Edson Celulari elogia Mario Teixeira, autor de O Tempo Não Para: “Foi muito feliz nessa abordagem de tema”

Publicado em 19/07/2018

Edson Celulari é Dom Sabino, um empresário de sucesso do século XIX, progressista e ético que passará 132 anos congelado no oceano após o imponente navio Albatroz naufragar durante uma viagem. Casado, pai de três filhas e dono de escravos leais, ele será reinserido na contemporânea sociedade brasileira ao ser resgatado de um imenso bloco de gelo que surge na praia do Guarujá, em São Paulo.

Se vendo como um verdadeiro viajante do tempo, Dom Sabino terá dificuldades em se adaptar ao novo estilo de vida do século XXI. Ao Observatório da Televisão, Celulari contou um pouco sobre as aventuras que seu personagem viverá em O Tempo Não Para, nova novela das 19h da Globo. Escrita por Mario Teixeira, a trama estreia no dia 31 de julho. Confira:

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Visual

Fala um pouco sobre esse visual adotado para a novela.

Pois é! Século XIX era uma outra estética, uma outra cultura, outros hábitos. Enfim, é um visual lindo. Eu estou achando lindo e também tem uma liberdade. A Paula, nossa figurinista, criou um conceito de cores, peças um pouco mais coloridas, mas dentro do padrão do final do século XIX. Tem cartola, casaca, coletes e botas porque ele é um homem do campo.

Numa cena de casamento, ele vai com fraque e com botas, por ser um homem do campo e que adora tirar vaca do brejo, de desatolar vaca. Enfim, é um homem fazendeiro. E eu acho que é um visual diferente. Eu não me lembro de ter usado em nenhum outro personagem.

O cabelo grisalho é natural ou foi pintado para a novela?

Não, é meu. É meu até esse trabalho, pode ser laranja no próximo, verde no outro (riso). Mas, por enquanto, esse aqui é meu.

Edson Celulari fala sobre trama de O Tempo Não Para

Como será O Tempo Não Para?

É uma novela linda! É uma comédia realista de uma família que vive no século XIX e que por um acidente, que acontece numa viagem, é transportada congelada num iceberg para a costa do Guarujá (São Paulo). E ela chega no contemporâneo, nos dias de hoje. Vai enfrentar, obviamente, essa diferença de 132 anos com uma tecnologia completamente diferente e com um ser humano que se esperava encontrar melhor, e acho que não encontra. Encontra igual ou muitas vezes pior do que aquele ser humano que vivia no século XIX.

É uma história muito interessante. O Mario foi muito feliz nessa abordagem de tema. Eu acho que vai dar muita discussão interessante. O público vai se interessar porque não é só esse ineditismo de um grupo do século XIX nos dias de hoje. Essas surpresas, claro, vão se desgastar no início, mas depois os personagens entram em tramas do folhetim mesmo, cada um com sua história. E são muito divertidas e interessantes. Tem os casais românticos, os temas mais divertidos e a questão da família que é muito abordada também.

Dom Sabino

Qual a história do Dom Sabino, o seu personagem?

Dom Sabino é um homem de um temperamento único. Um homem decidido, vive para a família, muito dedicado. Tentou três vezes um filho homem e teve três meninas, que ele ama. Ele sente falta de um filho varão para poder ser herdeiro. Na tradição quem cuida é o filho homem. Ele vai se confrontar com esse mundo de hoje de uma forma muito particular. Ele é um homem que não aceita injustiça e vai enfrentar situações muito engraçadas. Vai enfrentar a lei, juízes.

Tem a questão das terras que ele já não tem mais. Ele era dono de metade de São Paulo. Aí quando se vê sem nada, vai atrás dos seus direitos. É uma luta que ele tem pela frente para poder defender e cuidar da família.

As evoluções tecnológicas ficarão bem nítidas na trama. Como você lida com essa questão? Sente dificuldades?

Eu me lembro de um aparelho celular que era um tijolo. Eu enfrento com muita naturalidade. Às vezes, eu fico surpreso e até procurando coisas novas. O Dom Sabino é um progressista. Ele é um cara que, obviamente, é instalado naquele sistema de império e que tinha os escravos. O acidente acontece dois anos antes da abolição da escravatura. Mas, ao mesmo tempo, ele é um homem muito curioso, que investe em estradas de ferro, telefonia. Ele é um homem ligado as invenções e ao progresso.

