Nany People fala sobre a personagem, contraponto da vilã em O Sétimo Guardião: “Chega para causar e muito”

Publicado em 05/11/2018

Em O Sétimo Guardião, Nany People interpretará Marcos Paulo. Segundo a atriz, é o único personagem da trama de Aguinaldo Silva que consegue situar Valentina, vilã vivida por Lilia Cabral. Em entrevista ao Observatório da Televisão, Nany falou sobre sua trajetória no teatro, e além de ter relatado a surpresa com o convite do próprio autor da trama. Confira o bate papo:

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Como surgiu o convite para O Sétimo Guardião?

“O Aguinaldo me chamou e perguntou se eu poderia ir ao Rio. Eu muito na minha falei ‘Em julho é meu aniversário, eu devo ir ao Rio combinar com um amigo meu de infância’, e ele disse ‘Não Nany, preciso de você para ontem’. Cheguei no Rio dois dias depois, ele mandou o teste para mim. Fiz o teste duas vezes, um num tom mais dramático e outro num tom mais jocoso. 15 dias de se passaram, no dia que estourou a greve dos caminhoneiros, a produtora da Globo me ligou. Achei que era trote, porque já tinha caído em vários trotes do Pânico fazendo piadinhas.

Já fui convidada até para ser enredo de escola de samba e achei que era verdade, mas era piada do Pânico. Resumindo, eles disseram que gostaram muito e perguntaram se eu podia voltar ao Rio para bater um papo com o Rogério Gomes. Só que a notícia vazou. Antes de eu falar com o Papinha, a Patrícia Kogut deu uma nota falando sobre, quando eu acordei estava o mundo inteiro atrás de mim. Vim, conversamos por meia hora com toda a direção e produção. Fiz prova de figurino e comecei o workshop para botar a mão na massa”.

Parceria com Lilia Cabral

Como foi seu encontro com a Lilia Cabral?

“Quando vi Lilia Cabral na minha frente não sabia se ajoelhava, se acendia uma vela, chamava o Samu ou tomava água com açúcar (risos). Pedi um abraço e foi lindo. Como minha praia é teatro, começamos a conversar e descobri que convivemos com muitas pessoas em comum. Acho que é um encontro de almas”.

A sua personagem, o Marcos Paulo vai entrar no meio da trama?

“Ela chega em Serro Azul por volta do capítulo 30. O que aparece antes são os preâmbulos dela”.

Conta para a gente um pouco sobre a personagem. Ela está vindo para causar?

“Chega para causar e muito. Marcos Paulo é o ponto de saturação da Valentina, o calcanhar de Aquiles, inimigo íntimo da vilã. É o único que fala ‘filhinha, acorda para a vida. Acorda viado’. Tem um texto muito intimista, tipo ‘ta boa mona? tomou água de chuca?’. Ela falaria isso para a amiga, porque elas se conhecem do passado. Marcos Paulo ajudou Valentina a fazer a fortuna que fez. Em algum momento tiveram uma treta, que até o capítulo 42, não é dito qual. Quando a Valentina resolve voltar  para Serro Azul, ela precisa descobrir o segredo da água de lá. Ela liga para o Marcos Paulo mas não sabe que ele acabou de fazer a cirurgia de resignação sexual. Tem até uma cena que ela encontra o Gabriel e diz ‘como você cresceu, te ensinei a andar de pedalinho’ (risos)”.

O nome Marcos Paulo

E essa questão de ela não mudar de nome?

“Até o fato de não mudar de nome, ela faz para causar. Faz questão de ser respeitada, e isso tenho em comum com ela. Ela não tem vitimismo, isso é importante ainda mais num momento como esse. Dei uma entrevista à Marie Claire, e falei que as pessoas estão muito encaretadas demais. Em 2001 eu fazia programa da Hebe, um programa para a família brasileira. Imagina hoje uma drag sendo repórter? Ser transexual para mim nunca foi problema, porque aprendi em casa com minha mãe quando foi chamada pela diretora do colégio que eu estudava em Poços de Caldas quando criança.

A diretora disse para minha mãe: ‘seu filho tem um problema’, ela respondeu: ‘Problema não. É a condição dele, cabe a mim como mãe fazer dele a pessoa mais feliz do mundo’. A pedra no sapato é ele se recusar a mudar de nome. Essa foi uma imposição do Aguinaldo. Imagina quando ele resolve sair um dia para dar uma badalada em Serro Azul? Porque ele diz: ‘Eu não fiz o que fiz para ficar fazendo a freira’. O bom disso é que não é a vilã. Quando você coloca humor na coisa, qualquer discurso para ser pertinente tem que ser bem-humorado”.

Antes de chegar a Serro Azul, onde Marcos Paulo estava?

