“Ele é filho de uma traição da mãe com o patrão”, revela Fabrício Boliveira sobre Roberval, personagem de Segundo Sol

Publicado em 30/04/2018

No dia 14 de maio, o público irá conhecer Roberval, personagem de Fabrício Boliveira em Segundo Sol, novo folhetim das 21h da Globo, escrito por João Emanuel Carneiro. Para o Observatório da Televisão, o ator falou um pouco sobre os traumas que o rapaz viverá após descobrir que é filho do patrão cheio da grana e que toda a sua vida foi uma farsa.

“Ele descobriu sobre a vida dele e que tudo que achava não era verdade em relação aos pais dele”, relatou Fabrício. Com a reviravolta que sofre, Roberval sairá da casa onde cresceu como filho da empregada e se aventurará no mundo para se refazer. Nessa caminhada, ele conhecerá a vilã golpista e cafetina Laureta (Adriana Esteves) e uma nova história começará a ser escrita. Conheça mais sobre esse personagem a seguir:

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Fala um pouco sobre a novela Segundo Sol.

“É uma novela que se passa na minha terra natal. Quer dizer, no meu estado, na minha cidade natal, Salvador, muitas cenas. Eu estou super feliz de poder usar o meu sotaque e poder rever, falar da minha história também, conectada com essa história da novela. É uma Salvador diferente, mais urbana, contemporânea. Então, eu acho que as pessoas vão se identificar bastante com a novela por falar de uma capital que todo mundo conhece bastante pela cultura forte e representa bastante o Brasil, pelo menos para mim. Eu soteropolitano tenho essa impressão (risos). Mas, claro, fala de todas classes sociais, fala de questões que engloba todo o país. Eu acho que vai ser uma novela popular.”

E como será o seu personagem?

“Ele se chama Roberval. O Roberval tem uma história muito insólita porque a vida dele caminhava, ele achava que estava tudo correto dentro do que ele imaginava, e ele recebeu uma história do destino. Ele descobriu sobre a vida dele e que tudo que achava não era verdade em relação aos pais dele. E isso é muito forte para alguém, entender que as suas estruturas sociais não são aquelas. Ele é filho de uma traição da mãe com o patrão. Então, é muito forte entender tudo isso como ser humano e dentro dessa questão social, você representa o cara que serve. De algum jeito é muito difícil lidar com isso e saber que você nasceu no lugar de quem manda. Então, ele está numa dialética muito interessante, eu acredito que o nosso país é formado por essa formação, ou formados por essas diferenças de classes.”

O Roberval é um cara revoltado?

“Eu acho que ele se revolta, revoltado ele já vira o substantivo, como se ele fosse só isso. Ele é um cara tentando conquistar a vida dele, sonhos e tudo que deseja e caminhar, e ele é portado por uma notícia do destino. Então, ele tem que rever todos os pensamentos, as ações, quem ele é, se reerguer. A novela fala disso, dos traumas, como eles entram na gente e como a gente lida com eles quase 20 anos depois.”

A novela vai abordar muito a questão do recomeço. Essa descoberta será a segunda chance do Roberval?

“É a segunda chance de todo mundo desse elenco. O Roberval está tendo a segunda chance dele, mas todo mundo que participa da primeira fase tem essa segunda chance, até as pessoas da segunda fase, também, vão ter suas segundas chances na vida, como é de verdade. A vida parece que quer sempre que a gente se dê bem, a gente é que vai amarrando os caminhos.”

O Roberval é um cara herdeiro de uma fortuna. Ele vai abandonar essa realidade para buscar uma outra realidade para sua vida?

Sim! Agora que você falou, me lembrou o São Francisco de Assis, que é um cara que tem tudo. No caso dele (Roberval), ele é o filho bastardo, então, de algum jeito, para ele estava muito difícil continuar naquela situação. Então, ele vai tentar descobrir a vida dele, quem ele é e refazer a vida dele, frente a todo aquele trauma.

Como será o envolvimento dele com a Laureta, a vilã interpretada por Adriana Esteves?

“Isso é ótimo porque deixa as coisas sem maniqueísmo. É sobre vida real, não existe bonzinhos e mauzinhos, a gente sabe disso. Daí vem para mim a ousadia do João de acabar com o maniqueísmo, a gente está lidando com seres humanos em situações, em tempos, em locais diferentes. Então, como a gente lida com isso? Com a sinceridade, na verdade, sem só julgar o outro e dando as suas próprias ações.”

Como iniciou essa relação dos dois personagens?

