Há 518 anos, quando o navegador Pedro Álvares Cabral chegou ao Brasil, encontrou aqui os primeiros habitantes da nossa terra, os indígenas, que ao longo desses séculos foram escravizados, dizimados, aculturados e segregados. A teledramaturgia brasileira já representou os indígenas em diversos trabalhos, passados em diferentes épocas da nossa História. Seja de maneira estereotipada ou com a preocupação de ilustrar a riqueza cultural e étnica dos índios, alguns personagens merecem ser rememorados. Vamos a eles.
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O índio Robledo (Cláudio Marzo) foi um dos personagens mais marcantes na trama de A Rainha Louca (1967), escrita por Glória Magadan para a Globo. Alvo do amor de Aurora (Nathália Timberg), a sósia da imperatriz Charlotte (também Nathália), Robledo vivia na fazenda de Fernando Moreno (Jayme Barcellos) e acabou se casando com a filha do fazendeiro, Maria de Las Mercés (Theresa Amayo).
O romance maior de Érico Veríssimo, O Tempo e o Vento, já ganhou duas adaptações para a televisão: uma em novela, pela TV Excelsior, com texto de Teixeira Filho, no ano de 1967; e outra como minissérie, de Doc Comparato, exibida nas comemorações dos 20 anos da Rede Globo, em 1985. Um personagem indígena que aparece pouco, mas tem bastante importância no enredo, é Pedro Missioneiro (David José em 1967 e Kasé Aguiar em 1985), o grande amor de Ana Terra (Geórgia Gomide/Glória Pires) e pai de seu filho, a quem ela também dá o nome de Pedro (Hemílcio Fróes/Ivan de Albuquerque).
No ano seguinte, 1968, Aimbé (Stênio Garcia), mameluco agregado da família de Dom Braz Olinto (Mauro Mendonça), marcou presença em A Muralha, novela de Ivani Ribeiro baseada na obra de Dinah Silveira de Queiroz para a TV Excelsior. Numa versão em minissérie feita no ano 2000 pela Globo, em adaptação de Maria Adelaide Amaral, Enrique Diaz interpretou Aimbé e Stênio Garcia fez uma participação como o Caraíba, líder da tribo da qual Apingorá (André Gonçalves) era membro. Outra personagem a destacar na minissérie é Moatira (Maria Maya), que se apaixonou pelo jesuíta Padre Miguel (Matheus Nachtergaele), no processo de catequização.
Uma das personagens que vêm logo à lembrança quando o assunto são os índios nas novelas é Potira (Lúcia Alves), de Irmãos Coragem (1970/71), escrita por Janete Clair. Pairava a dúvida de que ela fosse filha bastarda do patriarca da família Coragem, Sebastião (Antonio Vitor), mas não era, e por isso podia viver livremente sua paixão pelo irmão de criação Jerônimo (Cláudio Cavalcanti). Quer dizer, nem tão livremente assim, porque devido à dúvida ela acabava se casando com o promotor Rodrigo César (José Augusto Branco). Na segunda versão da história, exibida em 1995, Dira Paes foi Potira; Ilya São Paulo, Jerônimo; e Giuseppe Oristânio, Rodrigo César.
As duas versões de Bicho do Mato – em 1972 pela Globo, com texto de Chico de Assis e Renato Corrêa de Castro, e em 2006/07 pela Record, escrita por Cristianne Fridman e Bosco Brasil – trouxeram o protagonista Juba (Osmar Prado/André Bankoff) tendo como amigo o índio Iru (José de Arimateia/Raphael Vianna). No final da década, a Rede Tupi dedicou sua novela das 20h à questão indígena com Aritana (1978/79), de Ivani Ribeiro. O personagem-título (Carlos Alberto Riccelli) lutava contra a posse ilegal das terras habitadas por sua tribo. O grande inimigo era Lalau (Tony Correia), cuja noiva Estela (Bruna Lombardi) se apaixonava por Aritana.