“Antes de chegar à cidadezinha, ele estava em Paris. A Valentina liga para ele e ele acabou de fazer a cirurgia, mas a Valentina não sabe. Então ela está esperando uma entidade, e chega a nova loira do Tchan, a porção mulher que até então vivia resguardada”.

Carinho do público

O meio do entretenimento é cheio de muito ego. Porém quando você foi anunciada na novela, todos te elogiaram. Como você recebe esse carinho?

“O bom de ter 53 anos é a maneira como se leva a sua vida, e a constrói. A minha vida foi galgada no teatro, onde fiz a minha história. Completei 33 anos de São Paulo. Cheguei em São Paulo com 20 anos, fiz Macunaíma, fiz Sessão Universitária na Unicamp, trabalhei no teatro Paiol, e fiz a minha história acontecer na TV linkada ao teatro. Uma vez perguntei ao Magal, que estava sendo entrevistado na roda de mulheres na Hebe, o que ele fez para não ser varrido para baixo do tapete nos anos 70, porque ele continuou na mídia fazendo peças de teatro, e novelas.

Ele falou uma coisa que nunca mais esqueci. Ele disse: ‘O que eu faço é camarim. Porque não basta você ser brilhante em duas horas e meia de peça, não basta ser brilhante em uma hora e meia de filme, você tem que ser brilhante no viés dos bastidores porque é isso que faz com que não tenham dúvidas do seu caráter, porque a sua qualidade de caráter não pode ser perdida”.

Isso eu dou graças a Deus. Viajo o Brasil de A a Z, e o pessoal pode me ver duas e meia da manhã numa encruzilhada, mas para e me pergunta ‘Dona Nany, está indo fazer peça ou show onde?’ Já linkam meu nome a isso. Cheguei com 53 anos na Rede Globo, depois de ter feito Manchete, Record, SBT, Bandeirantes, Multishow, e cheguei aqui num núcleo desses com Rogério Gomes dirigindo, Aguinaldo Silva, Lilia Cabral, musa inspiradora de uma geração. Acredito que aquela coisa do universo conspirar a favor é isso”.

Nome social

Falando de conspirar a favor, você veio para a Rede Globo como Nany People, já no RG.

Um outro presente! Diferente do Marcos Paulo que faz questão de não mudar de nome, essa era uma coisa que eu queria há 18 anos. Há 18 anos estou tentando isso. Antigamente o processo era muito mais complexo, era mais burocrático, inclusive clinicamente. Hoje me apresento como Nany People Cunha Santos, muito prazer”.

E quando você olha para trás, lembra daquela menina que chegou em São Paulo, o que passa na sua cabeça? Você já queria chegar tão longe?

“A gente nunca faz as coisas por projeção. Você faz as coisas ou por instinto de sobrevivência, ou necessidade. Tenho um texto da Marília Pera, que fazia Elas por Elas, que ela falava ‘a criança que fui assistindo, ouvindo o trabalho dessas grandes mulheres, atrizes, cantoras, essa criança permanece viva dentro de mim, imutável, encantada”. O viés da história é que vai dizer ou ser interpretado como querem. Aí tem aquela coisa que falei da roda da fortuna e inconsciente coletivo serem a favor de você. As pessoas vão pensar: ‘Essa merece estar ali, essa ralou a periquita na rodovia da vida (risos)’”.

Está preparada para ser chamada de global?

“Imagina! A gente está preparada para ser chamada de tanta coisa, que o que pintar agora é lucro. Com 50 anos o que pinta é lucro. Se a pessoa me falar ‘vai pra tonga…’, eu respondo ‘vou querido, mas vou feliz, porque quem vai pra tonga é feliz, olha pra mim’”.

Oportunidade

Você acha que essa oportunidade veio na hora certa ou demorou muito?

“Tudo vem na hora certa. Eu precisei provar para as pessoas que estou acima da personagem que criei enquanto drag. Até quando me tornei trans muita gente teve um estranhamento muito grande, pelo fato de eu ter feito minha vida midiática nesses programas populares, começando como jurada, repórter na Manchete… tudo isso fazendo teatro. A vida vai virando uma colcha de retalho, que quando você olha não sabe quem faz parte do barrado ou do miolo da colcha. Por isso, acredito que veio na hora certa. Se tivesse vindo antes, não teria tempo nem de surtar. Não dá tempo nem fazer a linha blasé”.

Como é o look dela?

“Aí você tem que ver. Só te digo uma coisa, Serro Azul está jogada no tempo. Não tem internet, não tem nada. O sopro de modernidade que vai chegar em Serro Azul vem por Valentina que é chiquérrima, e Marcos Paulo que chegou de Paris. Imagina a missão francesa chegando ao Brasil”.

*Entrevista feita pelo jornalista André Romano

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