Rafael Zulu define seu personagem Cido em O Outro Lado do Paraíso: “É um cara que brinca com essa bissexualidade dele”

Publicado em 26/12/2017

2017 foi um ano bem agitado para Rafael Zulu. O ator participou do Dança dos Famosos, no Domingão do Faustão, e tem dado vida a Cido, em O Outro Lado do Paraíso. Para o Observatório da Televisão, Rafael falou sobre a sua relação com a dança e sobre o rumo do seu personagem, que vive um romance secreto com o médico Samuel (Eriberto Leão), na trama de Walcyr Carrasco.

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Você emagreceu os 8 quilos, sem treino?

Treinando também, mas muito mais alimentação. Não vai ter um nutricionista que vai falar: “Treina, treina, treina que você vai resolver a sua vida”. É treinar e associar diretamente com a alimentação, e se não fizer isso, já era. Foi ótimo, porque eu estou me sentindo melhor, fisicamente é bacana e é um personagem que tem esse apelo de, de vez em quando, ficar tirando a camisa, e é legal a gente estar seguro, e normalmente só fica seguro quando você está bem.

A classificação etária da novela mudou justamente quando teve uma cena sua tirando a camisa. Como você reagiu?

Eu me surpreendi ali. Quando olhei eu falei: “Eita, o bicho está pegando”. Enfim!

Você mandou muito bem na Dança dos Famosos, do programa Domingão do Faustão. Pretende levar a dança para sua vida?

Já é para a vida! Inclusive, eu continuei a dançar. Lá atrás, e eu estou falando há 15 anos, eu fiz durante seis meses, aula de dança, mas uma vez por semana, uma brincadeira. Aí se passam esses 15 anos, e eu sou convidado para fazer a ‘Dança’, então, realmente, foi muito novo para mim, é muito novo e o que mais me surpreendeu é que ali não é brincadeira, é muito doido. Não é superação, você precisa dar um show literalmente falando, porque o nível era muito alto. O Carlinhos de Jesus falou uma coisa muito interessante comigo, que todo mundo poderia estar na final, e de fato era isso. Óbvio que o Lucas foi um cara que se destacou muito, a Maria se destacou muito, o Nicolas foi crescendo, mas o nível era muito lá em cima. Eu gostei demais, já é para a vida. Profissionalmente falando, é muito importante, porque a história do corpo, a história de se colocar bem, isso é muito doido, porque às vezes eu estou em cena e me vem alguns ensinamentos desse processo que eu tive lá de quase três meses.

A experiência que você teve com a dança há 15 anos, foi em qual gênero?

Foi dança de salão, eu fazia um pouquinho de cada coisa. Mas foi durante seis meses, e não é nada, eu me dei conta de que não é nada. Você cai aqui e tem cinco dias para apresentar uma coreografia no domingo, como se não fosse nada, como se você estivesse seguro, e é desesperador.

E agora você está se dedicando a um estilo de dança específico?

Não, dança de salão de um modo geral. Na academia eu tenho feito muita salsa, e eu não cheguei a pegar salsa, nem zouk, que eu não peguei, porque era repescagem e já tinha passado, e eu fiquei encantado. Danças mais quentes e gafieira, que eu sou apaixonado.

Como foi conhecer o Fausto Corrêa da Silva? O cara que não é o Faustão, que o público conhece por estar todo domingo na televisão..

Eu já conhecia o Fausto. Ele é muito amigo de amigos próximos, como o Luciano, por exemplo, do Thiaguinho, do Neymar e do pai do Neymar, então, a gente já tinha tido a oportunidade de se conhecer fora do ‘Domingão do Faustão’. Ele é um cara sensacional, e eu não estou falando isso à toa, ele trabalha com pessoas que estão com ele há 25, 30 anos, então, é um cara diferenciado sim, e a gente tem que respeitar muito. Uma coisa muito interessante no Faustão, é que ele é muito humano, no português bem dito mesmo, ele é um cara que olha no seu olho, sempre fala uma coisa bacana. Ele poderia ser um cara que só ia te receber ali (no programa), mas não, ele é um cara muito cuidadoso, ele te coloca no colo. A festa de confraternização foi na casa dele, como a brincadeira da pizza que ele faz lá, e é impressionante o cuidado que ele tem em receber as pessoas. A esposa dele é maravilhosa, o filho, que eu tive a oportunidade de conhecer. Ele é um cara muito interessante, e é uma entidade da televisão brasileira. Estar perto dele é legal.

