Amigos da Coluna Por Trás da Tela, hoje vou falar com alguém que realmente entende o que se passa nos bastidores da TV, do celular, do tablet, do computador e também do pai de todos: o rádio. Fernando Morgado é professor de Cibercultura na pós-graduação em Mídias Digitais e Gestão de Conteúdo da ESPM e vai nos explicar, entre outras coisas, o fenômeno da internet, que está mais do que consolidado.
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Eu tenho um grande carinho pelo Fernando porque ele fez parte do meu projeto de lançar um livro sobre Blota Jr., meu querido avô. A obra, chamada Blota Jr. – A Elegância no Ar (Matrix Editora, 2015), era um sonho que o avô me confidenciou e que pude realizar graças ao Fernando e também ao meu querido pai, Blota Neto.
CHRISTIANO BLOTA – Fernando, obrigado por visitar minha sala de bate-papo virtual. Não preciso falar da gratidão que tenho por você ter tornado realidade o meu projeto de fazer um livro sobre Blota Jr.
FERNANDO MORGADO – O sentimento de gratidão é recíproco, Christiano. Lembro até hoje do dia em que almocei na sua casa e você, entre uma garfada e outra, ergueu a cabeça, olhou para mim e exclamou: “Você tinha que escrever a biografia do meu avô!”. Seu pai estava conosco e imediatamente aprovou a ideia. Foi assim que começou uma jornada de três anos, concluída com a publicação do livro pela Matrix e com uma noite de autógrafos em São Paulo que durou quase quatro horas, repleta de profissionais da imprensa. Blota Jr. – A Elegância no Ar foi minha primeira biografia, que chegou às livrarias quando eu tinha apenas 27 anos de idade. Sua colaboração foi fundamental para que a obra se tornasse realidade. Eu tenho muito orgulho desse trabalho. Blota Jr. foi uma figura fundamental para a comunicação brasileira e merecia ter sua vida registrada em um livro.
CB – Depois do livro sobre o meu avô, você escreveu outro, sobre Silvio Santos. Quem mandou você inventar moda?
FM – Pois é! O livro Silvio Santos – A Trajetória do Mito nasceu após mais de uma década de pesquisas. Foi a primeira obra biográfica independente lançada sobre o Silvio, pois eu nunca fui empregado dele. Trabalhei sob o mais absoluto sigilo e o lançamento pegou muita gente de surpresa, a começar pelo próprio apresentador, que me entrevistou em seu programa e fez seis meses de publicidade gratuita nos intervalos do SBT. Silvio Santos – A Trajetória do Mito está na quinta edição e apareceu em diversas listas de best-sellers, como a da revista Veja, da Livraria da Folha e da Saraiva. A repercussão foi tão grande que, depois, outras pessoas também resolveram lançar obras sobre o Silvio.
CB – Fernando, minha coluna tem se dedicado mais ao jornalismo ultimamente. Por que tantos canais informativos nas TVs por assinatura, computadores, além da TV aberta? Tem espaço para tudo isso?
FM – Existem dois fenômenos simultâneos. O primeiro está ligado ao forte aumento no consumo de conteúdo em todas as faixas do dia. Foi-se o tempo em que se informar era algo restrito ao período da noite, quando as famílias se reuniam em torno da TV para ver o Jornal Nacional. Vivemos a era do breaking news permanente, na qual os fatos são registrados e compartilhados com uma agilidade brutal e a um custo cada vez menor. E é aí que entra o segundo fenômeno, que tem a ver com a popularização das tecnologias de produção, distribuição e consumo de conteúdo. Isso permitiu com que a oferta acompanhasse a demanda. Sem falar que todos nós viramos prosumers, ou seja, produtores e consumidores de informação ao mesmo tempo.
CB – Você acha que a internet vai tomar o espaço da TV, ou ela será um complemento?
FM – Para mim, a palavra de ordem é acumulo. Quanto mais meios de comunicação surgirem, mais consumiremos. E esse consumo sempre se dará de forma caótica. Errou quem pensou que toda informação e entretenimento do mundo se fundiria. Primeiro achavam que tudo se concentraria na TV, depois no computador pessoal e, finalmente, no smartphone. Mas a verdade é que nossas casas, bolsos e mochilas estão com cada vez cheios de bugigangas e as fontes de conteúdo não param de se multiplicar. Se houvesse alguma substituição de equipamentos e mídias, talvez a nossa vida fosse um pouco mais organizada, mas como não há, vivemos esse caos midiático do qual ninguém escapa.
CB – Sinto que o mercado jornalístico está saturado. Muita gente boa para pouco espaço, fim da obrigatoriedade de diploma, pessoas de outras áreas migrando para a função. Você consegue visualizar o futuro do jornalista?
