Claudia Di Moura estreia nas novelas em Segundo Sol e diz: “A Bahia vai ter a oportunidade de se assistir”

Publicado em 15/05/2018

Claudia Di Moura, faz a sua estreia nas novelas em Segundo Sol, nova novela das nove da Globo e promete ser um dos destaques da trama. Zefa, sua personagem, é um dos papéis mais polêmicos de Segundo Sol, ela é descrita como uma mulher calma e amorosa, que sempre pensa mais nos outros do que em si mesma. Claudia foi descoberta na Bahia, pela produtora de elenco da novela, Vanessa Veiga, que se interessou pela atriz que tem 33 anos de carreira, ao ver uma cena dela em uma web-série.

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Você parece meio tímida com a imprensa. É isso mesmo? 

“Timidez mesmo, eu não gosto, acho que isso daqui é a boca de Deus.”

Fala um pouco dessa personagem? Porque você vai representar várias mulheres, né?

“Com certeza. A Zefa é um presente, eu costumo dizer que ela é uma mulher que tem uma alma encharcada de amor, uma mulher que pensa com o útero, uma mulher que passa a vida inteira com as mãos estendidas para a amizade, para o amor, para a criação dos filhos e ela tem uma relação muito forte com os patrões. Ela tem um caso de amor, ela não foi amante de Severo (Odilon Wagner), ela foi o grande amor da vida dele na infância e aí se esbarram no preconceito. Ele se casa com outra mulher, uma mulher branca, ela tem esses dois filhos e continua vivendo dentro daquela casa, nutrindo aquela casa de amor, acreditando que ali estava a família dela e não sei se por maturidade ou ingenuidade, ela acaba tirando do filho Roberval (Fabrício Boliveira) o direito que teve o filho Edgar (Caco Ciocler).”

Você representa centenas de mulheres no Brasil, que abdicam da vida pelo próximo, né?

“Muito embora esteja cada vez mais difícil, a gente ver pessoas abdicando da sua vida para cuidar do outro. Mas isso ainda existe e é aí onde está a minha esperança por exemplo, é a grande esperança de a gente ter uma saída, a saída pela solidariedade.”

Você é muito respeitada no teatro, já fez muitos trabalhos e agora vem para a TV numa novela das nove. Como é para você, uma atriz baiana, representar esse povo e representar o negro também no horário nobre?

“Na verdade, eu já venho representando o meu povo há 34 anos. Quando eu subo no palco é lá que está a minha tribuna. Estar aqui nessa novela das nove não me assusta, esse horário é um horário que eu saio da minha casa para fazer teatro. É importante estar aqui nessa novela, em que a história se passa na Bahia, mas poderia se passar em qualquer outra cidade, representar o meu povo preto, o meu povo nordestino, as mulheres da minha idade, porque é uma chance que estou tendo na minha idade, aos 53 anos eu nunca imaginei fazer novela, eu nunca vim bater na porta da Rede Globo, mas tive a felicidade de estar aqui, fui encontrada lá pela Vanessa Veiga e estar aqui nessa novela dirigida pelo competente Dennis e a criativa Maria de Médici, nas mãos do genial João Emanuel Carneiro, para mim é uma honra e eu vou tentar defender essa personagem como ela merece.”

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A sua personagem vai do céu ao inferno em segundos, né? 

“Ela vai do céu ao inferno e vai levando muita gente, ela guarda mistérios e segredos.”

E como é que está sendo a troca com o Fabrício Boliveira?

“Esse é um dos atores mundiais que nós temos, Fabrício Boliveira. É uma honra, e um prazer. Eu conheço a história do Fabrício, o acompanho desde que ele era muito novo, e sempre foi esse homem irrequieto, politizado, e grande ator. Essa dobradinha, eu espero que o Brasil goste, porque eu estou adorando.”

Apesar de Salvador ser a cidade com maior percentual de população negra do país, ainda existe um apartheid muito forte lá, tem uma separação de classe muito grande. Como é que você vê essa questão de a história do negro ser contada na televisão, de cada vez mais negros aparecerem na televisão, você vê uma diferença do início da sua carreira como atriz para hoje?