Você deixou seu nome no ‘Domingão do Faustão’, porque participou do programa de número 1.500. Conta um pouquinho como foi essa experiência…

Isso é muito louco! A gente já sabia que seria 1.500 programas. Daí o que você imagina? Que o Faustão vai chegar e fazer um carnaval porque são 1.500 programas. E ele começa o programa nem valorizando, justamente, porque para ele aquilo ali é trampo, é mais um, e isso é muito legal. Seria bacana ter um floreio? Também, mas o jogo é para ser jogado, isso é muito interessante.

O Cido, seu personagem em ‘O Outro Lado do Paraíso’, vai conseguir tirar o Samuel, interpretado pelo Eriberto Leão, do armário?

Vai! Vai porque eu acho que nada supera o amor. Foi sinalizado logo no início das mudanças pelo nosso diretor Amauri, que teve muito cuidado com isso, que o Cido brinca, o Cido encontra no Samuel o parque de diversão dele, é a Disney dele. Ele pega as mulheres, acaba se apaixonando por uma menina, mas quando chega aqui, ele brinca, de repente, porque não teria uma oportunidade de comprar um relógio bacana, de ter uma roupa legal, então, ele encontra no Samuel uma oportunidade disso. Só que ele toma um tiro, o Samuel move mundos e fundos para que ele se salve, fica internado num quarto particular, um quarto de luxo e essa chave dele vira. E ele para e olha: “Caramba, o cara não está fazendo isso tudo por mim à toa. Ele está me olhando com outros olhos”. É isso.

O Cido gosta dessa relação?

Se ele gosta da fruta? Ele gosta da fruta também. Não é possível, ninguém vai brincar ali no parque de diversão se não gostar. Assumidamente, ele é um cara que brinca com essa bissexualidade dele, mas é muito bem resolvido. É impressionante como tem gente assim, tem gente que fica com uma mulher e pega um cara. Isso não muda a masculinidade do Cido, na real, ele é bofe, só que gosta de se aventurar com outros bofes.

Como é contracenar com o Eriberto Leão?

É um presente trabalhar com esse cara. A gente dividia teatro no Leblon, a gente tomava um chopp no Bar Informal, mas a gente nunca tinha trabalhado juntos. Ele é um cara que eu adoro, um grande ator e a gente tem uma frase: “Ainda bem que é com você”. Ainda bem que é com quem a gente gosta, né? Porque são cenas quentes. O Walcyr é um autor ousado, na última novela, ele deixou isso muito claro, e uma hora, inevitavelmente, ele vai pesar a mão. É legal a gente trocar com alguém que a gente confia e tem tranquilidade em cena.

Como foi construir esse homem sem cair na caricatura?

O nosso cuidado era como as pessoas iriam enxergar esse casal. Eu acho que o Cido tem que ter essa masculinidade para o público acreditar nele. E tem uma coisa muito interessante na minha pesquisa que era o tipo de homem que o gay gosta. Será que ele gosta mais de gay ou mais de homem? E que tipo de homem a mulher? Então eu falei: “O Cido tem que ser bofe”. Para o gay e a mulher olharem e falarem: “Eu quero esse cara”. Então esse cara tem que ser interessante, perder 8Kg, estar bonito, bem apresentado. O meu laboratório, a minha pesquisa foi muito em cima do mundo mesmo, da minha observação. Eu recebo muitas cantadas, muitas brincadeiras de homens e de mulheres, então é sinal de que está tudo certo, o meu jeito funciona, daí eu pensei: “Vou emprestar um pouco do Zulu para o Cido”. Essa coisa da masculinidade, mas ao mesmo tempo da sensibilidade.

O Cido e o Samuel vivem uma relação de interesse, de oportunismo. Pode nascer um sentimento amoroso entre eles no futuro?

A gente gravou uma cena muito bacana em que o Cido começa a entregar que gosta do Samuel, que sente falta, e até então ele era: “Eu preciso de um negócio. Preciso dessa grana”. E de repente ele se olha e fala: “Desculpa, eu não estou aqui só por causa da grana”. É isso.

Ele vai terminar o relacionamento com a mulher, né? Vai morar com o Samuel, né?

Verdade, ele vai morar na mesma casa. É muito legal isso.

O Walcyr colocou na trama referências de ‘Madame X’, do ‘Conde de Monte Cristo’, e agora na história de vocês tem uma referência de ‘Dona Flor e seus Dois Maridos’,  porque a Susy, personagem da Ellen Rocche, está grávida do Samuel. Como é essa preparação?