“Esse cara sai de uma situação muito delicada de dentro de casa, e aí vai para a vida, vai para a rua. É um garoto de vinte e poucos anos na faculdade, mas sem nenhuma estrutura financeira e familiar forte, então ele está à mercê no mundo. Daí ele encontra a Laureta que, de algum jeito, ajuda, faz trocas com ele. É o mundo se colocando para ‘Macabéa’, talvez. Aí como é que você vai lidar com a sua ingenuidade, o que você conhece do mundo, o que você tem de poder de escolha para lidar com isso de verdade. A Laureta é uma golpista, então, de algum jeito, ele é persuadido, ou ele escolheu também estar ali. Eu acho que vai ficar essa dualidade que é interessante. O tempo inteiro do que você já traz como vilania possível ou do que você já foi persuadido, o que sua situação te trouxe também.”

A Laureta é uma cafetina. O Roberval chega a ser um garoto de programa dela? Durante a coletiva de lançamento, foi mostrada uma cena em que ela apresenta o Roberval para uma mulher.

“Segredo… (risos). É porque essa relação ainda está muito louca. É uma relação que não para. Aquela cena é uma em que ele está trabalhando de pedreiro. Eu posso contar? Contei! (risos). É uma cena de trabalho, mas eu ainda não sei se chega a ser um garoto de programa. Vocês têm que assistir, tem muita coisa. Os nove primeiros capítulos, para mim, contam toda a história do que vem a frente. São capítulos que ninguém pode perder porque vão explicar todos os traumas que aconteceram do futuro.”

Como você se preparou para esse personagem?

“Muito da minha história, por ser de Salvador, e por ter esse sotaque próximo, e por ele passear por lugares que eu conheço bastante. Mas a minha preparação para esse personagem foi física porque eu precisei emagrecer um pouco do último filme que tinha feito do Eric Rocha. A gente teve uma preparação com os atores aqui (na Globo) durante um tempo e muita Bahia, na verdade. É uma história que está muito próxima. Eu tenho lido umas coisas do Jessé de Souza, que é um sociólogo brasileiro que fala bastante da nossa dualidade social. Esse cara para mim foi um cara que mergulhei bastante para entender de onde veio a nossa formação brasileira social, a partir de uma história de escravidão. Esse cara toca muito nesses lugares, e que é um pouco do que a gente trata na história (da novela). Então, um pouquinho de Jessé de Souza, muito acarajé com dendê, muita musculação e malhação, sem álcool durante o carnaval e está aqui o Roberval.”

Fazer parte do elenco dessa novela é um presente?

“Nesse instante, aqui nesse lugar, são os amigos que estou fazendo este ano. Essa novela foi um pedido que eu e a Fabíula fizemos. Há dois anos ela saiu de uma performance que eu estava fazendo e falamos: ‘vamos trabalhar juntos. Vamos pedir? Vamos pedir’. E fizemos o pedido real de trabalharmos juntos e não era só trabalhar na mesma novela, era para ser par romântico, e veio! O universo só quer que as coisas deem certo, você só precisa pedir certo e coletivamente, que aí o pedido fica enorme e faz sentido.”

Após 20 anos, o seu personagem irá voltar com sede de vingança. É essa história mesmo?

“Ele volta com muitos desejos. Ele volta com o desejo de reencontrar aquele amor, de tentar lidar com o trauma. Talvez, a resposta dele seja vingança, mas até para a gente é um mistério também. Ele volta de 20 anos de dor ou reconstrução, de reerguer. Então, fica esse mistério: será que esse cara conseguiu lidar com essa dor que é muito forte? Será que ele vai se vingar? Será que ele esqueceu essa história? O que outro homem é esse que voltou 20 anos depois, pós todo esse trauma? Eu acho que fica uns mistérios abertos. Eu nem sei de quem ele vai se vingar, se ele vai se vingar ou se ele só está tentando se reconstruir dentro daquele trauma, se ele não vai fazer uma sessão de análise em família (risos).”

Você acredita que a vingança é o caminho para algumas situações da vida?

“Difícil medir e julgar alguém. Eu acho que as pessoas têm as suas relações com as suas coisas. É o que eu estava falando, é uma novela que trata além de bem ou mal, de maniqueísmo, é como você lida com as situações da sua vida e qual é o tamanho dos traumas que você tem. E aí tem uma coisa interessante nessa novela, que eu acho que é para além do julgamento do outro, é como você mesmo lida com os seus traumas, o que ficou. Então, até para o público, eu acho que tem um lugar de observação e de repensar os seus próprios traumas. Essa é uma época de noventa e pouco onde todo mundo tem alguma história. Eu lembro que estava conversando com o Vlad (Vladimir Brichta) e ele falou história também desse momento, e a gente começou a falar do que aconteceu pós isso e o que ficou desse momento. Então, eu acho que isso é uma coisa que vai permear muito as pessoas particularmente e observando o que ficou.”

Você já se vingou de alguém?

“Não, eu não me lembro de nenhuma vingança assim explícita. Mas eu acho que os sentimentos estão aí para todos. Eu não posso dizer nunca, e eu acho que ninguém também pode dizer que nunca vai ter tal ou esse sentimento. A vida está livre e a gente recebe e lida com ela de acordo com o tempo e situação.”

