Vivendo Dona Agustina em O Tempo Não Para, Rosi Campos comenta conservadorismo da personagem: “Outras crenças”

Publicado em 19/07/2018

Dona Agustina é a matriarca da família Sabino Machado em O Tempo Não Para – nova novela das 19h da Globo. Vivida por Rosi Campos, a conversadora dona de casa ficará congelada após um navio naufragar nas águas da Patagônia em 1886. Presa em um imenso bloco de gelo, ela viajará por mais de 130 anos pelo oceano até chegar na praia do Guarujá, São Paulo, onde será resgatada e reinserida na sociedade.

No entanto, essa “volta à vida” não será nada fácil. Com costumes e pensamentos do século XIX, Dona Agustina não aceitará o estilo de vida do século XXI. Em entrevista ao Observatório da Televisão, a atriz Rosi Campos contou detalhes sobre sua nova personagem e sobre a trama escrita por Mario Teixeira, que estreia no próximo dia 31 de julho. Confira:

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Com será O Tempo Não Para?

É uma novela bem divertida, nesse sentido de ter essa família que acaba sendo congelada em 1886 e é descongelada em 2018. Traz daquele tempo todo uma maneira de ser, um comportamento, crenças, religião, aventuras.

Rosi Campos define Dona Agustina

A sua personagem será uma das congeladas do início da trama. Fala um pouquinho sobre ela.

A minha personagem, a Agustina, tem esse lado mais conservador. O Sabino (Edson Celulari) não. O Sabino é um homem progressista, um homem que faz coisas supermodernas naquela época e tinha uma visão do futuro. A Marocas (Juliana Paiva) também já é uma moça mais espevitadinha, querendo ver coisas novas, diferentes.

A minha posição dentro da família é de resistência. Eu não acho legal esse mundo novo que a gente entra, não concordo com os costumes, acho que está tudo errado, que é um mundo de perdição. Ela mete o pau em tudo que acontece agora. E é muito engraçado porque é uma pessoa que veio de outro comportamento, com outras crenças.

É uma novela com esse contraste muito engraçado. E não só isso, com contrastes sociais, tecnológicos, burocráticos, coisas até que vêm daquela época e que continuam até hoje. O homem não muda tanto assim. Melhora umas coisas, piora outras, e assim a humanidade vai indo. Eu acho que o grande choque interessante é exatamente esse: como é que cada um vai se adaptar? Porque os escravos vão ter posturas diferentes, a Marocas vai ter outras. As minhas filhas gêmeas vão ter outra relação com esse mundo moderno.

Destino da família Sabino Machado

Qual vai ser o destino da família Sabino Machado após o descongelamento? A vida luxuosa de 1886 vai continuar?

A gente vai acabar se encontrando com pessoas como Solange Couto (Coronela) na pensão, que vai ser uma bagunça. Vamos morar na casinha do Milton Gonçalves (Eliseu).  A gente gravou numa fazenda linda e enorme em Sapucaia, que foi a da família Lordello. Então, eram pessoas muito ricas, donas de praticamente uma fatia (de terra), como era antigamente. Te davam as seismarias, as capitanias, e você era dono de uma quantidade monstruosa de terra.  Da Freguesia do Ó até o Pico do Jaraguá eles eram muito ricos. Daí acabam numa casinha.

Como ele (Eliseu) é negro, ela fica: ‘nossa, ele é escravo. Estamos numa senzala’. Até ela entender o que aconteceu vai demorar, o que é engraçado porque é um processo mais lento de adaptação, e eu não sei até onde vai essa adaptação dela. Eu espero que ela resista bastante porque para mim dá um caldo gostoso.

Criogenia

A criogenia vai ser um tema bem diferente para o público. Como o elenco está lidando com essa abordagem?

É bem diferente. A gente teve uma preparação muito legal, tanto física quanto de comportamento, de linguagem. A gente teve a Mami que dá as aulas de comportamento, de como as pessoas eram eretas e de educação também. Fizemos uma preparação muito interessante dos congelados e com a relação com os escravos que era muito diferente. O Dom Sabino nunca bateu nos escravos. Ele tinha uma relação moderna com os escravos. O escravo entrava em casa, tinham os escravos que serviam diretamente a casa. Nós tínhamos os escravos que dormiam com as meninas, então era diferente. Ele era um cara moderno também nesse sentido.

Ele era abolicionista e a filha dele também (Marocas). São aspectos bem diferentes e esse contraste que vai fazer essa brincadeira toda. E trazer à tona muitas coisas de confrontamentos, de pensamentos e de coisas que mudaram, ou não mudaram. É uma história bem frenética.