Eu até falei com o Eriberto e a Ellen que ia entrar na casa deles e que achava maravilhoso. E tem nessa casa ninguém menos que Dona Adnéia (Ana Lucia Torre), que é uma fofa e faz esse contraponto muito bem da comédia. É um núcleo que ele (Cido) vai ficar muito leve, no meu ponto de vista, ele vai vir para dar um respiro e a gente vai se deliciar.

Existe uma possibilidade do Cido ficar com os dois? Você seria a Dona Flor?

Será? Eu não sei mesmo. Eu estava lendo (os capítulos) e chegou uma hora que foi meio que tombando para esse lado. Seria uma loucura, uma delícia artisticamente falando, mas uma loucura, porque ele vai acabar com a vida do Samuel. Na verdade, ele já frustrou a menina Irene (Luciana Fernandes), tadinha, porque ele assume mesmo essa parada. Só vai para a casa do Samuel porque está, realmente, de fato gostando dele. Vamos ver, é o Walcyr que decide.

Como está sendo a repercussão nas ruas? O que as pessoas estão falando para você?

A novela das 21h, tem uma coisa muito doida, porque às vezes a gente não tem dimensão do alcance. Como viajo, quase todo final de semana, eu estou fora do Rio, tenho sentido muito isso e eu me surpreendi, porque o meu personagem entrou na segunda fase. A segunda fase aconteceu, sei lá, tem três semanas, ou seja, muito pouco tempo. É uma novela que as pessoas estão assistindo, as pessoas estão falando muito da novela.

Que tipo de recadinhos você passou a receber nas redes sociais?

Vários tipos de recados. Rola uma brincadeira saudável de homens e mulheres. Normalmente, quando acaba uma cena, eu vou no meu direct, e está meio bombado. São mensagens sempre muito carinhosas, eu me sinto muito feliz, honrado por receber tantas mensagens bacanas, e as pessoas têm por mim um respeito muito legal. A vida é muita troca, reciprocidade, eu também respeito o outro e é bacana, porque eu sempre recebo de uma maneira muito carinhosa.

Vai rolar mudanças no comportamento do seu personagem?

Ele vai começar a falar muito o termo “bicha”. E quando eu comecei a ler pensei que isso, no momento em que a gente vive hoje, é muito pesado. Mas as cenas são tão leves que vira uma brincadeira. Quem olhar realmente com os olhos da brincadeira, vai encarar de uma maneira muito saudável, sadia.

Quando você recebeu a sinopse do personagem e viu que ele seria homossexual, em algum momento, você remeteu ao conflito que houve com o Sergio Menezes e o André Gonçalves? A rejeição do público?

Eu não pensei nisso, até porque eu não recebi a sinopse como se ele fosse homossexual, muito pelo contrário. Ele não é um homossexual, ele é um cara que brinca de menino e brinca de menina, tem uma bissexualidade, o que é uma coisa completamente diferente. Eu fiquei apaixonado quando vi que ele ia se apaixonar por uma mulher e, num dado momento, ia se envolver com um psiquiatra. Comecei a ler aquilo e vi que era muito bom e muito mais comum do que a gente imagina, uma parte da nossa sociedade vive essas aventuras. Eu, Rafael, não teria cabeça para isso, porque eu tenho a minha opção. Sou um cara que sei exatamente o que eu quero, e eu não sei mesmo se teria cabeça para me relacionar com duas pessoas ao mesmo tempo. Na verdade, não é opção que fala, é orientação.

Você utilizou aplicativos de relacionamentos, paqueras durante a sua pesquisa?

Não precisei. Eu acho que está tudo muito aí, né? Nós temos amigos, a gente liga televisão e vê, a gente tem referências. A gente teve a oportunidade aqui de fazer workshop com o Eduardo Melevski, que ele apresenta um universo de filmes, de séries com boas referências, com bons atores nacionais e internacionais. A minha pesquisa é sempre muito bem baseada em cinema, baseada em atores que já fizeram coisas parecidas. Então, eu não precisei ir a fundo assim, mas isso é muito legal.

Você ouviu pessoas na vida real que têm histórias parecidas com a do seu personagem?