FM – Vejo que a importância do jornalista cresce nesse caos midiático a que me referi anteriormente. Diante de tanta opção, o que inclui muita mentira, é fundamental que o público saiba em quem confiar. Nesse sentido, a marca pessoal do jornalista e a marca do veículo onde ele atua fazem toda a diferença, pois são elas que concentram as percepções que o público tem do trabalho informativo. Além desses aspectos, eu também enxergo a expansão do empreendedorismo entre jornalistas. O sonho de trabalhar em grandes redações perdeu espaço para o desejo de montar seu próprio veículo, seja ele um site, um podcast ou um canal no YouTube. Antigamente, apenas grandes empresas dispunham dos meios necessários para produzir e difundir conteúdos. Uma câmera para gravações externas, por exemplo, já custou 50 mil dólares. Hoje é possível gravar em 4K usando um celular apenas razoável. A questão agora é cada profissional encontrar o seu nicho de mercado e, a partir dele, desenhar um modelo de negócio que seja rentável a médio ou longo prazo.
CB – As emissoras de TV também têm mostrado, cada vez mais, preferência por determinado viés político. Algumas parecem mais preocupadas com dinheiro do que com informação. A proximidade da eleição presidencial revela claramente esse fenômeno. Você concorda com o papel exercido pelas emissoras? Sempre existiu isso?
FM – A comunicação tem veículos parciais desde o seu início enquanto atividade profissional. Basta lembrar dos jornais que existiam no século 19: havia publicações assumidamente monarquistas, republicanas, escravagistas, abolicionistas… Os editoriais, inclusive, servem para que o dono do veículo diga de que lado está nas situações que lhe interessam. Conforme os veículos cresceram em termos de estrutura e fatia de mercado, cresceu também a necessidade deles falarem para públicos maiores. Por isso, a busca por discursos mais neutros, pretensamente imparciais, se fez necessária. Com o avanço dos meios digitais e a pulverização da oferta e do consumo, os nichos ficaram ainda mais relevantes. Nesse sentido, tomar partido significa escolher um segmento de consumo para atender e, assim, ganhar dinheiro. Em suma: jornalismo parcial e jornalismo que busca a imparcialidade são dois lados de uma mesma moeda.
CB – Eu vejo a internet tomando cada vez mais conta do mercado. Existem mais filmes, programas e pessoas com possibilidade de se destacar sem a “panela” das grandes corporações. Eu te pergunto: como você enxerga a internet daqui a alguns anos? O céu é o limite, ou não há limite para internet?
FM – A internet pode ser encarada sob dois aspectos: meio de comunicação com linguagem própria e tecnologia para transmissão de dados em geral. O primeiro aspecto é muito discutido por teóricos, afinal, a web é tão ampla que comporta qualquer tipo de linguagem. O segundo aspecto é ainda mais abrangente, resvalando nos meios analógicos. Por exemplo: diante da expansão da banda larga, notadamente com o 5G, como ficará a transmissão por ondas de rádio, que é a base do AM, do FM e da TV aberta? Será que as outorgas de radiodifusão continuarão tão valiosas? Temos que pensar também no contexto regulatório, que ainda precisa avançar bastante quando o assunto é internet. Muita gente ainda pensa que rede social é terra sem lei. Essa percepção equivocada precisa mudar. A web é mais que futuro: ela é presente. Todas as demais mídias dependem dela, de uma forma ou de outra. Em contrapartida, não podemos achar que a internet é a fronteira final da humanidade. Logo surgirá um meio melhor, que abrirá novas oportunidades e aumentará o nosso caos midiático. A web não tem limites. A criação humana tampouco. Sendo assim, qualquer previsão a longuíssimo prazo se mostra precipitada.
CB – Fernando, além de ser acadêmico, você está sempre comentando ou participando de entrevistas na frente da tela. Então vamos para a pergunta-chave da coluna: quando o Fernando está “Por Trás da Tela”, o que ele gosta de fazer?
FM – Eu, em geral, estou diante de telas. Gosto muito de jornalismo e permaneço o dia inteiro atento ao noticiário. O Botafogo, por sinal, vem ocupando um tempo cada vez maior dentro do meu consumo de mídia. John Textor renovou as esperanças de todos nós, alvinegros. Também gosto muito de aproveitar a minha cidade, o Rio de Janeiro, e viajar. Tenho laços fortíssimos com o sul do Brasil. No campo profissional, sigo com as minhas atividades de professor universitário e empresário, prestando consultorias e ministrando palestras e treinamentos.
CB – Fernando, muitíssimo obrigado pela visita! Eu te espero mais vezes por aqui!
FM – Amigo Christiano, sou eu que agradeço pelo convite, pelo espaço e, sobretudo, pela confiança ao longo de todos esses anos. Estarei sempre à disposição de você e dos leitores do Observatório da TV. Até a próxima!