando a jovem garota tem uma noite de diversões em um shopping abandonado, junto de sua melhor amiga Riley (Storm Reid).

Quando temos ambas, caminhando pelos halls do shopping, constatamos algumas dúvidas de uma sempre curiosa Ellie surgindo, como por exemplo, quando ela notou que algumas lojas do complexo estavam vazias, enquanto outras, não. Mais especificamente: uma loja que vende marcas de tênis, toda saqueada; em contrapartida, com uma butique que vende sabonetes (produtos para higienização) quase cheia de produtos nas prateleiras.

Riley pontua que quando houve o surto, pessoas saiam enlouquecidas saqueando as coisas que mais precisavam ou aquilo que mais queriam. É por essa frase – além da alegoria de testemunharmos um shopping center completamente largado às traças, com seus adesivos de empresas de cartões de crédito nas vitrines – que pegamos o comentário crítico, roteirizado por Neil Druckmann em The Last of Us, que diz sobre a distorção de valores que vivemos sobre o regime capitalista, que alterou a nossa percepção do que queremos com aquilo do que realmente (mais) necessitamos, assim como a realidade do que representa uma maior relevância prática e espiritual em um mundo moderno.

The Last of Us 3
The Last of Us

Crescendo no meio polarizado

Existe um conceito bem complexo que foi apresentado em ‘O Que Deixamos Para Trás’, que vê as duas garotas, Ellie e Riley, vivendo em lados opostos. A protagonista principal da série dramática pós-apocalíptica da HBO Max, está sendo treinada pela Escola Militar da FEDRA, que está em oposição aos Vaga-lumes, um grupo rebelde, que atua pela libertação do povo, que agora conta com Riley, como novo membro.

Ao invés, do texto do atual episódio, ficar jogando argumentos de cada um dos lados para ver no final, qual deles se sai vencedor, temos algo muito mais maduro, que nos leva ao questionamento de nossa condição recente, perante tamanho barulho, que nos soterra em informações e desinformações, exaltando nossa vontade mais humana: a chance de pertencer a algo para que nos sintamos menos sozinhos, diante o fim que se aproxima.

Pena que, apesar da boa argumentação, ainda podemos sentir aquela já conhecida manobra que temos visto, cada vez mais em evidência por esta primeira temporada, que cria situações manipuladas demais – além de muito repetidas – para que nós, assinantes da HBO Max, nos mergulhemos em comoção fabricada, ainda mais, tendo no centro deste capítulo, duas crianças que ainda não tiveram a chance de viver em uma realidade mais iluminada do que aquela que assolou a humanidade no século XXI.

Real, injusta, mas em The Last of Us, lamentavelmente, plástica demais.

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