Crítica de TV

“Novela das sete exibida às seis”, Elas por Elas acerta em atualização de clássico dos anos 1980

Releitura mantém o espírito da obra original, declara a autora Thereza Falcão

Publicado em 28/09/2023

Desde as chamadas, ou mesmo desde a própria notícia de que a substituta de Amor Perfeito seria uma atualização de Elas por Elas, de Cassiano Gabus Mendes, não faltou quem dissesse que seria “uma novela das sete exibida às seis”. Afinal, este foi o horário da exibição da versão original, de 1982. Ao longo de décadas, a TV Globo marcou as características de cada um de seus horários de teledramaturgia, o que faz com que chamem a atenção quaisquer alterações nesse esquema, por mais sutis que sejam, ou até que causem algum estranhamento.

Mais de 40 anos depois da primeira novela, Elas por Elas é agora recontada por Thereza Falcão e Alessandro Marson, com os personagens inseridos num contexto apropriado para os nossos dias e, tão importante quanto isto, uma narrativa que explica e apresenta pontos apenas citados, ou nem isso, na versão original. Também é válido ressaltar a abordagem da representatividade através da personagem Renée (Maria Clara Spinelli), que quando a trama se inicia – 1998 – ainda não havia feito sua transição de gênero (Shi Menegat).

Os fãs mais puristas da novela dos anos 1980 – e também algumas pessoas que reclamam por esporte, sem nem saber bem por que ou do que reclamam – não gostaram de saber que os nomes de algumas das “sete amigas protagonistas” seriam trocados. Pudera, nem todos os nomes dados por Cassiano a suas personagens estão em voga hoje para mulheres na casa dos 40 anos, ou seja, nascidas mais ou menos quando Elas por Elas foi ao ar pela primeira vez.

Se Eva Wilma foi Márcia em 1982, Deborah Secco foi rebatizada Lara; a Marlene de Mila Moreira passou a Maria Carolina, Carol, com Karine Teles; além da própria Renée, que com Maria Helena Dias quatro décadas atrás, tempos em que era uma mulher cisgênero, tinha o nome de Carmem.

Também há quem tenha reclamado do fato de que Wanda (Sandra Bréa) era branca na primeira novela e passou a ser negra nesta segunda, interpretada por Késia. Assim como negra é agora toda a família, que tem em Lázaro Ramos o intérprete do mais representativo personagem do folhetim, o atrapalhado detetive particular Mário Fofoca – eternizado em criação de Luís Gustavo.

É sempre lembrado o caso de A Viagem, cuja segunda versão foi levada ao ar pela TV Globo em sua faixa das sete, no ano de 1994. Embora houvesse um núcleo mais descontraído – o da pensão de Cininha (Nair Bello) -, a tônica maior e geral do enredo era espiritualista, séria, quando muito romântica.

Ivani Ribeiro desenvolveu o projeto para exibição no horário das 20h pela TV Tupi, em 1975-1976, não custa lembrar. No entanto, a história ser levada ao ar às sete pela Globo em nada atrapalhou sua trajetória de sucesso – ao contrário, deve até tê-la favorecido. E isso que o martelo pelo horário só foi batido a semanas da estreia, quando ainda havia dúvidas entre quem sabe levar A Viagem ao ar às seis horas, deixando a faixa seguinte para Tropicaliente, de Walther Negrão.

Com Elas por Elas ocorre algo semelhante. Depois de várias novelas de época – ou de época indefinida devido a diversos elementos, como Mar do Sertão (2022-2023), de Mário Teixeira – com personagens importantes focados em vinganças por terem sido presos injustamente, sido humilhados por toda a vida, perdido os amores ou tudo isso junto, uma lufada de atualidade e modernidade na faixa das seis vem justamente de um projeto que parte de outro criado há 40 anos.

Por que não apostar numa novela como Elas por Elas às seis? É um bom horário para abordar as trajetórias de várias mulheres na casa dos 40, com seus amores, filhos, problemas, sonhos e obstáculos, unidas por um passado em comum e as novas possibilidades que um reencontro apresenta.

“Estamos fazendo uma releitura que mantém o espírito da novela original, de leveza e de comédia. Temos sete protagonistas mulheres entre 40 e 50 anos, diferentes entre si, mas que agora são mulheres atuais, mais independentes e atuantes em seus campos profissionais. Essa é uma das grandes mudanças da nova leitura: os perfis das protagonistas e o lugar que essas mulheres ocupam na sociedade. Também vamos ter mais romance do que tínhamos na novela original por agora ser uma trama das seis horas”, declarou a autora Thereza Falcão por ocasião da estreia da produção.

As molas-mestras das vidas das amigas foram basicamente mantidas: uma, sem saber, era amante do marido da outra, que organiza o reencontro; uma terceira reencontra uma quarta, de quem tomou o noivo ao engravidar dele propositalmente; há a que acusa as outras seis pela morte do irmão. Dentro dos limites de cada horário, nada impede que esse engessamento de drama de época às seis, comédia às sete, seja quebrado. Há momentos em que deve ser, inclusive. O atual parece ser um deles.

As informações e opiniões expressas nesta crítica são de total responsabilidade de seu autor e podem ou não refletir a opinião deste veículo.

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