No ano de 1982, Janete Clair escreveu a novela Sétimo Sentido, que trazia a jovem Uiara (Neuza Caribé), criada pela família Mendes e que se envolvia com Tony (Paulo Guarnieri), caçula dos ricos Rivoredo. Em 1986/87, Ivani Ribeiro mais uma vez inseriu numa de suas histórias um personagem indígena e uma discussão sobre o tema: em Hipertensão, novela das 19h, Chico (Stênio Garcia) era alvo da implicância da prepotente Donana (Geórgia Gomide), cujo falecido marido havia doado as terras onde o índio vivia. Ele estava na cidade de Rio Belo, onde a história se passava, para encontrar uma machadinha sagrada que havia sido roubada pelos brancos.
A Rede Manchete levou ao ar em 1991 a minissérie O Guarani, escrita por Walcyr Carrasco a partir do clássico literário de José de Alencar, que trata do amor entre a nobre branca Ceci (Angélica) e o índio Peri (Leonardo Brício), no século 18. No final do mesmo ano a emissora lançou o audacioso projeto de Amazônia, que pretendia reviver o êxito de Pantanal (1990) ambientando agora o enredo no Norte do Brasil e dividindo-o em duas épocas: o final do século 19 e o princípio do 21.
Em 2000, a minissérie A Invenção do Brasil, projeto de Guel Arraes e Jorge Furtado, exibiu em uma semana uma versão bem-humorada da chegada do homem branco às nossas terras, com o romance de Caramuru (Selton Mello) com a bela índia Paraguaçu (Camila Pitanga). Também foi quando Adriano (Cláudio Heinrich) fora reencontrado por seu avô Nikos Karabastos (Lima Duarte) após muitos anos desaparecido, período durante o qual vivera com os índios em Uga Uga, novela de Carlos Lombardi.
Em 2005 a minissérie Mad Maria, de Benedito Ruy Barbosa com base no romance de Márcio de Souza, trouxe o ator Fidélis Baniwa na pele de Joe Caripuna, um personagem que demonstrou bem a crueldade a que o homem branco submeteu o índio no Brasil – e isso já em tempos mais modernos, uma vez que a minissérie se passava no início do século 20. Ao ter descobertos os roubos que praticava no alojamento dos operários da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, o índio teve as mãos amputadas violentamente. No mesmo ano dois outros personagens indígenas marcaram presença: a Índia (Bumba), que trabalhava na casa da família de Ademilde (Arlete Salles) em A Lua me Disse, de Miguel Falabella e Maria Carmem Barbosa; e José Aristides (André Gonçalves), apaixonado por Serena (Priscila Fantin), protagonista de Alma Gêmea, de Walcyr Carrasco.
Walther Negrão desenvolveu em Araguaia (2010/11) a história de uma família marcada por uma maldição. A índia Estela (Cléo Pires) acaba se apaixonando por Solano (Murilo Rosa), de quem se aproxima por ser filho de seu marido Fernando (Edson Celulari) e para se certificar de que a maldição que envolve sua tribo e a família de Antoninha (Regina Duarte), mãe de Fernando, se cumpra.
No ano passado, a novela Novo Mundo, estreia de seus autores Thereza Falcão e Alessandro Marson como titulares, traçou um rico retrato dos índios no Brasil à época em que a trama se passava – antecedentes da Proclamação da Independência, que ocorreu em 1822. O bonito romance entre Piatã (Rodrigo Simas) e Jacira (Giullia Buscacio) alinhavava a abordagem dos costumes dos índios e sua posição diante da tomada de seu território pelos europeus. O padre Olinto (Daniel Dantas) era um personagem interessante – embora branco e português, ao se revoltar com a postura da Igreja Católica em relação aos índios passou a viver junto deles, na floresta.
Graças a anos e anos de visões parciais e erradas, os brasileiros não sabem muito a respeito dos povos indígenas, possuindo a seu respeito em geral uma visão deturpada. Com a importância da teledramaturgia, é fundamental que ela aborde sempre que possível temas históricos como a formação do Brasil como nação, para que os espectadores conheçam mais a fundo, ainda que sob o manto da ficção, a História de seu País.