A Agustina é uma mulher conversadora e o Dom Sabino um homem visionário. Essas características tão diferentes podem gerar conflitos entre o casal?

O Dom Sabino quando vem para cá (ano 2018) fica impressionado com as mulheres de shorts, fica maluco com a Torloni (Carmen). Vai ser engraçado porque eu estou naquele momento de velharia e ele está vendo tudo que há de novo, maravilhoso e moderno. Ele vai se encantar com as máquinas, com as invenções, com todas as tecnologias, com a luz. A gente não entende nada. Vamos estranhar uma luz, um móvel, um telefone, um banheiro. Eu gravei uma cena em que entrava e dizia: ‘onde eu vou dar banho nas crianças? ’. Você não sabe o que é uma latrina. Vamos descobrir tudo isso e vai ser engraçado, divertido.

Casamento da personagem

A chegada da Carmen, personagem da Cristiane Torloni, vai bagunçar o casamento da Agustina com o Dom Sabino?

Provavelmente. Eu já estou preocupada porque ele já não me olha mais, não me procura porque são muitas atividades. Ele vai fazer massagens… vai ser uma bagunça! E ele vai gostar, claro, é novidade. Eu vou ficar lá sofrendo no meu canto. Eu acho que também tem umas coisas que vão acontecer comigo e que vão ser bem divertidas, mas isso é lá para frente. A gente só tem até o capítulo 29, então não sabemos mais o que vai acontecer.

A Agustina vai ser uma mãe super protetora como a Mamuska de A Cor do Pecado (2004)?

Ela vai ser em relação às meninas e com a Marocas, que o Samuca (Nicolas Prattes) já vai querer casar. Ela vai exigir os ritos religiosos, onde vai casar. Ela vai proteger, mas a Marocas já é muito libertária. Nos primeiros capítulos já acontece tudo: cai de helicóptero, vai para a mata. O cara pega ela na praia num pedaço de iceberg. É uma loucura! E ela acaba vivendo muito intensamente essa vida moderna e se encaixa bem. É meio difícil manter uma coisa antiga num tempo moderno desse.

Reação aos costumes atuais

A novela vai mesclar duas realidades de vida bem distintas. A personagem te fez questionar o que você encara como certo ou errado?

A gente já é meio velho. Fomos criados com muita educação, e uma das coisas que a gente mais sente falta é isso. As pessoas não têm compostura em lugar nenhum. No aeroporto, os caras colocam os pés no sofá. Eu acho horroroso tudo isso. São coisas do cotidiano que você olha e fala: ‘meu Deus, não dá para ter um pouquinho mais de educação? Se reservar publicamente, pelo menos? ’. Eu tenho umas coisas que gosto de preservar, acho que é importante porque é uma coisa do coletivo. Ninguém precisa saber a cor da minha meia.

Outro dia, eu estava no cinema e, de repente, tinha dois pezinhos no lado da minha cadeira. Eu não vou mais em cinema para não ouvir gente falando, mexendo no celular e barulho de bala. Cinema para mim é sagrado. Eu ia no Cine Bijou, em São Paulo, quatro vezes por semana e na hora que abria aquele negócio era um silêncio absoluto. Ninguém ousava falar nada dentro de um cinema. Aí hoje você vai e o povo fica falando, gritando, mexendo na porcaria do celular.

Castelo Rá Tim Bum

Muitas tecnologias surgiram nos últimos anos. Você tem dificuldades em acompanhar essas novidades?

Tenho, tenho. Eu acho maravilhoso para você pesquisar, estudar, se aprofundar nas coisas. Mas essas coisas de grupos, de mostrar o que você está comendo, eu acho um saco. Acho tudo muito superficial.

Você retornou ao teatro com a bruxa Morgana, que foi o seu grande mote nos anos 90 com o clássico Castelo Rá Tim Bum. Como está sendo esse resgate?

Para mim é uma personagem eterna. Eu dou autógrafo até hoje da Morgana. Mas eu senti o seguinte, eu ia fazendo as peças e cada vez mais iam as criancinhas pequenininhas. Os pais que são apaixonados levam os filhinhos, mas os filhinhos têm três, quatro anos. Então eu fazia as peças um pouco cabeça demais e falei que não dava por causa das criancinhas. Aí eu comecei a fazer essa peça que, por exemplo, é muito simples.

A Bruxa Morgana Contra o Infalível Senhor do Tempo é uma peça simples para criança pequenininha, porque senão eles não entendem nada. Agora, os pais vão porque adoram o Castelo Rá Tim Bum, choram quando veem a Morgana. São personagens icônicos nesse sentido, assim como a Xuxa, o pessoal do Sítio do Picapau Amarelo, que eu acho um programa obrigatório. Não devia deixar de existir nunca. O Sítio é maravilhoso! Monteiro Lobato, aqueles personagens, são coisas que preenchem a infância da criança de uma maneira incrível.