Ele acompanha o Thomas Edison na América com relação a eletricidade. Um dos melhores amigos dele é o Visconde de Mauá, que também era um homem ligado a isso. Eu acho que me identifico nesse sentido com o Dom Sabino. Eu gosto do progresso.

Personagem moderno para a época

Além de progressista, o Dom Sabino também era um abolicionista?

Não! Ele defendia o imperador. Ele era contra a república, não aceitava. A história do Brasil com relação ao império, a colonização portuguesa, ele tinha respeito. Mas, ao mesmo tempo, ele era um progressista. Quer dizer, ligado a essas coisas modernas. Mas era politicamente conversador.

Ao ser descongelado ele continua com esse conservadorismo?

Não… e é bonito isso. Como todos, ele começa a reavaliar. Ele diz: ‘O império já não existe mais. A república entrou junto com a abolição. O que foi feito do mundo? As coisas boas foram por culpa da república? As ruins porque faltou um império? ’. Então, essa discussão é muito saudável. Ele reavalia muita coisa e isso que é bacana.

Desafio

Qual o maior desafio de construir um personagem como o Dom Sabino?

Em qualquer novela de época, você tem que ser fiel as informações daquele período. Ao mesmo tempo, você tem uma história para ser contada. Então, você tem que ser fiel, mas também com algumas liberdades para poder fluir a sua história. Eu acho que a dificuldade maior para o Dom Sabino é ele ter o conhecimento que tinha, ser dono de metade de São Paulo, um homem com tanto poder e, agora, ser vítima de uma situação histórica. Quer dizer, ele não tinha herdeiro, eles morreram num navio e as terras ficaram para o império. Então, ele vai lutar pela justiça. Ao mesmo tempo, ele tem uma forma de se expressar que é do período.

Nós tivemos um trabalho de prosódia, de preparação e de comportamento que foi maravilhoso. Ele traz um número de informações muito alto, porque era muito comum na época verbalizar. Hoje, nós temos uma comunicação muito mais visual. Antigamente, as palavras traziam as informações. Então, ele fala muito, é um personagem que fala sem parar. Essa é uma dificuldade que se tem. Ele fala como se falava no século XIX e para improvisar é muito difícil. Porque num dia a dia de uma telenovela você acaba improvisando bastante, por mais que você siga o texto. O Dom Sabino não se permite isso. Então é um fator de dificuldade e, ao mesmo tempo, de prazer porque você tem que elaborar mais. O que me exige mais horas de estudos.

Parceria com Milton Gonçalves

Nos dias atuais, o Dom Sabino terá o Eliseu, personagem do Milton Gonçalves, como um grande amigo. Como está sendo essa parceria?

Eu estou honrado. Nunca tínhamos trabalhado juntos e ele é um homem que faz parte da história da televisão. Um homem negro que faz parte da televisão brasileira, e isso é muito legal numa novela que discute isso tudo. A ética do Dom Sabino é a mesma dele (Eliseu): de chefe de família, ter valores iguais, do respeito, do valor da palavra, do fio do bigode como se falava. Essa comunhão entre os personagens os aproximam. O Eliseu abre a casa dele para receber a família do Dom Sabino. Ao mesmo tempo, ele é um homem que cata material reciclado para fazer dinheiro.

E o Dom Sabino acha aquilo um horror, indigno. No tempo dele, ele não permitiria um escravo fazer esse tipo de serviço. Puxar uma carroça é para boi, animal. Ele não aceita isso, fica indignado. Mas o Eliseu diz: ‘não, é assim mesmo. É a realidade’. E o Dom Sabino vai se deparando com essas questões. Tem uma frase que ele adora dizer: ‘bela abolição está! Estou vendo um monte de criança negra passando fome, um negro que puxa uma carroça. Cadê a abolição? ’. É uma discussão interessante, contemporânea.

Escravidão

Você acredita que a escravidão acabou?

Há vários tipos de escravidão. A escravidão não veio só com o negro aqui para o Brasil. A escravidão existe na história da humanidade há milênios. Infelizmente, ela não terminou. Ela fica, muitas vezes, disfarçada. Com relação especificamente da situação do negro no Brasil, o que eu estou vendo hoje é um movimento muito saudável, de instalação do próprio espaço, de busca, de conquista.

