Entrevista

Aruanas: roteiristas e diretores falam sobre a série

Criadores e diretor artístico contam alguns segredos da produção que estreia nesta terça

Publicado em 27/04/2020

Nesta terça-feira (28), depois de Fina Estampa, o público vai acompanhar na TV Globo os dramas pessoais e a luta pelo meio ambiente das ativistas Luiza (Leandra Leal), Natalie (Débora Falabella), Verônica (Taís Araújo) e Clara (Thainá Duarte), na série Aruanas. Além de entreter, a obra é um convite à reflexão sobre a preservação da biodiversidade. A segunda temporada já está garantida.

“Assistimos tanto a obras sobre advogados, médicos, policiais. Por que não uma série sobre ONGs?”. Foi a partir deste questionamento que os autores Marcos Nisti e Estela Renner decidiram se aventurar e criar esses personagens e a trama. Nesta entrevista, os criadores e o diretor artístico da série – uma a produção original da Globo exclusiva para o Globoplay, em coprodução com a Maria Farinha Filmes – contam suas inspirações e o processo de criação para os 10 episódios, que vão ao ar às terças-feiras.

Escrito por Estela Renner e Marcos Nisti, o thriller ambiental foi gravado na região da floresta Amazônica e em São Paulo. A série conta com direção artística de Carlos Manga Jr, direção geral de Estela Renner, parceria técnica do Greenpeace e Pedro de Barros colabora com o roteiro.

Estela Renner, Deborah Falabella e Marcos Nisti na première da série Aruanas
Estela Renner Deborah Falabella e Marcos Nisti na première da série Aruanas Foto GloboJoanne Davidson

Como surgiu de fato a ideia de escrever Aruanas?

Marcos Nisti: Da nossa experiência pessoal e profissional. Do que vivemos em nosso cotidiano, do que nos dispusemos a fazer em nossas profissões, do trabalho social que desenvolvemos. E muito da vontade de ampliar a discussão em torno de um assunto tão pouco explorado, que é o ativismo e o trabalho das organizações sem fins lucrativos. Quando de fato começamos a desenvolver o projeto, quanto mais ampliávamos as pesquisas, mais certeza tínhamos da necessidade dessa reflexão.

Vocês evitam colocar as protagonistas como heroínas, apesar da ação ativista ter um cunho heroico, já que são pessoas que muitas vezes abrem mão de suas vidas por um propósito coletivo. Qual é o lugar desses defensores?

Estela Renner: O herói para mim é um espaço a ser preenchido do nosso inconsciente coletivo, ou seja, é um arquétipo. Ele não é real. Não acredito em heróis reais. Eu acredito em virtudes. Durante a minha vida, admirei aqueles que colocam a vida dos outros e um interesse coletivo à frente de seu conforto pessoal. Por que alguém se arrisca pela Amazônia? Por que alguém se arrisca para que o planeta não aqueça, para que não gere mais pobreza, mais migrações, mais violência, mais desertos? Esta inquietude eu admiro e muito. E, em todas as pessoas que conheci que carregam esta energia, vejo algo em comum: elas não conseguem ser diferentes, é maior do que elas. Um ativista é um ser muito especial e raro. Matá-los realmente tem efeito de contenção e manutenção do status quo. Deste mundo que está desigual, desumano, doente. Por isso que esta série é tão especial para mim, para todos da equipe.

Por que escolher a Amazônia como pano de fundo para essa história?

Marcos Nisti: A ideia inicial sempre foi trazer o universo das ONGs ambientais, dos defensores do meio ambiente. Nada mais representativo do que a Amazônia, que reverbera no mundo todo, tem a maior concentração de biodiversidade e sofre com a ganância humana. A série é um estímulo para que as pessoas passem a ver a Amazônia com outros olhos. Com o olhar da riqueza e da abundância que é a floresta em pé. Uma inversão de paradigma precisa acontecer logo, a Floresta tem um valor econômico enorme, muito maior do que derrubada.

Qual a mensagem que vocês desejam que Aruanas deixe?

