Tony Ramos faz análise da profissão de ator: “Quem acredita muito no sucesso é grande candidato ao esquecimento”

Publicado em 13/12/2017

Aclamado pela crítica e querido pelo público. Assim é Tony Ramos, que atualmente vive José Augusto na novela Tempo de Amar, na Globo. No folhetim escrito por Alcides Nogueira, José Augusto foi truculento ao descobrir a gravidez de sua filha, Maria Vitória (Vitória Strada), mas a cada capítulo mostra mais humanidade. O ator, que esteve presente no lançamento da biografia de Renato Aragão, conversou com nossa reportagem, e falou sobre a profissão de ator, seu conceito de sucesso, e deu conselhos aos mais jovens a ingressar no mundo da atuação:

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Como é vir prestigiar um homem que dedicou toda a sua vida ao humor como o Renato Aragão?

Eu conheço o Renato há muitos anos mesmo. Só na Globo estamos há 41 anos, mas o conheci na TV Tupi em São Paulo, e sempre me diverti muito ao lado dele, inclusive fizemos um filme juntos. Temos uma grande relação de afeto, uma amizade sincera de muitos anos. Não precisamos ver a pessoa todos os dias para viver essa amizade. É mais que merecido reconhecer nesse homem um dos grandes pilares do humor no Brasil, como o público já disse a vida inteira. Que saudade dos Trapalhões, não é? O Renato tem uma história a ser contada, portanto aplausos a ele.

Os Trapalhões traziam um humor meio lúdico, não é?

Era um humor ingênuo, tinha uma coisa de duplo sentido às vezes, mas era como se um filho mais velho de uma família fizesse uma brincadeira, um humor que não machucava ninguém.

Em entrevista recente você deu algumas dicas para os atores que estavam iniciando na profissão. Se lembra delas?

São várias (risos). Eu estava muito movido pelo que eu estava lendo aquele dia, e sempre repetirei que a primeira pessoa que se tem que respeitar é a si próprio, ter respeito também pelos outros, ser leal e não ter preconceitos. Essa é uma profissão que não admite preconceitos. Você deve se lembrar do espectador, tentar fazer o melhor para o espectador e não acreditar no sucesso. Quem acredita muito no sucesso é grande candidato ao esquecimento. Sucesso é trabalho, mas só isso.

Vivemos há alguns anos uma geração de atores que só estava preocupada em aparecer na Caras, e viver esse tipo de fama, já a geração atual se esforça e estuda muito a atuação, como a Vitória Strada, que nunca havia feito uma novela…

A Vitória veio para ficar, ela é maravilhosa, uma atriz de primeiríssima linha. Ela tem estudo, tem faculdade, não para de ler, sempre interessada, a mesma coisa o Bruno Cabrerizo, que é mais velho que ela, tem uma experiência europeia, e tenho certeza que terão um lindo caminho pela frente. Temos aí atores maravilhosos de gerações diferentes, Cauã Reymond que é incrível, interessado, e um pouco mais velho que ele, Wagner Moura, que é maravilhoso. Teremos grandes atores e atrizes, isso para não citar tantos nomes. Ver o trabalho da Bianca Bin, Sergio Guizé em O Outro Lado do Paraíso, é impressionante, uma turma fazendo um lindo trabalho.

Entrevistei a Debora Evelyn e ela comentou que ela adorou fazer a personagem Kiki de A Regra do Jogo, e disse que o senhor foi peça fundamental para a personagem dar certo.

Personagem dificílima. Ela é muito generosa. Ensaiávamos muito, e eu sempre pedia a ela para passar o texto para não ficar somente decorado, mas saber se alma do personagem estava no texto também.  Ela é uma atriz que dispensa qualquer apresentação.

Você imaginava que Tempo de Amar faria tanto sucesso?

Claro que a gente às vezes é surpreendido. Acabei de me encontrar com o Jayme Monjardim (diretor de Tempo de Amar), vi os números, e são inacreditáveis para o horário de verão. É fascinante. São 40 milhões de brasileiros que assistem diariamente, o que é um prêmio para nós. Temos um time muito afinado, e nunca tivemos nenhum problema. Zero.

Como é para você mudar o jeito de se fazer televisão? Porque com tanta qualidade técnica, o que se faz atualmente é mais parecido com o cinema, não é?

Já há algum tempo não fazemos mais a televisão como a conhecemos. Compro muitos livros sobre isso para ficar antenado.

A Fernanda Montenegro disse uma frase uma vez, que deu até título ao livro da Fernanda Torres, “A gloria e seu cortejo de horrores”. Qual a ligação você faz dessa frase com a sua profissão?

Tem todo um símbolo nessa frase, mas ninguém pode acreditar que quando a gloria acontece, a profissão está resolvida.  Em segundo lugar: não há gloria sem esforço, sem trabalho. Os horrores são as tristezas. A gente perde companheiros que morrem, que ficam sem emprego, estamos sujeitos a isso mas faz parte do jogo.

Na coletiva da novela Tempo de Amar, o senhor disse que não tem telefone celular. Quando nós jornalistas precisamos te contatar, ligamos para sua casa, e mesmo que não esteja o senhor retorna a ligação depois, o que é raro, já que hoje em dia os atores criam uma blindagem contra tudo…

A vida para mim é viver, e eu complico zero minha vida. Claro que tenho horários, uma vida que não apenas é televisão, mas podendo eu devolverei aquela ligação. É mais simples que andar para frente.

O que é a vida para o senhor?

Trabalho, respeito ao próximo, acreditar numa pequena frase do pai nosso: Perdoai nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido.  A vida é afeto e ai daquele que esquecer isso.

E como está o Brasil atual para o senhor?

Brasil triste, um Brasil que evidentemente tem tudo para dar certo, precisa se modernizar no pensamento e depende de nós para escolhermos nossos governantes. Sempre acreditei que é do caos que nasce a luz.

Qual o segredo de uma relação tão duradoura como a do senhor com sua esposa?

É possível. Não tem a ver com paixão, amor é algo muito maior.

*Entrevista feita pelo jornalista André Romano

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