Aqui no elenco da TV Globo, eu acho que se conquistou muito espaço, nas próprias histórias, reivindicações. Hoje um negro não é só empregado, tem personagem importantes. O Lázaro Ramos é um lindo exemplo de um grande ator, de um homem bem-sucedido e ativo na questão do negro. Ele e a esposa (Taís Araújo) também. E tem tantos outros negros. Eu fico feliz de ver isso e acho que é saudável. Mas que tenha acabado? Não, infelizmente não!

40 anos de carreira

Você está completando 40 anos de uma carreira de sucesso. O que você traz do Edson Celulari de lá do início?

A gente não muda, na verdade. A gente continua. Eu acho que adquirimos coisas, perdemos coisas. E nessa troca, eu acho que é a essência que fica. Com 20 anos, eu já tinha saído da minha cidade do interior. Eu sou do interior de Bauru, uma cidade de São Paulo, e vive até os meus 13 anos na zona rural de Bauru. Isso também faz muita diferença. Não morar na zona urbana te dá uma visão de mundo, uma prática de vida diferenciada até nos valores: relação com os animais, a relação com a natureza, o ciclo da natureza, das frutas, da colheita, do plantar da horta e tudo mais.

Eu sou uma pessoa que tem essa simplicidade até hoje, eu carrego isso. E, obviamente, adquiri informação, conquistei espaços que me interessavam e quero outros espaços ainda conquistar. Eu quero começar a dirigir cinema, quero começar a escrever. Tenho muitos projetos ainda pela frente para realizar.

Cuidados com a saúde

Recentemente, você curou um câncer e agora está de volta às telas assumindo um papel de protagonista. Como é conciliar os cuidados com a saúde e atuação?

Quando eu estava ainda no processo do tratamento, eu estava escalado para a novela da Glória (Perez) e ela me ligou. Aí eu pensei que estivesse fora, mas ela falou: ‘Edson, você está com a gente? ’. Eu falei: ‘calma aí, Glória. Quando é que você vai?’. Ela falou a data e eu disse que no período estaria careca ainda. E ela me disse: ‘eu quero você careca, de qualquer jeito’. Aquilo para mim foi um grande estímulo. Mas, na verdade, eu fiz uma participação e foi importante retornar ao estúdio e poder ter contato com o ofício que eu amo tanto fazer. Foi um estímulo também para eu me instalar de prontidão, eu estou pronto para o meu trabalho.

Agora, há muitos anos eu não vejo um (personagem) tão grande assim. Tão ativo, não só em números de textos, mas também as ações. Ele é um homem inquieto, ele briga com um e com outro, está aqui e está lá. É um personagem lindo mesmo! Então, é um espaço que eu já ocupei e que estou realização. Não que eu tenha que fazer só protagonistas. Existem personagens que não são protagonistas e são incríveis, ricos, joias. Neste caso, nós temos um lindo personagem protagonista, imenso, de grande responsabilidade na história e que eu estou assumindo com a maior alegria e até agradecimento. Porque é uma confiança do Mario, do Léo, do próprio Sílvio de Abreu, da casa. E estamos indo, estamos indo muito bem.

Relação de proteção com os filhos

Você falou que o Dom Sabino é um homem esquentado. Ele vai brigar com as pessoas para defender as filhas?

Por causa de tudo. Ele não pode ver injustiça. Claro, se for um homem olhando paras as filhas, ele vai querer já pegar o bacamarte dele. Como no primeiro capítulo, onde ele já sai dando uns tiros para ver se espanta. Ele um personagem com a adrenalina lá em cima, é esquentado, e isso exige até fisicamente. Eu fiz uma cena na fazenda, por exemplo, que é justamente quando ele vai atrás do bacamarte e haja folego. Eu fiquei dois dias sem fazer aeróbico (risos).

E você é completamente diferente do personagem, né? Com relação a proteção das suas filhas, você é tranquilo?

Mais ou menos (risos). Como o Dom Sabino, eu acho que poucos homens contemporâneos. Ele tem um ciúme danado, ele cuida daquela filha. Tem também uma coisa do valor. Quando um moço olha para a filha, aquilo já um desrespeito. Se não pedia autorização para a família para se aproximar já era um desrespeito. E ele vai atrás da lei que acredita ser correto, da ética e dos valores. Então, ele briga mesmo e defende.

