Pobre menina rica

Faltou um bom repórter investigativo no documentário sobre Britney Spears

Produção tem chancela do jornal The New York Times, mas não traz luz sobre o estranho caso da tutela financeira do pai sobre a cantora

Publicado em 24/03/2021

Veja só a falta que faz um bom repórter de celebridades. Quem assistir ao documentário Framing Britney: A Vida de Uma Estrela, no catálogo do Globoplay, fica sabendo de toda a história de Britney Spears e os problemas que ela enfrenta atualmente com o pai. Mas também vai perceber como o trabalho de um jornalista investigativo, daqueles que correm atrás de fontes e buscam informações de bastidores, seria útil numa obra destas.

Britney Spears é rica e ainda ganha muito dinheiro com seus direitos de música e imagem e com os shows que está apta a fazer. Mas é mantida pela Justiça há 12 anos sob tutela do pai, Jamie Spears. É ele quem administra sua vida e suas finanças, usando ainda o dinheiro dela para também pagar seus próprios advogados, que o garantem nessa situação confortável.

A cantora, que é mãe de dois jovens, tem permissão para trabalhar e faturar, mas não pode cuidar do dinheiro que ganha. Como a Justiça mantém uma situação tão absurda dessas é um caso pra lá de estranho, sobre o qual o documentário se limita a descrever sem conseguir avançar.

Fãs perplexos

O resultado é que o trabalho causa perplexidade nos fãs e deixa todo mundo sem respostas importantes. São os fãs da popstar que lideram o movimento #FreeBritney os únicos que no momento parecem defender a liberdade da estrela pop.

O programa é mais uma biografia, fazendo uma colagem dos acontecimentos da trajetória da vida e arte da cantora, todos já amplamente divulgados pela mídia ao longo dos anos. A obra não consegue trazer nenhuma informação nova, nenhum bastidor, nada além do que já foi noticiado.

É apenas um resumo de tudo, incluindo a perseguição implacável dos paparazzi e a espetacularização de sua enfermidade pela mídia. Na sua essência, o documentário de menos de uma hora e meia de duração revê a trajetória de sucesso da cantora.

Britney surgiu no programa infantojuvenil Clube do Mickey, até estourar com o hit ‘Baby One More Time’, no fim dos anos 1990. Em 2001, a cantora veio pelo primeira vez ao Brasil, para o Rock in Rio 3 – isto não é citado no filme, a propósito.

Não seria pedir muito, já que o filme documental foi produzido pela equipe do poderoso The New York Times para a plataforma de streaming Hulu dos Estados Unidos. No entanto, até o jornalista do famoso jornal dá depoimento, fazendo um apanhado da trajetória da cantora, mas sem revelar nada novo, além de admitir que nunca fez qualquer entrevista com ela.

Não por acaso, o centro mais pulsnte da mídia de celebridades dos EUA fica bem longe da sede do The New York Times. É do outro lado do país, em Los Angeles/Califórnia, onde que está baseada a grande cobertura dos famosos, com os sites de fofocas, revistas, emissoras e o famoso portal TMZ, que virou até programa de TV.

Mas ali mesmo em Los Angeles os captadores do documentário só encontraram os fãs, que são os poucos que se mobilizam em prol da tragédia pessoal de Britney, que teve até um pedido de ter advogado próprio rejeitado pela Justiça local.

O documentário dá bastante espaço para a história de vida da estrela, atualmente com 38 anos de idade. Uma ex-assistente, Felicia Culotta, preenche vários minutos com detalhes do começo da carreira – ela é outra que nada consegue acrescentar sobre os problemas atuais.

Também a ex-advogada do pai de Britney Spears trata de contextualizar sua defesa na maior parte do tempo – vemos a nota de esclarecimento ao final do documentário de que ela voltou a defender Jamie após as filmagens.

A popstar em cena do documentário (Reprodução/Globoplay)

Embora Britney Spears tenha sido internada em clínicas de reabilitação, ninguém conseguiu descobrir com nenhum médico, enfermeira, amigos nada sobre as reais condições de saúde e do tratamento da estrela, ainda que fosse o chamado off the record (em condições de anonimato).

Tampouco se procurou explicar a jurisprudência naquele país para casos semelhantes ou se elucidar por que a cantora não consegue ter advogado próprio em sua causa, já que é considerada capaz para trabalhar.

Como os participantes do BBB 21 já tiveram acesso à atração, numa sessão de cinema para o líder Gilberto, é provável que por aqui haja uma corrida ao documentário. O próprio Fantástico, da Rede Globo, promoveu o conteúdo no último domingo (21), sem também conseguir acrescentar mais informações ao drama vivido por Britney.

Há no final a observação de que todas as pessoas que foram procuradas para dar entrevista ao documentário não concordaram, incluindo os familiares e o ex-marido de Britney Spears (pai de seus filhos), Kevin Federline.

Num período de pandemia, quando há poucas novas produções audiovisuais importantes por conta da paralisação dos trabalhos no mundo todo, um programa destes tem muita repercussão.

Vale também lembrar casos como o de Jeffrey Epstein, que explorava sexualmente menores de idade, cujas investigações foram impulsionadas depois que viraram temas de documentário da Netflix. Vamos torcer para que pelo menos nisto o documentário sobre Britney a ajude. Os fãs agradeceriam.

*As informações e opiniões expressas nessa crítica são de total responsabilidade de sua autora e podem ou não refletir a opinião deste veículo.

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