Homem do teatro

Cobrado para voltar à TV, Gustavo Haddad se converteu em herói dos palcos: “O teatro é a minha paixão”

De Chiquititas a Canavial de Paixões, o ator ficou marcado na dramaturgia do SBT

Publicado em 15/08/2020

Quem viveu a era de ouro da teledramaturgia dos anos 90/2000 certamente tem a imagem de Gustavo Haddad familiarizada na memória afetiva. Ator dos mais elogiáveis de sua geração, hoje, aos 44 anos e afastado das novelas desde 2012, quando finalizou seus trabalhos em Amor & Revolução, com autoria de Tiago Santiago no SBT, Haddad se dedica inteiramente ao teatro, sua maior paixão desde pequeno, quando iniciou na carreira, lá em Bauru, no interior de São Paulo.

Amante das artes cênicas, Gustavo contou num bate papo com o jornalista e ator Pedro Leão, por meio de uma live promovida na noite da ultima quinta (13), os motivos pelos quais distanciou-se da televisão. “Foi uma opção bem consciente“, garantiu ele, que hoje é pai de duas crianças.

Com mais de 13 novelas no currículo, em sua grande maioria no SBT, o ator segue movimentando os milhares de fãs conquistados ao longo dos anos com seus populares trabalhos na emissora de Silvio Santos. Chiquititas (1998-99), Pequena Travessa (2002) e Canavial de Paixões (2003) se posicionam como os mais relembrados pelo público. A Padroeira (2001), de Walcyr Carrasco, na Globo, também se destaca na carreira do discreto astista.

Gustavo Haddad tem mais de 13 novelas no currículo (Reprodução: SBT)

Eternizado como Paulo Giácomo, do mais bem-sucedido remake mexicano do SBT, Gustavo disse que sua trajetória na TV começou da maneira mais natural, e muito cedo. O ator sequer tinha completado a maioridade quando surgiu em Colégio Brasil, de 1996.

Não tinha controle, eu não ia atrás da televisão. Todos os trabalhos que fiz, eu fui chamado, convidado, eu nunca fiz teste na TV. Pra mim, as coisas foram acontecendo muito fáceis. E eu fiquei muito rotulado com um único personagem [Paulo]“, confessou.

As pessoas só me chamavam para fazer o galã, o bom moço, e isso acaba te limitando. Eu queria outras coisas, eu queria pesquisar outras formas da minha interpretação e a televisão te rotula. Ela precisa dessas personas, dessas figuras para montar o seu elenco. Eu acabei optando por não ir atrás mais“, explicou Gustavo, referindo-se ao personagem Paulo de “Canavial”, onde dividiu cena com Bianca Castanho, Débora Duarte, Helena Fernandez, Oscar Magrini, Jonas Mello e outros tantos veteranos de peso.

Gustavo Haddad (Foto: Eduardo Lopes)

Como ator, Gustavo Haddad se reinventou na profissão e solidificou sua presença no mercado sem a necessidade de ser televisionado, mesmo cobrado por isso. Isento de noticiários tendenciosos e em constante processo de evolução profissional por meio de estudos, o ator, sem perceber, engloba o time de artistas que se movimentam unicamente pela arte e não pela vontade de ser famoso e ter notoriedade por si só.

O mercado ficou saturado de muitos atores da minha idade, e pra eu permanecer na TV, eu precisava entrar neste ‘mercadão’ e participar de eventos, festas e divulgar. Ai entrou a internet, entraram as redes sociais. Eu sou completamente fora disso. Se você olhar o meu instagram, eu publico foto a cada dois meses, não tenho essa autopromoção que hoje em dia é necessário para permanecer na TV“, disse.

Gustavo Haddad afirma que o teatro é a sua maior realização profissional (Foto/Reprodução)

E com isso eu mergulhei de cabeça no teatro. A minha paixão é interpretar, não importa se eu estou no teatro, na TV ou no cinema. Não me importa qual é o veículo […] se eu tenho um lugar onde me proporciona um horizonte muito mais amplo, personagens muito mais interessantes, um tempo muito maior de trabalho de pesquisa e descoberta, que é o teatro, eu optei de olho fechado, mesmo que com essa remuneração que ficou muito mais escaço, eu tive que mudar o meu padrão de vida. Mas foi uma opção consciente. Eu sabia o que eu queria e o que eu estava enfrentando“, concluiu.

Gustavo Haddad ao lado de Bianca Castanho e Ana Cecília Costa (Foto/Divulgação)

Maduro, Gustavo Haddad preserva uma beleza jovial de atrair olhares maliciosos, tanto quanto nos tempos de suas primeiras novelas. Ele alerta que a televisão, de fato, “cria um lugar de intimidade com o público, da qual elas nunca mais esquecem”, e que agora se sente na melhor fase de sua vida.

Estou num período muto bacana da minha vida. Prefiro agora do quando eu tinha 24. Estou me sentindo melhor agora”, afirmou ele, que continua arrancando suspiros das pessoas e muito bem em forma com o seu corpo e mente.

