Crítica de TV

A morte não cai nada bem em Quanto Mais Vida, Melhor!

Novela das 19h da Globo melhora muito ao dar mais leveza à tragédia anunciada

Publicado em 03/03/2022

A surreal troca de corpos entre os personagens principais deu mais leveza para Quanto Mais Vida, Melhor! enquanto uma novela alto astral e divertida tradicional para esta faixa horária da TV Globo.

Na nova fase, a trama das 19h foi agraciada com as ótimas interpretações principalmente de Giovanna Antonelli/Paula/ Neném e Mateus Solano/Guilherme/Flávia, que incorporaram seus novos personagens de forma um tanto hilária.

Vladimir Brichta/Neném/Paula também se sai muito bem, embora haja mais exagero ainda nos trejeitos de uma personagem que já era bastante over na interpretação de Giovanna.

Para oferecer esse entretenimento, é necessário que a novela estabeleça um pacto com o público, que precisa colaborar e estar disposto a entrar nessa viagem.

Afinal, o único jeito de encarar a trama absurda é o telespectador aceitar “voar” com as histórias criadas, como já bem dizia a autora Glória Perez, ao justificar algumas passagens mirabolantes dos roteiros de folhetins como Caminho das Índias (2009) e Salve Jorge (2012).

A mesma fórmula deu certo no cinema nacional recente, quando do sucesso dos longas-metragens Se Eu Fosse Você (2006) e Se Eu Fosse Você 2 (2009), com os magnânimos Glória Pires e Tony Ramos nos papéis principais.

Na novela, essa “troca de corpos” fica ainda mais fácil do que no cinema, pois se tratam de personagens já com familiaridade junto ao espectador

Mesmo sendo uma tragicomédia, a novela precisava mesmo fortalecer seu lado hilário.

Há que se ter muita bala na agulha para sustentar um enredo que flerta com a morte o tempo todo.

Na TV brasileira, o seriado Pé na Cova (2013-2016) fez isso com maestria. Da TV norte-americana, a série A Sete Palmos (Six Feet Under/2001-2005), rodeada por sarcasmo, também foi um exemplo bem-sucedido.

Os protagonistas de Quanto Mais Vida, Melhor! (Globo/Estevam Avellar)
Os protagonistas de Quanto Mais Vida Melhor GloboEstevam Avellar

Acidente Aéreo

Lembremos que a atual novela das 19h teve dias difíceis no seu começo. Quanto Mais Vida, Melhor! estava com seus capítulos iniciais gravados, editados e pós-finalizados quando houve o acidente aéreo que matou a cantora Marília Mendonça (1995-2021).

Num país abalado pela tragédia da cantora e ainda enfrentando a Covid-19, a novela começava exatamente com uma queda de avião, responsável por todo seu arco narrativo.

O desenrolar do presente e passado dos quatro principais personagens foi ágil e cheio de criatividade. Mas o tema da morte, sempre ali, veio jogando uma bruma sobre a história que não combinava com o restante.

Os núcleos cômicos proliferavam. Como o casal Juca (Fabio Herford) e Odete (Luciana Paes), como pai e madrasta de Flávia.

Ou a cena policial, encabeçada pelo delegado Padro /Pedroca Monteiro, que soou como mais uma tentativa de reforçar o lado cômico de uma mesma história que de outro lado contava com cenas pesadas em presídio.

No lar frio e rico do cardiologista, o casal formado pela empregada doméstica e o motorista também sinalizou uma ampliação da vocação de comédia para mais territórios.

Mas nem tudo isso somado foi capaz de se sobrepor ao tema soturno da trama: a eminência e proximidade do fim anunciado para um dos protagonistas.

A cada aparição sobrenatural da personificação da morte (vivida por A Maia) para os personagens principais, a trama despencava em energia cômica. Cada entrada dela na tela significava uma quebra abrupta de expectativa de riso na história.

Sem a linha de espiritualidade de uma novela como A Viagem (1975/76 e 1994) dando sustentação ao roteiro, o único caminho possível é mesmo o do bom humor.

Com essa troca de papéis do quarteto principal, ainda que momentânea –a previsão foi para 40 capítulos–, o autor Mauro Wilson melhorou ainda mais sua proposta de comédia romântica.

Tem tudo para dar certo. Só torço para que não voltem aqueles clipes musicais, que também não caíam nada bem com a trama.

** Informações e opiniões expressas nessa crítica são de total responsabilidade de sua autora e podem ou não refletir a opinião deste veículo.

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