As declarações homofóbicas de Sikêra Jr. podem trazer à RedeTV! um prejuízo maior do que o financeiro, após empresas cancelarem contratos de patrocínio em função de falas preconceituosas durante o programa Alerta Nacional. A emissora corre o risco de sair do ar como em 2005, quando foi punida pela Justiça após exibir pegadinhas que incentivavam a violência contra a população LGBTQIA+.
Veja também:
- Sikêra Jr abre o jogo sobre a sua demissão polêmica da RedeTV!: "Não tenho mais nada pra conversar com eles"
- Terra e Paixão cancela trama lésbica, diz atriz; em 2023, Globo cortou histórias gays de três novelas
- B.A.: O Futuro Está Morto, série baseada na graphic novel O Beijo Adolescente, já está disponível na HBO Max
Esta é a avaliação do coletivo Intervozes, que atua pelo direito do ser humano à comunicação e teve papel fundamental na punição à RedeTV! há 16 anos, quando foi acionada pelo Ministério Público em decorrência de pegadinhas exibidas no programa Tarde Quente, de João Kleber, com agressões a atores caracterizados como gays.
Na ocasião, seis entidades se uniram ao MP em uma Ação Civil Pública exigindo uma indenização de R$ 20 milhões por violação de direitos humanos, a suspensão do Tarde Quente por 60 dias e a exibição de programas sobre diversidade e respeito às diferenças. Mesmo derrotada na Justiça, a RedeTV! descumpriu a decisão e teve seu sinal cortado em 14 de novembro de 2005, véspera do aniversário da emissora, que comemorou seu sexto ano de inauguração fora do ar.
Ouvidos pela coluna, dois fundadores do coletivo Intervozes que participaram ativamente do embate contra a RedeTV! consideram a homofobia de Sikêra Jr. mais grave do que a do programa de João Kleber, pelo fato de a emissora ser reincidente, ou seja, passível de punição semelhante ou pior à determinada pela Justiça em 2005.
Coordenadora do Intervozes, Iara Moura afirma à coluna que o coletivo atuará contra a violação de direitos humanos praticada por Sikêra Jr.: “Estamos mantendo contato com o Ministério Público. Não sabemos se vamos entrar no caso como amicus curiae [“amigo da Corte”, colaborador da Justiça], mas fazemos monitoramento permanente nos casos envolvendo este apresentador”.
Na última segunda-feira (28), o Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública contra Sikêra Jr. e a RedeTV! por falas discriminatórias contra a população LGBTQIA+ em 25 de junho. O apresentador, ao criticar uma campanha publicitária da rede Burger King contra a LGBTfobia, relacionou a homossexualidade a pedofilia e uso de drogas. O MPF e o coletivo Nuances pedem R$ 10 milhões de indenização por danos morais coletivos (valor a ser destinado à estruturação de centros de cidadania LGBTQIA+).
Em 4 de junho, outra ação do MPF exigiu de Sikêra Jr. o pagamento de R$ 2 milhões a serem revertidos a entidades representativas feministas, além de R$ 200 mil a uma mulher discriminada por ele no programa Cidade em Ação, da TV Arapuan (afiliada da RedeTV! na Paraíba), em 2018. O canal cumpriu parte do acordo e exibiu vídeos educativos contra a violência à mulher, porém o apresentador não pediu desculpas pelas declarações preconceituosas e migrou para a TV A Crítica, onde transmite ao vivo programa Alerta Nacional pela RedeTV!.
“Ele escolheu se colocar a favor da morte. Foi explícito nas palavras, disse que ‘se tivesse um filho veado, mataria’. No país que mais mata travestis e pessoas trans, em um momento de pandemia e do crescimento do discurso de ódio contra a população LGBTQIA+, ele abre precedentes ainda mais perigosos. Todas as notícias que vemos de pais que matam filhos por causa da orientação sexual e identidade de gênero, todas as travestis e trans assassinadas nas ruas e têm o direito à vida negado, com certeza encontram um incentivo no discurso do Sikêra na TV aberta, que alcança milhões de brasileiros. Ele comete esse discurso com intenção, e precisamos cobrar respostas sobre essa responsabilidade. Não é à toa, não é por erro, senão não seria recorrente. É diário, é um modelo de negócios muito lucrativo que traz a ele diversos ganhos financeiros”, critica a coordenadora do coletivo Intervozes.
No Twitter, o perfil Sleeping Giants Brasil mobilizou seus seguidores a pressionarem empresas que patrocinam o Alerta Nacional a partir da tag #desmonetizasiqueira. Tim, Ford e MRV cancelaram campanhas e contratos veiculados na TV ou na internet associadas ao apresentador. Outro patrocinador é o governo federal. Apoiador de Jair Bolsonaro, Sikêra faturou R$ 120 mil para, em tese, conscientizar a população sobre o coronavírus. Na prática, criticou o distanciamento social e desestimulou a vacinação.
Siga o colunista no Twitter e no Instagram.