O ano era 1988 e a Antarctica, então uma das principais marcas do mercado brasileiro e do mundo, criou uma campanha gigantesca que envolvia troca de tampinhas de seus refrigerantes numa promoção com prêmios ao público.
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O anunciante contratou simplesmente todo o elenco principal do SBT para estrelar o comercial de lançamento do Festival de Prêmios Antarctica/SBT.
Todo mundo que trabalhava na emissora na época: de Hebe Camargo (1929-2012) a Gugu Liberato (1959-2019), passando por demais nomes de peso como Jô Soares, Carlos Alberto de Nóbrega, Sérgio Mallandro, Mara Maravilha, Wagner Montes (1954-2019), entre tantos outros.
Para dirigir a peça publicitária, a agência Progress Propaganda escolheu o cineasta Carlos Manga (1928-2015), um dos grandes nomes da direção nacional.
E a história dessa saborosa superprodução é mais interessante ainda do que o próprio resultado.
Quem conta tudo é o publicitário, compositor e poeta Fábio Roberto, atualmente Diretor de Marketing e Comunicação na empresa Central Brasileira de Busdoor/OOH.
Ele se lembrou do episódio em uma postagem no Facebook, na página Amigos do Mercado.
Fábio Roberto trabalhava para a house agency da Antarctica como redator e também atendimento, responsável pelos estúdios de criação, produtoras e outras funções.
Ele conta que três grandes produtoras tinham recusado a proposta do trabalho, devido ao pouco prazo para a realização deste comercial, filmado do lado de dentro e de fora do Teatro Cultura Artística (Região Central de São Paulo).
Quando chegou o jingle feito pela empresa MCR, a ideia imediata foi filmar um musical imitando uma entrega de Oscar, com bailarinos e muito público cercando artistas.
A reação de Carlos Manga aos ser convidado foi tocante.
“Os olhos dele brilharam debatendo as ideias. Contratamos toda a equipe de profissionais indicados por ele diretamente, pois a produtora foi a própria agência. Foi uma loucura de movimentação na casa, com dezenas de pessoas novas circulando dia e noite”, contou Fábio na sua postagem.
Tanto o filme quanto a promoção fizeram sucesso, mas a melhor parte é quando Fábio descreve sobre a participação da eterna diva Hebe Camargo:
“Ela desceria a escada do Teatro Cultura Artística em direção ao palco, sendo aplaudida pela plateia, mas o Manga mandou repetir a cena inúmeras vezes”, conta o publicitário.
“Hebe, sem entender a exigência, o atendeu profissionalmente e sem questionamentos”, continua ele.
Fábio relembra que, então, na última vez, Carlos Manga falou pra Hebe que repetira tanto a cena só para ver o público aplaudi-la como ela merecia.
“O teatro veio abaixo ovacionando Hebe, o que foi arrepiante. No comercial a cena é linda e rápida, mas inesquecível para quem acompanhou a filmagem” conta ele.
Veja o comercial a seguir:
Mais detalhes
Entrevistado pela coluna, Fábio deu mais detalhes sobre a filmagem deste comercial que marcou a televisão.
A promoção tinha uma mecânica que era mais ou menos assim: o público comprava os refrigerantes, juntava tampinhas, trocava por cupons, preenchia uma frase sobre as bebidas e sobre os programas do SBT, e concorria a vários prêmios. Era esse o Festival de Prêmios Antarctica/SBT.
O publicitário lembra que a seleção de frases era feita pela ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) e o sucesso foi tamanho que precisaram mudar o local.
“Era uma enorme sala, em um determinado andar da faculdade. Ficou tão abarrotada que teve a estrutura abalada. Não me lembro para onde, mas os cupons foram transferidos e depois passaram a ser recebidos num enorme galpão, devido ao sucesso da ação”.
Depois do filme estrelado por Hebe, foram feitos ainda dezenas de comerciais com secundagem menor, de 30 segundos e 15 segundos, gravados com cada um dos artistas e veiculados em toda a programação da emissora.
“A ação causou sérios ‘ciúmes’ nas outras emissoras, e tivemos que compensar exibindo propaganda convencional”, conta Fábio Roberto.
O próprio Silvio Santos estrelou um dos filmes, dentro de sua agenda completamente atribulada, e sobre esse episódio, uma curiosidade: a maioria dos artistas, mesmo com os textos em mãos para entender o mecanismo da promoção e ensaiar antes de gravar, não conseguia explicar ao público.
“Silvio não falava com ninguém, apenas com o diretor do comercial e uma produtora. Leu o texto, entendeu e decorou em minutos. Gravou de prima sem errar uma vírgula. Não o vi mais durante os três meses da ação”, relata Fábio Roberto.
Outras histórias
Fábio Roberto conta ainda mais bastidores do comercial, hoje um clássico da propaganda.
A cena filmada em frente ao Teatro Cultura Artística, simulando a chegada dos artistas em um evento, foi de execução bem complicada .
A rua estava interditada, de modo que os artistas que iam chegando em limusines eram cercados por figurantes. Estes aguardariam a parada dos carros atrás de um cordão de isolamento e atravessariam a rua em direção aos astros e estrelas quando acionados.
Acontece que na região existiam várias casas noturnas, cujos seguranças resolveram encrencar exigindo a via livre.
Eles então ameaçaram derrubar as torres de luz e som, grua, câmeras e tapumes.
A segurança da produção do comercial contava com a equipe da Fonseca’s Gang, a mais famosa da época para shows e grandes eventos. Então, o episódio por pouco não virou um conflito entre seguranças.
Ainda, outras curiosidades na campanha: Jô Soares estava no Rio e Janeiro e foi necessário contratar um jatinho para que ele estivesse presente na filmagem.
Mara Maravilha mudou o figurino na última hora e o novo vestido teve de ser buscado na casa dela; Sergio Mallandro se complicou com o texto, mas ganhou todo mundo com sua simpatia e alegria.
Fábio Roberto ainda relembra com carinho do diretor do filme quando acabaram as filmagens e havia pouco tempo para levarem ao ar.
“Manga convidou a mim e ao RTV (profissional responsável da agência por produções de rádio e televisão) para acompanharmos a edição. E, pasme, ele com uma humildade de gênio, pedia a nossa opinião! Nós nem conseguíamos abrir a boca. E virou um sucesso total.”
Fábio Roberto recorda bem que a promoção dos refrigerantes e a audiência do SBT foram um sucesso. “Ninguém ousou fazer algo parecido novamente”, finaliza.
Não mesmo!