sem rumo

Falta de identidade comprometeu Império

Trama circulou entre o drama realista e a "farofa"

Publicado em 05/11/2021

A obra do autor de novelas Aguinaldo Silva tem duas fases mais importantes: as comédias regionalistas e os dramas urbanos. Da primeira, vieram clássicos como Tieta, Pedra Sobre Pedra e A Indomada. Já a última rendeu sucessos populares, como Senhora do Destino, Fina Estampa e Império.

Império, sem dúvidas, foi um sucesso em 2014. Embora não tenha repetido a boa performance na edição especial de 2021, a saga do Comendador (Alexandre Nero) tem suas qualidades. Entretanto, faltou à trama uma linha de condução mais bem definida. A trama começou realista, com jeitão de saga, mas assumiu uma porção “farofa” no decorrer de sua trajetória que a enfraqueceu.

A novela tem um ótimo protagonista. José Alfredo, embora tenha claramente envelhecido mal, é um personagem instigante, e Alexandre Nero criou cacoetes e maneirismos que o tornaram um tipo marcante. Ao redor dele, duas outras ótimas personagens, Cora (Drica Moraes/Marjorie Estiano) e Maria Marta (Lilia Cabral) que, cada uma a seu modo, tiravam o herói de seu prumo.

No entanto, nada disso foi muito bem aproveitado. Estas relações entrelaçadas se perderam enquanto Império tentava se encontrar dentro de sua própria proposta. Sim, porque o jeitão de saga, com uma primeira fase envolvente e bem contada, dava a entender que Império tinha a mesma pegada de Senhora do Destino: um drama realista (folhetinesco, claro, mas realista).

Porém, no decorrer da trama, esta proposta vai se perdendo. A impressão que dá é que, com Império, Aguinaldo Silva buscava uma trama mais rebuscada, diferente da farofada sem sentido vista em Fina Estampa, sua novela anterior. Mas, aos poucos, a “farofa” de Fina Estampa voltou com força.

Império perdeu o compromisso com a própria realidade que criou para se aventurar num pastiche meio obscuro. Isso ficou bem claro com o perfil da vilã Cora, que começa a novela dramática, mas vai ganhando cores tragicômicas no decorrer da obra. Aliás, a substituição de atrizes, quando Marjorie Estiano reassume a personagem, flertou com o realismo fantástico, tão presente nas obras dos anos 1990 de Aguinaldo.

Ou seja, Império tentou ser Senhora do Destino, mas acabou ficando mais parecida com Fina Estampa. Autorreferente como ele só, Aguinaldo Silva acabou fazendo de Império uma síntese de sua obra, ao mesclar características de todas as suas fases. Mas, juntas, estas características tornaram a obra um tanto sem sentido.

Por isso, por mais que sua boa audiência na exibição original e seu Emmy de melhor novela tenham credenciado a trama para uma reprise, o fato é que esta edição especial se revelou mal escolhida. O resultado fraco desta reapresentação deixou claro que o público não sentiu falta desta novela.

*As informações e opiniões expressas nessa crítica são de total responsabilidade de seu autor e podem ou não refletir a opinião deste veículo.

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