“Com certeza. E devemos isso a Ruth de Souza, a Zezé Motta, a Lea Garcia, essas mulheres sim foram as responsáveis pelas quebras das correntes e hoje a gente não precisa quebrar corrente, a gente enfia o pé na porta e entra.”

Você tem alguma memória de uma atriz negra que te marcou muito ver na televisão?

“São várias, a Lea Garcia, a Tais Araújo que é uma jovem atriz que vem mostrando a que veio, a Ruth também, e a minha maior de todas que é a Viola Davis, que não é daqui, mas é de todo lugar.”

A representatividade é muito importante, não é? Porque a criança vai ver na televisão que tem alguém com a cor da pele parecida com a dela, o nariz parecido, o cabelo…

“Exato! A Bahia vai ter a oportunidade de se assistir, tem poucos negros, mas eu acredito que a novela só está começando.”

Mas você acha que é muito ‘mimimi’ essa campanha em prol de mais negros em Segundo Sol?

“Não. Não é ‘mimimi’ não. Esse é um lugar que a gente tem buscado há muito tempo.”

Não em relação ao negro, porque tem gente querendo criar uma certa polêmica de falar que a Globo não quer e tudo mais, porque é como você falou, a novela ainda está começando…

“A novela está começando, eu acredito no João. O João é um divisor de águas na teledramaturgia e ele está muito atento a isso, estamos todos muito atentos, nós não estamos mais com uma venda nos olhos. As pessoas estão aí falando, eu acho essa polêmica, eu acho esse movimento interessante, importante, nós artistas estamos muito atentos, nós vamos sim, eu acho que tem poucos negros, poderiam ter mais, porque nós somos fantásticos nessa Bahia. Nós temos grandes artistas, grandes atores que poderiam estar aqui representando também.”

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Você viu o manifesto que teve? Muitos atores, mais de 45..

“Vi, muitos atores. Mas a Globo tem uma pesquisa, a Vanessa Veiga teve o cuidado de fazer uma pesquisa em Salvador, ela esteve lá quatro vezes, e tem uma pesquisa de mais de quatrocentos cadastros de atores negros e potentes, porque não adianta ser apenas negro, nós somos negros com talento, e é por isso que a gente quer espaço.”

Independente de tudo, os negros são politizados, são à frente de seu tempo e isso é maravilhoso..

“A gente começou a sentir falta de se reconhecer, a gente começou a querer se ver, eu entendendo esse manifesto, esse protesto, porque a Bahia é preta e nós temos grandes artistas, cita-se Lázaro Ramos, mas atrás de Lázaro tem uma ‘renca’, assim que a gente fala. Tem grandes artistas bons, pretos ou não, mas a gente está falando pelo artista baiano, eu represento o artista baiano, a mulher preta, a mulher nordestina e estou super feliz de estar aqui.”

Em que momento você percebeu que você queria ser atriz?

“Na verdade, o que me trouxe para a arte foi o preconceito, o racismo, o racismo da igreja católica, eu sempre quis ser anjo da igreja e nunca pude ser, eu sempre era a primeira menina a chegar para colocar meu nome na lista e me diziam que já estava lotada. Eu cansava de chegar primeiro, madrugava na porta da igreja e aí para eles compensarem a minha tristeza, eles me davam uma poesia para falar, eu colocava a dor de não ser anjo na igreja no poema e isso me fez uma atriz.”

Você falou sobre a representatividade, quem é branco e vai ao cinema sempre vê um pôster que tem um branco estrelando e tudo mais, recentemente vimos o inverso, um pôster só com negros de ‘Pantera Negra’, e aí a gente vê que o preconceito é latente…

“Isso. Ele existe, ele é forte, ele é latente, é muito séria essa questão.”

É até uma questão estrutural, nós jornalistas criticamos o fato da novela não ter negros, mas na redação de jornal também não tem…

“E nem tem negros escrevendo para negros, o branco não pode falar da dor do negro, o branco nasceu salvo. É por isso que a gente está lutando, para termos também diretores negros, escritores negros, dramatúrgicos negros, apresentadores negros e aí a gente fecha esse cerco e fica tudo igual.”

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Você chegou onde você sempre sonhou?

“Eu cheguei onde eu sempre sonhei, quando eu subi pela primeira vez no palco do teatro Castro Alves.”

*Entrevista feita pelo jornalista André Romano

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