Felipe Rocha explica Paulo, seu personagem em Malhação Vidas Brasileiras: “Ele é um cara inseguro e fraco”

Publicado em 26/02/2018

Paulo, personagem do ator Felipe Rocha em Malhação: Vidas Brasileiras é casado com Gabriela (Camila Morgado), a protagonista da trama, e viverá um grande dilema em sua vida. O rapaz que é pai de 3 filhos, ficará enciumado ao descobrir que a esposa irá iniciar um projeto de inclusão ao lado de seu namorado de adolescência Rafael (Camo Dalla Vecchia). Temendo uma possível traição de Gabriela, ele tentará fazer com que a esposa deixe de trabalhar. O Observatório da Televisão esteve no evento de lançamento da nova temporada da novela nos Estúdios Globo no Rio de Janeiro, e conversou com Felipe, sobre o personagem, sua preparação e interação com o elenco. Confira:

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Atrás de um grande homem, tem uma grande mulher. Mas, na trama, parece que atrás de uma grande mulher, tem um grande homem também, né? Fale um pouco do seu personagem para a gente…

“Eu não sei se ele é um grande homem não. Ele é muito inseguro. Ele gosta muito dela, mas pela insegurança dele, esse amor ultrapassa o limite do que eu acho que seria saudável e vira uma interferência de machismo. Quando ele fica sabendo que ela vai trabalhar com o Rafael (Carmo Dalla Vecchia), que é esse amor do passado dela, ele fala, não vai trabalhar, fica em casa ou vai trabalhar comigo no restaurante, eu desaprovo radicalmente, então, também vai ser interessante com este personagem suscitar no telespectador essa dúvida, esse questionário de até que ponto o amor é saudável, até que ponto não.”

E essa drama acabou chegando numa hora boa, né? Parece que a trama é todo o discurso da Oprah, do feminismo…

“Sim. Tem muitos assuntos de gêneros, de raças, de preconceito de homofobia, racismo, machismo e gordofobia. Eu acho que a série está aí para discutir estas questões. Cabe ao personagem do Paulo, trazer com muita intensidade a questão do machismo.”

Sobre o seu personagem, quem é ele?

“Ele é casado com a Gabriela, pai de três filhos, dois deles estudam na escola. É dono deste, o café Le Kebec, onde os alunos se encontram. Ele gosta muito da mulher, gosta muito da família e quando ele vê que a essa estrutura amorosa da família está em perigo, ele é um cara inseguro e fraco, que descamba para um lugar de machismo, que eu acho errado.”

Como está sendo para você essa troca com a nova geração?

“Eu acho o elenco jovem todo muito especial. Fiquei muito feliz, eu fui um dia, quando eles estavam terminando a seleção, fiquei muito impressionado. Além de serem ótimos atores, são pessoas que estão conscientes da importância do lugar que eles estão ocupando aqui. Da quantidade de jovens que vão estar vendo eles e se identificarem de algum jeito. Um menino gay, vê um personagem gay e dizer: ‘esse cara se parece comigo’. Uma menina negra ao ver uma atriz negra dizer: ‘a cor da pele é igual a minha’. Um cara gordo ao ver um personagem gordo vai dizer: ‘esse cara tem meu peso’. Então, muita gente vai estar se espelhando nesta série. E, eu sinto que esses atores jovens do nosso elenco têm essa consciência, da importância do trabalho que eles estão tendo de suscitar uma série de assuntos que os personagens deles estão trazendo.”

Como você falou, seu personagem é muito machista. Quando você recebe os capítulos e lê algumas falas dele, você, como um homem centrado, que não tem nada a ver com o personagem, dói um pouco? Você lendo ali e pensando que realmente existe gente assim.

“Mas, a gente é assim. Eu sou assim, você é assim. As pessoas que estão ouvindo a gente são assim. O preconceito, ele está na gente. Nós queremos ser pessoas bacanas. Mas, se olharmos de verdade, a gente vai perceber que a gente tomou uma atitude preconceituosa. Então, o barato é estarmos abertos para olhar para isso e tentar mudar.”

