Rota 66

Caco Barcellos revela que ex-jogador da seleção foi perseguido pela polícia: “Não me autorizou a contar”

Atleta quase foi vítima de homicídio, diz autor de livro-reportagem que virou série do Globoplay

Publicado em 19/09/2022

Líder do Profissão Repórter, jornalista da Globo, Caco Barcellos é autor da próxima série do Globoplay, Rota 66: A Polícia que Mata. Fruto de sete anos de investigações, o livro-reportagem sobre crimes cometidos pela Polícia Militar conquistou o Prêmio Jabuti, mais importante troféu literário do Brasil, em 1993. Entretanto, o jornalista precisou retirar histórias do trabalho final, como a de um jogador de futebol, com passagem pela seleção, que por muito pouco foi morto por agentes de segurança.

“A história não está no livro e eu insisti para que estivesse. Os amigos dessa pessoa cuja história eu queria contar me falaram isso. Ele é um atleta de futebol famosíssimo, já esteve na seleção brasileira, infelizmente não me autorizou a contar a história dele”, disse Caco Barcellos durante coletiva de imprensa virtual de Rota 66, nesta segunda-feira (19).

O jornalista declarou ter contado a história à mãe de uma vítima da chacina de Osasco (SP), em 2015, que lhe procurou pedindo ajuda para cobrar indenização do Estado pela morte do filho. Segundo Barcellos, o governo paulista não ressarciu nenhuma família atingida pelos homicídios da Polícia Militar.

Sobre o ex-jogador da seleção, Caco Barcellos descreveu a noite em que o então pré-adolescente conseguiu fugir da repressão policial e sobreviver.

“Ele é um cidadão negro, na época em que foi perseguido pelas ‘tropas de elite’ ele tinha 12 anos de idade. Ele correu muito para escapar da viatura cinza, sem nenhum tipo de farol ligado, nenhum sinal, o que é coerente com o policiamento ostensivo repressivo. Elas chegam silenciosamente, às escuras, não para evitar que o crime ocorra, mas para surpreender aquele que eles consideram suspeito”, explicou.

“Alguns meninos com sorte, quando eles percebem, desesperadamente seguem correndo, pulando tudo, para não serem executados. E esse jovem, na época menino, com 12 anos, passou por essa aventura. Graças que era um jogador de futebol em formação e conseguiu saltar todos os muros e escapou de virar mais um personagem do livro Rota 66”, prosseguiu Barcellos, propondo qual seria a indenização ideal para o atleta e sua família.

“Pessoas comuns, não envolvidas como vítimas de violência, ao saber dessa história, e alguns são parceiros dele, ficam imaginando: ‘Caramba, qual seria a indenização desse craque maravilhoso que chegou à seleção brasileira?’. Isso é que tem que ser pago quando um coronel decide tirar a vida, dá ordem para os soldados tirarem as vidas dos outros. Quem garante para esse coronel que aquele menino de 12 anos, 13 anos, 14 anos, 15 anos, não será um craque da seleção brasileira? Se puder ser um craque da seleção brasileira como esse, que pulou os muros, vamos indenizar sim. Salário dele chegou a ser de R$ 3 milhões por mês. Expectativa de vida? É assim que se faz indenização. No Brasil, 76 anos. Vamos multiplicar 76 por R$ 3 milhões. Eu acho que é um caminho maravilhoso sugerido por essas pessoas”, afirmou.

O líder do Profissão Repórter e autor de Rota 66 reforçou sua defesa à responsabilização do Estado pelos crimes policiais.

“Quem garante para esse camarada que decide tirar a vida dos outros, com essa mentalidade miliciana, que esse não será um brasileiro maravilhoso, que leva o melhor do país, que é a sua arte, e os negros são brilhantes na sua arte, na música, no futebol, quem garante para o camarada que decide tirar a vida dos outros que o destino dele será o crime? Fico por aqui com essa mensagem, uma mensagem de esperança, para essa moça, mãe que ficou órfã do filho, caminhando em busca de indenização. Indenização é um dos caminhos, evidentemente, são tantos possíveis, mas acho que esse é um caminho eficaz. Um caminho de responsabilizar, pagar, pela tragédia que comete, pela destruição da vida que resolvem deliberadamente fazer”, concluiu.

Siga o colunista no Twitter e no Instagram.

© 2024 Observatório da TV | Powered by Grupo Observatório
Site parceiro UOL
Publicidade