Primeira repórter transsexual do Brasil revela sonho de conhecer Silvio Santos: “Quero conhecer o Patrão”

Publicado em 25/05/2018

A primeira e única repórter de programas jornalísticos na TV brasileira atualmente, Alana Rocha tem uma história enorme para contar. Jornalista da TV Aratu, afiliada do SBT na Bahia, Alana está no canal desde o ano passado.

De início, ela atuou apenas no programa Ronda, policial exibido na hora do almoço. Agora, já passa por todos os telejornais da emissora, sendo a única transsexual a ser repórter de jornalismo no Brasil – algo importante para a classe LGBT.

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Alan tem uma história de vida forte. Nascida Roque Alan Oliveira da Rocha, ela virou Alana Adrielle Oliveira da Rocha. Pela gratidão com a TV Aratu, ela tatuou até o logotipo da emissora em seu pulso.

Além disso, Alana tem um grande sonho: ser levada para São Paulo e conhecer os grandes nomes do SBT, como Eliana e Silvio Santos, que ela nunca viu. “O Silvio é um ícone, eu assisto o Silvio Santos desde que eu me entendo por gente, esse homem é um gênio da comunicação”, se declara Alana.

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Leia a entrevista na íntegra:

Observatório – Alana Rocha é uma das pouquíssimas jornalistas transexuais desse país, né?

Alana Rocha – Exatamente, trabalhando no jornalismo no qual eu atuo nesse momento, eu sou a única no Brasil.

Observatório – Como que é isso? Deve ser uma honra imensa representar toda uma classe.

Alana Rocha – É uma honra e uma responsabilidade muito grande. Primeiro a honra é porque a gente acaba abrindo muitos caminhos, eu levanto muito essa bandeira de que as travestis, as transexuais e os homens transexuais também, nós merecemos nosso espaço, não é porque nascemos diferentes que temos que trabalhar em determinado seguimento. Na maioria das vezes para as travestis é a prostituição e para algumas trans e algumas travestis é o mercado de trabalho com a beleza, salões, estética…

Então cada vez mais eu acho legal estimular que as meninas procurem a faculdade, terminem seus estudos, hoje os nossos direitos estão assegurados cada vez mais, já eram antes, mas agora com toda essa era digital, essa modernidade que existe hoje, a gente acaba tendo um pouco mais de respaldo. Eu acho que cada uma deve buscar seu espaço, lutar pelos seus sonhos, porque a sociedade está aí, abrindo mais a mente, as leis estão aí para nos proteger, inclusive a última agora que eu fiquei muito feliz que foi o STF aprovar a mudança para o nome social sem muitas exigências, é só simplesmente chegar no cartório, dar entrada em tudo e conseguir mudar, então isso já é uma grande vitória e trabalhar também no que ama é uma grande vitória, porque você trabalhar no que você gosta, você trabalha melhor que é o meu caso, eu trabalho no que eu amo, que é o jornalismo, é a reportagem, você junta o útil ao agradável e é maravilhoso, então você se diverte ganhando.

Observatório – Você poderia contar um pouco da sua história? É uma história de muita luta, né? Nós vimos que você sempre quis fazer isso, batalhava, pedia uma oportunidade e a oportunidade veio aqui na TV Aratu.

Alana Rocha – Verdade. Eu desde criança, minhas brincadeiras eram assistir os jornais que geralmente a tradição aqui na TV baiana é no meio dia e a noite, eu me lembro muito da noite, principalmente o principal da casa que é o Aratu Notícias, hoje comandado por Lise Oliveira. Eu sempre acompanhei. Eu brincava, anotava as notícias e fazia tipo um espelho de jornal. Eu nem sabia o que era espelho e eu mesma fazia sem querer, aí eu sentada fingia que tinha uma câmera na minha frente, brincava no meu quarto fingindo que estava apresentando um telejornal e isso depois foi para as ruas com os meus colegas, eu fazia câmera, fazia microfone com fio de fones quebrados, fingia que era repórter e os meninos embarcavam na viagem, tinha um que era cinegrafista, outro que era produtor, tinha a fonte, a gente ia para uma rua, brincava e aí depois eu trabalhei em uma rádio comunitária lá no interior. Foi quando veio a ideia do blog, na época do Orkut, que despontou essa era de comunicação pela internet, e aí eu criei o blog para o programa, porque as pessoas diziam: “Alana, o programa acaba e às coisas a gente não vê”. Algumas vezes as pessoas queriam ver a imagem do acidente, queriam ver como que o fato aconteceu e pelo rádio só fazia imaginar, que é esse mundo mágico que o rádio proporciona.