Marcos Nisti: Queremos iluminar e dar valor ao trabalho dos ativistas do Brasil e de todo o mundo. Com a série, queremos chegar a mais pessoas para ampliar a reflexão e o conhecimento sobre este planeta, que na verdade pertence a todos nós. O meio ambiente, a Amazônia, seus defensores e seus criminosos são de interesse internacional.

Estela Renner: Hoje, o Brasil é um dos países que mais mata ativistas no mundo. Aruanas é uma obra urgente que reforçou seu propósito em toda sua criação e produção, como o protagonismo feminino dentro da trama e por trás das câmeras, o uso de materiais não poluentes, etc.

Quais as inspirações e o conceito de fotografia da série?

Carlos Manga Jr: Aruanas não é super iluminada. Ela não é uma explosão visual do que é essencialmente claro. Na fotografia, usamos como referências dois grandes fotógrafos brasileiros, Miguel Rio Branco e Luiz Braga, que trabalham com muita sombra. As imagens têm densidade. Não fugimos das cores, até porque o norte do Brasil e São Paulo têm cores muito marcadas. Mas a sombra usada por esses fotógrafos nos inspirou para construirmos a estética da série. Nós não falamos de uma Amazônia alegre. Para falar da vida, estamos anunciando que é possível a morte. Ou seja, se não cuidarmos da Amazônia, ela acaba. Retratamos isso musicalmente, na fotografia e na linguagem, que se unem para que essa tensão seja perceptível. Foi importante trazer as sombras desse lugar geralmente apresentado de maneira maravilhosa e exuberante, e que agora tem uma abordagem das diversas realidades que estão ao seu redor: os ativistas, os garimpeiros, os índios, o desmatamento, a ganância.

Quais foram as opções de câmeras e cores para as filmagens na Amazônia e em São Paulo?

Carlos Manga Jr: Usar a cor para diferenciar e falar da Amazônia e São Paulo seria um caminho muito óbvio. Na Amazônia, o tempo muda muito, chove, é muito úmido, às vezes o céu está azul, às vezes branco. Tem um contraste, uma mistura dicotômica ali. Em São Paulo, temos a referência do cinza, mas que não é necessariamente real. Depende da luz do dia, do lugar. Fugimos então do que é previsível.

A câmera então entra como matéria e linguagem para conceituar e fazer essa ligação entre os dois locais. Na Amazônia, foi tudo com a câmera na mão, é lá onde a ação propriamente dita acontece. É um lugar orgânico, com diferentes formas, densidade. Tudo isso, com uma abordagem do que é o ativismo, das pessoas arriscando suas vidas, nos levou ao caminho de interpretar a Amazônia com a câmera na mão. De maneira participativa, interativa, voyer e que passa uma sensação mais natural, de algo que está acontecendo espontaneamente.

São Paulo é geométrica, com avenidas e ruas horizontais, prédios altíssimos. Então existe um pouco mais de movimentos técnicos, retilíneos, onde a tensão permanece, mas é mais psicológica. Pensando nisso, fechamos em panorâmicas, trilhos e tripés com a câmera estática. O que une os dois locais é a tensão.

A série conta com elenco de diversas partes do país. Como foi a seleção e a preparação dos atores?

Carlos Manga Jr: Quando sentei com os autores para ler a obra, imediatamente pensamos em Taís, Débora e Leandra. São atrizes de excelência e que carregam o ativismo na vida pessoal. A série também pedia um elenco diversificado. Estamos falando da Amazônia, do norte do país – não poderíamos ficar sem atores locais e de outras regiões. Eu preciso acreditar no que estou fazendo para que o espectador também acredite. Os personagens locais da fictícia Cari são atores amazonenses. Para o elenco das aldeias atacadas, fizemos questão que fossem atores indígenas.

Eu gosto de dirigir “no ouvido”: solto a semente no ator e ele me traz a construção daquele momento de volta. Temos atores e atrizes extremamente interativos, criativos e inteligentes nesse elenco e eles nos dão muitos ingredientes e soluções em cenas. Também contamos com a parceria técnica do Greenpeace que treinou os atores para uma situação de risco em ação não violenta.

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