Todo mundo é um pouco preconceituoso, né?

“É, todo mundo mesmo. A vida está caminhando muito rápido e as minorias sociais estão conquistando lugares muito bacanas, graças a Deus. As mulheres, os negros, os gays, os gordos e todas as outras pessoas que recebem algum tipo de preconceito estão conquistando lugares. E agente está descobrindo uma série de atitudes que achávamos normais, como extremamente preconceituosa e não dávamos conta disso.”

Malhação tem um público muito fiel, o público adolescente. Você está preparado para esses fãs mais intensos, para essas pessoas que vão te parar na rua?

“Vamos ver. Eu já fiz um personagem mais importante na novela, e era curioso. Haviam umas situações curiosas. Às vezes eu ficava numa loja, e quando minha mulher voltou, tinha uma multidão em cima de mim. Eu falava: ‘pelo amor de Deus, não me deixa sozinho’. Enfim, a gente vai ficando mais macaco velho, mais carimbado e acho que isso faz parte do trabalho, e é um jeito da pessoa demonstrar um carinho que ela sente pelo personagem. No meu caso, que é um personagem meio querido e meio vilão, pode ser que eu experimente reações agressivas. Por que as pessoas, infelizmente, confundem o ator com o personagem. Vamos ver o que vem por aí.”

Como está o seu Brasil?

“Cara, o meu Brasil está muito mal. Em todas as instâncias. Aqui no Rio de Janeiro, prefeito, governador, e presidente são uma calamidade absoluta. Eu, se a gente for começar a falar de política, com todas as críticas que eu posso fazer ao PT, eu acho que teve uma política de cotas, de levar a universidade para o interior, teve uma política de classe mais baixa que estamos vendo o resultado hoje. E a nossa séria fala um pouco disso, a coisa dos bolsistas, a gente vê que no momento que você investe numa classe que tem menos recursos, aquilo ali é ouro, é precioso. Mas, neste momento, sinto que o país foi tomado pelos ratos e eles estão fazendo a festa, fazendo o que eles querem. Aqui no Rio de Janeiro, agora, essa intervenção do Exército é uma palhaçada, é um negócio para inglês ver, é um show pirotécnico. Se o dinheiro que está aplicado nisso para trazer um tanque, você vai dar um tiro de tanque aonde? É uma palhaçada. Se você pegasse esse dinheiro todo e investisse em escolas, por exemplo, faria muito mais sentido para mim.”

O que podemos esperar de Malhação: Vidas Brasileiras?

“O que a gente está procurando é um lugar de estar perto das pessoas, delas se enxergarem ali, perto, próximas, com afetos. E da gente falando desses temas, preconceitos que a gente vê, que estão aí de racismo, homofobia e machismo. Conversar sobre isso com muito afeto, com muito amor, com muita emoção. Com muitas histórias de amor, onde os jovens estão descobrindo tanto o mundo, o amor, a vida adulta, o sexo, a insegurança, a relação com a grana. Tomara que as pessoas se sintam próximas da gente. Que é o que a gente quer, estar perto das pessoas.”

Seu personagem será ciumento, e aliás, ele vai propor uma aposentaria para a mulher, para ela parar de trabalhar de verdade?

Não sei se é exatamente isso, mas ele tem um restaurante. Ele convida ela para trabalhar no restaurante com ele, na cabeça dele, ele está propondo uma coisa legal, mas ela é professora, a vida dela é outra. Ele não está olhando para ela de fato, ele está olhando para ele, para a insegurança dele, para os desejos dele.

Ele vai batalhar por esse amor?

Muito. É o que ele vai fazer. Durante um ano e meio.

Como é a história do seu personagem no Le KebeK?

Sim. Ele adora o trabalho, adora cozinhar. Tem a Marli, que é a assistente dele, que é superdivertida. E lá é isso, ele se relaciona com os alunos da escola. O Le Kebek é o ponto de encontro dos alunos.

Qual a semelhança sua com o teu personagem?