Elogiado por amigos e colegas, Gustavo transformou-se num herói dos palcos, um expoente da arte cênica no Brasil. Promissor, sua relação e história com o teatro facilmente inspirariam filmes brilhantes. Neste atual cenário de pandemia, ele permanece recluso dos palcos, é claro, e sem qualquer previsão de retorno.

Gustavo Haddad atuou em A Padroeira, na Globo (Reprodução)

Estou sem poder fazer o que eu mais amo da minha vida, que é atuar, estou recolhido, tentando estudar bastante, pesquisar, buscar outras coisas dentro de mim que eu sempre gostei, estou fazendo bastante marcenaria, uma coisa que eu sempre curti, que é mexer com madeira, e contruir coisas, estou me realizando nisso para ficar com o coração tranquilo, para este tempo passar e a gente poder voltar“, disse ele, que também ficou 10 anos trabalhando com produção, pós-produção e edição, num estúdio montado em sua própria casa.

Embora o afastamento da televisão, Gustavo Hadadd relata sua paixão pelas telinhas. “Foi ótimo! Gosto de fazer TV, sempre gostei, adoro toda a parte técnica da TV, a rotina de uma novela, fazer trinta cenas, eu adoro este ritmo. Mas existe o que você precisa fazer para estar na TV, eu não tenho muita paciência. Eu acabo não permanecendo. Minha última novela foi em 2010, são 10 anos que não faço TV“, contou ele, que tem em seu Instagram mais de 10 mil seguidores.

Fama, sucesso e a vida comum

O lugar de pesquisa pro ator é a própria vida. Se ele não tem tempo pra viver uma vida cotidiana, uma vida normal, ele vai buscar essas emoções e esse lugar de conhecimento humano onde, se ele não tem repertório de vida pra isso? Eu acho que esse recolhimento todo ator deveria fazer.

Ficar na frente da TV alimentando esse mainstream de celebridade, você acaba vivendo uma mentira, um personagem que é o famoso. Que no fundo isso acaba atrapalhando o seu dia a dia, o seu cotidiano, o seu vai e vem. As pessoas acabam te vendo como uma pessoa especial que ninguém é. Todo mundo é igual.

Todo mundo faz parte da mesma matéria, da mesma coisa. Isso das pessoas se colocarem no lugar especial por ser famoso, acaba impedindo ela de viver uma vida normal, e ela perde isso dentro dela, que é uma essência que ela vai usar no trabalho dela. Ela vai usar como matéria prima para sua interpretação.

E eu não consigo não viver a minha verdade e a minha vida. Eu não saberia viver essa fama e essa superexposição que as pessoas acabam até cobrando de você. Eu corro disso, eu sou completamente o oposto e não acho que é necessário pra continuar fazendo meu oficio e fazendo o que eu gosto. Se isso for necessário eu vou fazer teatro na rua. Vou interpretar pra quem quer me ver.

Chiquititas

Chiquititas (Divulgação: SBT)

Intérprete do Cadu nas duas primeiras temporadas, o personagem era um desempregado, o primo de Carolina (Flávia Monteiro), que chegou no orfanato Raio de Luz para ajudar nos trabalhos domésticos. “Chiquititas é tudo, não só a novela. Foi uma experiência de vida, foi mudar de país, morei 1 ano e 2 meses na Argentina, foi a primeira vez que eu experimentei um lugar de sucesso na TV.

Antes eu tinha feito outras novelas, três novelas no SBT, mas que não tinha um público muito grande. Chiquititas eu experimentei uma histeria, uma loucura, que eu nunca tinha percebido o que a TV podia causar, foi um lugar de convivência com todos esses atores.

Era dia a dia, era estúdio e era em casa, todos moravam no mesmo prédio, eramos vizinhos de porta, ajudávamos o outro nas carências, choro de saudades da família. Foram 1 anos e 2 meses que pareciam 10 anos da minha vida, foi muito bacana. E eu era jovem demais, eu tinha 22/23 anos.

E aproveitei muito a juventude na Argentina. A novela não passava lá, ninguém conheci a gente, então a gente tinha uma vida normal de ir ao mercado, sair. E a gente vinha pra São Paulo a cada uma vez por mês e aqui era uma loucura, a novela fazia muito sucesso.

Foi a primeira vez que eu sai escoltado do aeroporto. Eu passei por situações de um lugar que eu não entendia muito bem, até então, onde a televisão podia levar e causar.

Canavial de Paixões

Gustavo Haddad interpretou o Paulo Giácomo em Canavial de Paixões (Foto/Divulgação)

É uma joia pra mim. O Paulo é meu primeiro protagonista de televisão, além da responsabilidade de um protagonista. O protagonista trabalha muito na novela. Ele leva todos os núcleos que atravessam essa estrutura. E principalmente essa estrutura de novela mexicana que acaba concentrando tudo em volta deste casal. No Brasil essa dramaturgia é muito mais distribuída. Eu chegava a gravar 40 cenas num dia“, concluiu.

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