Como era a relação do Roberval com a família antes da verdade vir à tona?

“Ele tem uma magnífica. A gente toca em coisas muito delicadas socialmente, que é do trabalho servil, de quem serve, de quem paga, de quem manda. A nossa sociedade brasileira, talvez, por ter vindo de uma coisa da escravidão muito recente, ficou com isso muito impregnado. A servidão é quase um lugar de submissão, e o que não é, é um lugar de profissão. A gente lida com as coisas horizontalmente, tanto que há menos de um ano, ou dois anos, que a gente teve carteira de trabalho para as empregadas domésticas. Isso quer dizer que o trabalho continuava servil, quase escravocrata. Então, a novela trata disso de algum jeito, dessas entranhas da sociedade brasileira, de como a gente lida com quem trabalha dentro da nossa casa, o que tem dentro dessa família colonial e o que ficou disso também. É como se a história de Roberval fosse um resquício desse período também. Eu acho que tem uma lente de aumento para a gente entender por dentro como é uma família. Me lembra muito alguns filmes brasileiros da década de 70, 80, onde tinha isso, não consigo me lembrar os nomes, mas a imagem me traz um pouco dessa discussão.”

O Roberval foi criado com o Edgar, personagem do Caco Ciocler. Existe um amor fraternal entre eles?

“É muito delicado, porque é o caso que a gente conhece do filho da empregada. O filho da empregada dorme na cama, dorme no quarto de visita ou ele dorme no chão? Na casa de vocês tem o quarto de empregada? Então, são essas questões inteiras que a gente vai representando como brasileiro. Será que eu peço para a minha babá ir empurrando o meu filhinho para eu ir numa manifestação? São essas discussões todas que a gente está lidando. Que afeto é esse que a babá tem mais do que os pais, por exemplo, com os filhos dos outros? Onde estão os filhos dessas babás? É um pouco lidando, extraindo um pouco da nossa estrutura brasileira.”

O Roberval e Edgar disputarão o amor da Cacau, personagem da Fabíula Nascimento. Essa situação também vai piorar a relação dos dois, né?

“Deixa tudo mais à flor da pele, e aí é um estopim para a relação pegar fogo. Mas eu não sei se já era uma relação pacífica, uma relação que, talvez, no Brasil a gente não tenha mais como pacificidade essa relação servil.”

Você se orgulha de estar numa novela que retrata a sua terra, a Bahia?

“Não sei se orgulho é a palavra, mas eu fico muito feliz de poder dialogar. Aí é uma questão pessoal mesmo, de poder falar diretamente com o meu povo. Eu sair de Salvador com 13 anos e vim trabalhar aqui na Globo. Então é muito bom poder voltar com uma novela para lá. Nesse meio eu fiz mil e uma outras coisas, não sou um ator contratado, eu fiz toda a minha vida, mas poder escolher voltar agora nesse instante para falar de novo com a minha terra, para mim é uma honra.”

Do que você mais sente falta de Salvador?

“Eu sinto muita falta dos meus amigos. Tem uma coisa de Salvador que é o jeito de lidar com as burocracias da vida. Salvador tem um lugar de bom senso que me atraiu muito, que me atrai, isso que eu sinto saudade. Todos os lugares têm as suas peculiaridades, mas isso é uma coisa de Salvador que eu carrego e gosto muito. Não tem certo ou errado, não tem pode ou não pode, a gente para aqui, senta, conversa e eu descubro qual é a sua situação, e a gente abre uma exceção se for para ter ou não. Então, tem uma relação horizontal, uma paciência, uma observação na questão do outro, que isso me faz muita falta.”

Quando aconteceu na sua vida uma situação de você ganhar um segundo sol? De você ter uma segunda chance.

“Acho que tantas coisas na nossa vida. Eu acho que no cotidiano acontecem sempre coisas delicadas, dramáticas, fortes, leves, e eu acho que a gente tem que ficar bem atento para o que a gente faz, qual é o ponto de transformação da nova vida. Todo mundo tem as suas questões, eu acho que o mais importante é a gente estar observando como é que ela está absorvendo a gente. Eu acredito, por exemplo, que o câncer tem muito a ver com coisas guardadas. Talvez, uma segunda chance seja liberar essas coisas.”

Os teasers iniciais da novela causaram bastante burburinho na Bahia por não terem atores negros representados. O que você acha dessa cobrança?

“Eu acho importante ter um diálogo inteligente. Acho que esse diálogo é o que o público está propondo de forma inteligente e com coisas que são muito mais, para mim, importantes do que quem matou quem. Eles estão querendo falar sobre representação, e eu acho que isso pega todo mundo que está aqui.”

* Entrevista feita pelo jornalista André Romano

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