Eu comecei a fazer a novela e recebi uma mensagem de um grande amigo, amigo de muito tempo lá de São Gonçalo, e ele dividiu comigo exatamente a história do Cido. Eu sabia, tinha uma certa desconfiança, ele tinha uma queda e ao mesmo tempo, se relacionava com meninas e, de repente, ele falou que precisava falar comigo e detalhou a história da vida dele. E é doido, porque ele nunca falaria para mim, se não fosse nessa situação. Ele falou que começou a rejeitar homens, porque na cabeça dele, tinha que gostar de mulher por causa da sociedade, da igreja, do mundo, mas chegou uma hora, que ele se libertou. Hoje, ele vive super bem, não abriu para o mundo, mas quando ele dividiu isso comigo de maneira tão rica, em detalhes, eu falei: “cara, eu não tinha ido tão fundo e não tinha ouvido de ninguém”. Eu dividi isso com o Eriberto, e é impressionante como eu entro em cena hoje com o texto que ele me escreveu, foi fundamental. O melhor laboratório que eu fiz foi ele ter me mandado isso.

O Brasil é o país que mais mata trans e homossexuais, e é também um país onde o homossexual se mata. Como é para você contar essa história em uma novela das 21h?

Isso é uma loucura! Eu acho que responsabilidade aumenta, ao mesmo tempo é uma delícia desfrutar disso aí, levantar essa bandeira e, acima de tudo, mostrar que a pessoa faz exatamente o que ela quer. Hoje tem um achismo, uma coisa de todo mundo querer dar pitaco, opinião na vida do outro. Hoje, cada vez mais, isso está caindo por terra, a decisão é minha, a orientação do cara depende realmente do que ele quer. Eu acho que a gente poder falar disso no horário que a gente está falando, da maneira que a gente está falando, é fundamental e, acima de tudo, é preciso. Às vezes, uma palavra que você fala é o bastante para uma pessoa se jogar, por exemplo: “Você é muito feio”. Como, às vezes, um “Você é muito bonito”, salva uma pessoa que dormiu pensando em se jogar, aí ela pensa: ‘Eu sou bonita para alguém’. Daí eu sou gay, sou preto, eu sou lilás, eu sou o que for.

A sua  representatividade como negro bem sucedido é muito bom também, né? Muita gente fala que você está atrás do Neymar, mas não sabe que você é grande, né?

Eu não sei se muita gente fala isso, porque muita gente sabe exatamente o que eu sou. O Neymar é jogador, o Luciano é apresentador, o Thiaguinho é cantor, o Medina é atleta, o Bruninho é atleta, eu sou ator, e isso é muito claro. O que une a gente, eu estou falando desse grupo ‘diretoria’, que é uma brincadeira nossa, é uma coisa chamada afinidade. E afinidade eu continuo tendo com todos os meus amigos de São Gonçalo, como com os amigos que encontrei na vida. Quando eu digo que muitas pessoas não pensam dessa maneira, é porque o que eu recebo é o contrário, eu recebo muitas mensagens tipo: ‘Que legal a amizade de vocês, muito bacana’. Eu sou um cara que tenho um leque de amigos, e a história de ser bem sucedido, que também é muito relativo, é porque eu sou muito inquieto profissional, o meu ator que me ramificou para todas as outras coisas. Então, eu tenho um bar? Eu tenho um bar. Tenho uma empresa de tapioca? Tenho. Estou agora enveredando para a construção civil? Sim. O que me levou para esses lugares é, acima de tudo, a certeza de que a nossa profissão é muito oscilante, e eu acho que hoje a gente vive num momento que dá para todo mundo buscar fazer algo a mais. A gente vive num país com uma crise absurda, que hoje o nosso salário não dá mais para a gente dar contar da nossa vida. E eu, naturalmente, tenho a coisa de empreender. Desde de sempre, minha mãe disse que eu pegava bombinha para vender, eu juntava bala e vendia, então, a história de fazer negócios está muito dentro de mim.

Você também tem o carisma que não é vendido no mercado, né?

Não é vendido no mercado. Isso aí vou deixar para as pessoas falarem, porque pode ser arrogante demais. O Rafael gosta de fazer outras coisas, mas tudo que me leva para as outras coisas é o meu lado ator e, inevitavelmente, o fato da gente ter uma imagem, ser uma pessoa conhecida, acaba abrindo portas. Mas aí a porta abre, você vai entrar e vai ter que se virar lá dentro. A porta pode até abrir, mas chega lá dentro você vai ter que sentar e ter discurso para defender a sua bandeira.

E como foi para sua família, receber a notícia de que você estaria em mais uma novela das 21h. e dando vida a um personagem bissexual?

A minha família é incrível, uma família que compra exatamente tudo o que eu me proponho a fazer.

*Entrevista feita pelo jornalista André Romano.

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