A comédia As Visões da Raven (2003-2007) tem um lugar reservado no coração do brasileiro fã de séries, principalmente para aquele que a teve como companheira diária na hora do almoço, nos tempos de SBT. Entre os episódios com a personagem principal vestida espalhafatosamente ou entrelaçada em uma confusão bizarra, havia ali um despertar de consciência negra de fundamental importância.
Apenas por existir, As Visões da Raven (disponível no Disney+) já tinha uma representatividade. No começo dos anos 2000, era raro ter uma série na Disney com não apenas uma protagonista negra, vivida por Raven-Symoné, mas com boa parte do elenco não branco.
As Visões da Raven acumulou feitos incríveis, como ser a maior audiência de toda a programação do Disney Channel americano, naquela época, e conseguir duas indicações ao Emmy na categoria programa para crianças. No Brasil, o sucesso foi tão grande quanto, totalmente inconteste.
Consciência negra para a garotada
A negritude esteve presente em As Visões da Raven em todos os cem episódios, espalhados em quatro temporadas. A personagem Raven, antenada com a moda, vestia roupas incríveis, combinadas com cortes de cabelo estilosos.
A vidente, que pensava que ver o futuro seria melhor, quebrava barreiras por ser quem era. Estava ali uma jovem fora dos padrões estabelecidos pela ditadura da beleza, com cor de pele e corpo diferentes dos destacados em capas de revistas e propagandas.
Raven tinha orgulho da essência e fazia questão de não esconder isso. A série tratava dessas questões durante os capítulos, aqui e acolá. Mas havia momentos nos quais era necessário dedicar mais tempo a assuntos relevantes, como o racismo, e transmitir ao público mais jovem a crueldade da discriminação.
No mundo da moda
Um episódio cortante de As Visões da Raven foi o oitavo da segunda temporada. A menina ficou empolgada porque se viu em uma visão trabalhando como modelo, com as roupas desenhadas por ela. Até ter a decepção de olhar que fizeram um photoshop em uma imagem, colocando outro corpo no lugar do dela.
Esse capítulo tratou de raça e body shaming. Raven foi finalista de um concurso de moda organizado por uma revista teen. A publicação alterou uma foto dela, a deixando bem mais magra. A vidente reclamou e como resposta recebeu: “você não tem o look [ideal]”, frase dita pela editora da revista, enquanto apontava para uma modelo magérrima, branca.
Raven, que não era de levar desaforo para casa, disparou: “Caso não tenha notado, as pessoas têm diferentes formas e tamanhos. E todas são bonitas. Publica isso na sua revista!“
Racismo no trabalho
As Visões da Raven sabia muito bem falar de assuntos sérios para o público adolescente, sem um didatismo chato, porém também sem deixar de lado a seriedade dos temas. O maior exemplo disso foi o décimo episódio da terceira temporada, lembrado por muitos, chamado de True Colors.
Raven e a amiga Chelsea (Anneliese van der Pol) se candidataram para trabalhar em uma loja de roupas, o que seria um emprego ideal para a vidente. Ela fez absolutamente tudo direitinho, cuidou do vestuário com carinho e sabia atender a clientela por conhecer de moda. Já Chelsea mal sabia dobrar uma blusa.
Após o teste, somente Chelsea conseguiu a vaga. Raven ficou sem entender, pois tinha a certeza de que não pisou na bola. Daí, a menina recebeu uma visão na qual ouviu a gerente da loja dizer: “eu não contrato pessoas negras.” Junto com os amigos, ela armou uma cilada para pegar a mulher dizendo essa frase em flagrante.
A cena mais tocante, porém, aconteceu em casa, quando Raven conversava com os amigos e deu um depoimento eternizado, verdadeiro. “Eu sei que o racismo existe. Mas não sabia que magoava tanto.“
Veja esse trecho do episódio True Colors (dublado):
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