Quando eu criei o blog, o programa acabou, eu passei a investir mais no blog e aí veio o sonho da TV mesmo, eu acabei comprando equipamentos, microfone, a câmera, tripé, eu fazia tudo sozinha, a cinegrafista, a editora, a câmera, a motorista do carro, tudo era eu que fazia e aí nessa brincadeira foi quando eu passei a sonhar mais com a faculdade, o diploma me abriu as portas, a vida acadêmica me ensinou muito também, eu era muito verde quando eu fazia o blog e a faculdade me trouxe uma boa estrutura, foi aí que pintou o convite da TV Aratu, através dessa coisa de eu vir aqui também, de pedir, eu toda vez que vinha à Salvador, tinha que passar na rua das emissoras, às vezes eu parava na porta, parava muito aqui na porta da Aratu, ficava olhando e dizia: “Meu Deus, será que um dia eu vou trabalhar aqui?”, de dentro do carro mesmo, olhando, sonhando e graças a Deus deu certo.

Observatório – Apesar de você ter essa aceitação aqui nessa casa, eu queria que você falasse um pouco do preconceito pela sua condição fora daqui. Acontece muito de algumas pessoas lhe tratar de forma cruel?

Alana Rocha – Agora muito pouco, na questão do trabalho em si, não porque quase ninguém percebe, tanto que quando eu chego na delegacia para entrevista os presos, eles me chamam de senhora, doutor, me chamam sempre pelo feminino, doutora é uma coisa que os presos usam muito, qualquer pessoa que aborde eles, que venha indagar eles ali, é doutora ou doutor, mas policiais e delegados, eles usam doutor, doutora ou senhor, senhora, geralmente senhor eles usam para a PM, aí às vezes eu estou ali indagando, perguntando e não percebem, nunca aconteceu. Houve uma matéria há uns 15 dias atrás de um agressor de travestis e aí eu mesma me coloquei como transexual, porque a causa mexe comigo, ele agredia gratuitamente travestis e transexuais em um ponto aqui da cidade e eu me identifiquei.

É muito difícil acontecer, acontece uma vez ou outra no meu Instagram, nas redes sociais, mas bem pouco ou raro de acontecer e acontece no meu meio social, porque eu digo que quando a pessoa se torna pública, morreu a vida pessoal, eu costumo dizer isso. Se eu estiver com a janela do meu apartamento aberta, eu costumo muito fazer isso, eu troco de roupa e às vezes eu estou de sutiã ou com o seio à mostra, se alguém estiver de outro apartamento olhando, tem apartamento de frente ao meu ou está olhando para dentro da minha casa porque quer ver alguma coisa. Então, para mim morreu vida social, se alguém bater uma foto minha ali trocando de roupa e colocar em rede social, se eu estou com a minha janela aberta, estou me expondo e estou propicia a isso, então na questão da rede social de forma pessoal, também parou muito, já aconteceu muito de no interior, pelas pessoas me conhecerem, por eu ser da cidade, era uma forma de ofender quando eu fazia uma matéria que não gostavam ou no meu envolvimento com política, porque eu trabalhei muito com assessoria política lá no interior e aí quando era da minha oposição, os cargos eleitorais usavam minha sexualidade para me ofender, mas eu sempre levei isso de boa, eu dou risada. Outro dia eu estava na rua gravando e uma mulher passou falando: “Olha o repórter traveco da Aratu”, aí a outra olhou e ela falou: “É traveco, um viadão ali”, eu disse: “É velho, sou uma travecona” e aí ela olhou para a minha cara espantada e às vezes eu reajo dessa forma quando a pessoa está próxima, quando é algo esporádico eu faço como se não estivesse vendo.

Observatório – Mas na vida pessoal, tudo tranquilo, as pessoas te aceitam totalmente?

