Quem matou Marcelo?

Assistir A Favorita sabendo quem é a vilã dá nova dimensão à novela

Enigma da primeira fase ganha novas camadas ao rever a trama de João Emanuel Carneiro

Publicado em 02/06/2020

Atração do Globoplay, a novela A Favorita completa 12 anos de sua estreia nesta terça-feira (02). A trama marcou a estreia de João Emanuel Carneiro no horário das nove da Globo e chamou a atenção pela sua proposta pouco usual num folhetim. O autor apresentou suas duas protagonistas, Flora (Patrícia Pillar) e Donatela (Claudia Raia), mostrou a rivalidade entre ambas, mas não deixou claro quem era a mocinha e quem era a vilã. As duas tinham uma versão distinta de um crime cometido anos atrás, e o espectador foi convidado a escolher um lado.

Na época da estreia, João Emanuel Carneiro afirmou que, com A Favorita, ele queria discutir os julgamentos que fazemos das pessoas. E, para isso, ele pregou uma peça no público: apresentou Flora como uma vítima injustiçada, enquanto Donatela era arrogante e presunçosa. Ou seja, levou o público a “comprar” a versão de Flora do assassinato de Marcelo (Flavio Tolezani) e a condenar Donatela. Parecia que Flora havia passado 20 anos na prisão por um crime que não cometeu. Mas não era bem assim.

Cerca de dois meses depois da estreia, A Favorita virou o jogo. Num acerto de contas entre Donatela e Flora, esta admitiu ser uma assassina. Na verdade, ela saiu da prisão disposta a convencer a todos de que era inocente, armando para condenar Donatela. Ou seja, era ela a vilã, e Donatela a mocinha. A revelação fez parte do público se sentir enganado, mas logo a audiência embarcou na perseguição de Flora à Donatela, e A Favorita se tornou um irresistível sucesso. Por isso mesmo, assistir novamente a novela no Globoplay, já sabendo da verdade, torna a experiência de acompanhá-la ainda mais interessante.

Nuances

Nos primeiros capítulos de A Favorita, Flora aparece com um rosto angelical, voz doce e insistindo numa versão bastante crível do assassinato de Marcelo. Porém, já sabendo que é ela a vilã, a audiência percebe que, na verdade, ela já estava colocando em prática o jogo que armou enquanto esteve presa. Já sabendo que Flora é movida por uma vingança insana, somada a uma obsessão à Donatela, o público tem uma nova dimensão da novela, o que a torna ainda mais interessante.

Enquanto isso, Donatela se mostra uma mulher bastante equivocada. Casada com Dodi (Murilo Benício), um bandido de marca maior, ela faz vista grossa diante dos crimes do marido. Mas, em nenhum momento, participa diretamente deles. Ou seja, quando não se sabia que ela era a mocinha, era fácil colocá-la no mesmo balaio de Dodi. Sabendo que não é bem assim, o espectador consegue perceber que a falha de Donatela foi ser cúmplice. O que é condenável, mas compreensível, afinal ela está casada com o bandido.

Além disso, Flora começa seu plano tentando se aproximar de Lara (Mariana Ximenes), sua filha que foi criada por Donatela. Quando percebe que Flora está cercando a filha, Donatela faz de tudo para impedi-la, e acaba metendo os pés pelas mãos. Na primeira exibição, era mais um indício de que ela era a vilã. Mas, agora, fica claro que ela fez tudo o que fez justamente para proteger Lara, já que Donatela é a única que sabe do que Flora realmente era capaz. Ou seja, ela arma contra Flora, mas faz isso movida pelo desespero.

Clássico

Esta revisita à A Favorita, então, mostra como o texto de João Emanuel Carneiro foi engenhoso nesta primeira fase da trama. Apesar de espalhar vários indícios de que Donatela era a vilã, o autor também prepara o terreno para a grande virada. Assim, quando ela finalmente acontece, tudo é bastante crível. Esta é a beleza deste início de A Favorita.

Depois, quando a vilã é revelada, A Favorita perde um pouco desta dubiedade latente, tornando-se um folhetim mais clássico. Mas, ainda assim, se mostra engenhosa conforme vai desvendando o passado das protagonistas e explicando o fascínio que Flora nutre por Donatela, que se torna cada vez mais doentio. E isso faz com que Flora se mostre uma vilã das mais carismáticas. Divertida, debochada e muito cruel, ela é destas vilãs que ficam para sempre. Por estas e outras, A Favorita é um clássico recente, que merece ser redescoberto sempre.

*As informações e opiniões expressas nessa crítica são de total responsabilidade de seu autor e podem ou não refletir a opinião deste veículo.

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