Sophia

Como é a relação com a sua filha em casa? Ela está com quantos anos?

15 anos. A minha preocupação não é com relação ao mundo, é com relação a ela, na verdade. O mundo está aí e vai exigir dela o que exige da gente. A questão é saber se ela está preparada para enfrentar esse mundo. Então, eu acho que todos os cuidados que os pais têm é com isso. É preparar o filho da melhor maneira. E a gente nunca sabe se está ou não, porque a cada esquina pode acontecer uma coisa inesperada.

Eu costumo de dizer que a gente sai de casa todos os dias para encontrar na próxima esquina o inesperado. Se a gente soubesse o que vai encontrar na próxima esquina, nem saímos de casa porque iria perder a graça. Só que também, o inesperado te exige uma preparação. Então, a gente sai de casa para encontrar o inesperado, mas de preferência preparado para ele.

Você tem ciúmes quando o assunto é sobre namorado?

Eu pensei que fosse ser mais, estou até me surpreendendo. Acho que o Dom Sabino está me ensinando a como não reagir. A ficar um pouco mais relaxado com relação a isso.

Enzo

Com o Enzo o ciúme também é controlado?

O Enzo é um homem, 21 anos. E por ser homem também, eu acho que tem um diferencial porque a sociedade assimila melhor o homem. Ele leva muito bem (o namorado), com naturalidade. Eu também sempre levei com naturalidade. Acho que tem o estilo e a maneira dele encarar a vida. Ele está se preparando muito bem, começando a descobrir o próprio espaço profissional e está na faculdade também. É um bom menino.

E ele é músico, só não quis assumir. Eu acho que músico é um dom. Ele estudou durante 11 anos, compõe, canta, toca instrumentos, e eu sempre achei que sempre com muito talento. Na verdade, quando tinha que decidir ele falou: ‘olha, pai eu acho que não quero ficar fazendo música, fazendo CD e depois indo vender em programa. Eu quero ser dono do meu negócio. Se for músico, eu quero ser, talvez, dono de um estúdio para poder fazer música para cinema, televisão, em geral.

Eu quero ser dono e não depender de um mercado’. E ele pegou essa transição difícil da música, que a internet veio para tirar os direitos e aquilo tudo, foi muito cruel. Então, ele se assustou um pouco com aquilo e pensou em business. Eu acho que ele foi inteligente e tomara que ele conquiste, com a música ou não, o espaço que ele queira. Ele está cursando administração.

Nova geração de atores

Você terá muitas cenas com Juliana Paiva (Marocas) e Nicolas Prattes (Samuca). Como é contracenar com essa nova geração da teledramaturgia?

Eu tinha trabalhado com a Juliana na novela anterior da Glória. O Nicolas eu não conhecia. Eu conversei sobre a qualidade dos dois que são tão jovens, ele ainda mais jovem, e encaram com seriedade o ofício. A disciplina que eles criam num dia a dia de uma novela não é simples. O interesse de aprofundar os personagens e de fazer o melhor, no sentido de perfeccionismo, que eu acho que a gente tem que ter. O espírito incansável de repetir e, cada vez, que repetiam tentavam o melhor. O senso coletivo que os dois têm de integração. Porque não adianta eu estar bem se o Nicolas não estiver, a novela perde. Então, são dois jovens que tem total senso do coletivo necessário para um trabalho como esse.

Após o descongelamento, o Dom Sabino se encanta pela por uma mulher chamada Carmen. Como ficará o casamento com a Dona Agustina?

Além de ter essa história familiar com o personagem da Rosi, que é a mãe e esposa, ele vai descobrir uma mulher moderna. Também da faixa etária deles, que é o personagem da Carmen, a Cristiane Torloni. Ele vai descobrir uma mulher independente, como ele nunca tinha visto, uma mulher que criou o próprio filho sozinha, uma mulher que trabalha e com opinião. E ele vai, não se assustar, se encantar com isso. E vamos ver para onde essa trama vai levar esse triângulo.

O que esperar de O Tempo Não Para

O que podemos esperar de O Tempo Não Para?

Uma história frenética. Quer dizer, uma história que não vai parar como o tempo.  Tramas ricas, criativas, com propostas de discussões nesse ineditismo de diferenças de tempo. Discussões interessantes e muitas risadas porque são situações também muito engraçadas.

*Entrevista feita pelo jornalista André Romano

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