Eu também sou de me entregar muito nos amores, vou com tudo. Mas, tem essa grande diferença, eu faço de tudo para respeitar o espaço do outro. Que é uma coisa que o Paulo não enxerga, a insegurança dele faz com que ele ultrapasse o limite do respeito e caia no lugar machista de interferência na vida do outro, que não é legal.

O Paulo faz de tudo em casa. E você? Também sabe fazer as coisas na sua casa?

Acho que sim. Eu moro sozinho e tenho duas filhas que passam grande parte da semana comigo. Então, tem essa coisa de cozinhar, volta e meia eu lavo roupa, passo uma vassoura na casa, essas coisas de quem mora sozinho.

Como é a parceria com a Camila Morgado e com esses atores que fazem seus filhos?

Camila é o maior barato. Uma companheirona. Ela e o Carmo Dalla Vecchia, que são os parceiros deste triângulo amoroso. São dois parceiros muito queridos. Maior barato trabalhar com a Camila, muito receptiva, muito criativa, muito amorosa, enfim, uma companheirona mesmo.

Ao mesmo tempo que o Paulo é dono de casa, ajuda nas tarefas de, se torna machista, ao descobrir dos sentimentos da sua mulher por outro rapaz. Como é este caráter duplo do personagem? Que ao mesmo tempo, realiza algo que não é muito comum, que é ajudar em casa, e ser machista também?

Eu acho que é como na vida, assim, eu sinto que a sociedade está caminhando muito bem e muito rápido. Então, a gente tem muito machismo, racismo, homofobia, gordofobia, enfim, mil tipos de preconceito. E nós, que nós achamos bem-conceituados, pessoas legais, e volta e meia a gente se depara fazendo atitudes preconceituosas. Então, eu acho que essa riqueza que tem o personagem do Paulo, é uma riqueza que o ser humano. Eu, você também, provavelmente, a gente pode olhar para coisas que fizemos a um ano atrás, que foi uma atitude machista, mas que a gente não dava conta, então, eu acho que é isso, acho que toda forma de preconceito está escondida nos lugares, até mesmo nas pessoas que se dizem mais bacanas. Não só dizer, ‘’aí, eu quero ser a favor do feminismo, eu quero ser contra a homofobia ou racismo’’, mas, tentar enxergar e olhar com clareza para mim e perguntar, aonde eu sou preconceito? Aonde eu posso ser menos? Eu posso ser menos.

Camila disse que seu personagem será pegajoso, que vai querer ela só para ele. Que tipos de atitudes ele vai tomar? E o quanto a chegada do personagem do Carmo vai afetá-lo?

Então, a chegada do personagem do Carmo, o Rafael, desestabiliza o Paulo completamente. Por que o amor dos dois, da Gabriela e do Rafael é muito forte. Por mais que seja de 20 anos atrás, ele sabe que a chama ainda está lá, e como ele é um cara inseguro, ele fica totalmente desestabilizado. Aí chega no ponto de dizer para ela, ‘’não vai trabalhar, sai da escola, fica em casa, vai trabalhar no restaurante comigo’’, que são atitudes totalmente invasivas, não respeitosas com o espaço do outro, é um ato de falta de respeito absoluto. E é isso que eu acho legal na série, deixar o espectador para ele se dizer, ‘’pô, mas espera aí, esse cara gosta desta mulher, mas está certo isso ou não está? É legal deixar essa reflexão para o espectador.

Qual a importância de falar disso, de feminismo em uma ideia que é totalmente voltada ao público jovem?

Eu acho que esta garotada está muito na nossa frente, eles estão ocupando as escolas, estão na frente das manifestações todas. É uma juventude muito bonita que está aí. Eu acho que eles sabem mais do que a gente, inclusive. Ao mesmo tempo, informação nunca é demais e a televisão tem um alcance muito grande. Certamente, muita gente vai olhar para essa série e vai refletir sobre o preconceito que tem. Eu acho que temos muito que falar, o preconceito ainda está muito presente na nossa sociedade, ainda tem muito que pensar e conversar sobre isso, e fico muito feliz em trabalhar numa série que está levantando esses temas.

*Entrevista feita pelo jornalista André Romano
Colaboração Guilherme Vilas Boas

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