Alana Rocha – Tudo tranquilo, graças a Deus. É como eu disse, para mim a minha vida pessoal morreu, a partir do momento que eu coloquei minha cara na tela, que eu estou fazendo matéria, passo a ser uma pessoa pública, política também, porque se eu fosse uma vereadora, governadora ou uma atriz também de novela ou uma emissora, acaba a vida pessoal, mas em questão de família, questão de amigos, meus amigos são bênçãos e presentes de Deus, todos que entram na minha vida, se tornam pessoas que são bênçãos de Deus, eu costumo dizer que às vezes eu acabo me apegando e eu às vezes pego a pessoa num dia ruim e aí eu digo: “Poxa, será que eu diz alguma coisa para fulano, porque fulano está diferente comigo”, e aí eu estava até conversando com meu colega essa semana, eu estava conversando junto com o Fábio Gomes, um dos apresentadores e repórteres do Ronda, dizendo para ele que eu tinha que perder essa mania, eu me apego demais as pessoas e quando as pessoas ficam um pouco diferente comigo, eu fico cobrando, isso fica parecendo carência, mas na verdade é porque todo mundo que entra na minha vida se torna uma pessoa especial, então quando essa pessoa muda comigo, eu sinto falta, eu sinto um baque, às vezes eu procuro tentar saber o que é para eu tentar manter, se a pessoa escapar não tem jeito, eu não posso fazer nada, mas eu tento segurar.

Observatório – Você é bem simpática, Alana.. 

Alana Rocha – Mais uma vez eu agradeço esse carinho e queria salientar mais uma vez, que o meu papel possa abrir portas. Eu quero ver transexuais advogadas, juízas, policiais, delegadas, médicas, meninas vão para a faculdade, você tem o direito de vocês assegurado, exijam. Se tem aquilo de: “Mas vão me chamar pelo nome masculino”, releve se você for de boa com o meio, diga: “É, eu sou Roque Alan”, porque meu nome é Roque Alan, Roque Alan mesmo, mas me chame de Alana, porque o Roque Alan morreu e vai levando de boa, não pegue as coisas tão pesadas para si, porque você fica aí dentro de casa, sem trabalhar, por causa de terceiros, joga isso para cima, vá para uma faculdade, vai tirar seu diploma para você conseguir um cargo bom na vida e ter orgulho, aí até a sua família vai te procurar, viu?

Observatório – E essa sua tatuagem, é o símbolo da TV Aratu?

Alana Rocha – Isso, é o símbolo da TV Aratu. Quando eu tatuei, muita gente me chamou de louca, falam “Alana e quando você for para outra emissora?”, eu não penso nisso, eu quero me aposentar aqui, mas os destinos da gente quem escreve é Deus, nossa trajetória, nossos caminhos, nossa vida, quem determina é Deus. Se por um acaso eu for para outra emissora algum dia, eu vou dizer que isso aqui está tatuado em mim porque foi uma coisa que representou minha vida, foi um divisor de águas, eu sou a Alana antes e depois da TV Aratu, então eu quis tatuar para simbolizar isso, pelo símbolo da TV, pela frase que eu uso que é: “Comigo o galo canta”, porque o galinho é o símbolo da TV e porque eu acho lindo. As outras emissoras têm logos bonitos, mas para mim atualmente a mais bonita da Bahia, que eu acho é o galinho da TV Aratu, que miscigena vários entendimentos, o galinho de manhã cedo, cantando para você acordar para você assistir ou então o galinho do interior. A Aratu é especial na minha vida, foi a primeira emissora que me abriu as portas, para a primeira transexual da Bahia, realmente no Estado da Bahia não tem nenhuma e do Brasil, trabalhando com jornalismo factual e policial, eu sou a primeira, então simboliza algo muito importante e eu quis guardar isso comigo para o resto da minha vida.

Observatório – Eu já rodei esse país e nunca vi ninguém tatuar a emissora literalmente na pele, isso foi sensacional.

Alana Rocha – Eu amei, é uma forma de gratidão a TV Aratu, não só com a tatuagem, mas também o amor que eu tenho no coração, não só pela Aratu, mas também por todos aqui. Eu costumo dizer que às vezes até pode vir uma proposta para eu mudar de casa, não agora, eu vou fazer um ano aqui, ainda acho muito cedo, por mais que apareçam propostas boas e irrecusáveis, mas eu recusaria atualmente. Eu quero ou me aposentar aqui ou ficar no mínimo uns dez anos, porque aqui ensina muito a gente, aqui é uma faculdade, que eu estou aprendendo muito e esse aprendizado não tem dinheiro que pague.

Observatório – Acho que só por isso você deveria conhecer o Silvio Santos.

Alana Rocha – Meu sonho gente, me levem, é meu sonho conhecer o patrão, conhecer Eliana, o Silvio. O Silvio é um ícone, eu assisto o Silvio Santos desde que eu me entendo por gente, esse homem é um gênio da comunicação, inclusive tem uma carta com os princípios do jornalismo do SBT que é assinada por ele, eu costumo ler sempre. Para mim é um ícone, um grande nome que veio praticamente do nada e construiu um império no Brasil.

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