Público

Ter essas diferentes gerações acompanhando o seu trabalho ajuda a renovar o seu público?

É, meu público é esse. Agora eu estou lançando livro também, depois de 20 anos. A minha amiga que mora em Boston, a Edel Holz, trabalha no Teatro Brasileiro de Comédia e sempre escreve muitas peças. E ela acabou escrevendo e ilustrando o livro da Morgana. É o três ou quatro (livro) que estamos lançando. O primeiro livro é Morgana e Seus Bichinhos de Estimação, o segundo é Morgana e a Madrinha Maluca. O terceiro é o Rubens Matuck que está fazendo a ilustração para mim e é sobre sexta-feira 13. O texto escrevi com o meu marido e é bem divertido. Também é uma seara nova, não conheço muito. Tanto que é a gente que está produzindo e fazendo porque essa parte editorial é bem complicada.

Inspiração para viver Dona Agustina

E como fica a sintonia do trabalho com a sua amiga morando em Boston?

Ela escreveu a história, ilustrou e mandou para cá. A gente está publicando pela editora Outubro, que é da prima do meu marido lá em Brasília. Eu fiz, sei lá, umas duas mil cópias.

Você se inspirou em alguém para fazer a Agustina, essa personagem que não aceita muito bem as mudanças?

Ah, tem muita gente assim. Eu mesma em alguns aspectos sou, então estou exagerando um pouco.

Em 1886, o Brasil vivia num império e o centro das atenções era o Rio de Janeiro. Por que apresentar a família Sabino Machado em São Paulo?

O Hospital Emílio Ribas foi construído muito longe do centro de São Paulo porque era um lugar de doenças epidemiológicas, de doenças transmissíveis. Tinha até um cemitério no Emílio Ribas. Hoje em dia, ele está no centro de São Paulo. Então, São Paulo era o fim do mundo. Existia o Rio de Janeiro e a Família Real. São Paulo era uma coisinha lá nos “cafundós do Judas”, bem pequenininha. A gente não tem essa dimensão porque, hoje em dia, São Paulo é muito grande. Mas lá tem muitas histórias interessantes de famílias que eram donas de regiões enormes. A gente (família Sabino Machado) era a Freguesia do Ó, um bairro enorme de São Paulo também. Éramos donos de tudo aquilo.

Redes sociais

Em um momento, a trama vai abordar o culto ao ego nas redes sociais. Como a sua personagem vai reagir a isso?

A minha personagem eu não sei. Mas, provavelmente, vai existir isso com o pessoal moderno, novo. Tem muitos personagens.

A Rosi Campos se incomoda com as exposições nas redes sociais?

Eu acho um saco tudo isso! Deus me livre! Eu acho um horror! Se fossem todos gênios, tudo bem. Mas ninguém é gênio. Se dessas pessoas, tivessem 10 gênios falando seria incrível. Mas não é! É um povo que se acha, que acha que está inovando. Ninguém está inovando nada. Claro, a parte tecnológica é incrível, maravilhosa. Tem um desenvolvimento que você demoraria 100 anos antigamente para ter. Hoje em dia, em uma semana você resolve problemas incríveis. Mas isso é uma coisa da loucura da tecnologia.

Outro dia, eu vi um documentário dessa tecnologia Y e até entendi mais. É um documentário que fala do Youtube, fala do chefão da Apple, o Steve Jobs, que começou tudo numa garagem. E é muito louco você imaginar que são garotos. Antigamente, você ia ter dinheiro com 60 anos, ia ser “fulano de tal” com 70. Hoje em dia, menino de 25 está rico, milionário, inventando aplicativo. O meu mundo acabou! O mundo que a gente foi acostumado e se preparou não existe mais. O mundo hoje é totalmente diferente e com dificuldades muito grandes, porque vocês vão vivendo uma flutuação horrorosa. Sei lá o que vai ser daqui a 10 anos.

Sociedade atual

Algo chama a sua atenção na sociedade em que vivemos?

Não, não tenho muito interesse. Mas, outro dia, eu fui num lugar muito legal de coworking. Eu achei um máximo aquilo, aquele povo jovem porque, hoje em dia, você tem que ser um leão para sobreviver num mundo de absoluta instabilidade. Eu fiz jornalismo, não fiz teatro, e achava que ia trabalhar no Estadão, na Folha. Hoje em dia vai trabalhar aonde? Não tem nem jornal mais. Os meus amigos jornalistas estão todos ferrados.

*Entrevista feita pelo jornalista André Romano

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