Análise

Estreia de Luiz Teixeira rompe “padrão” incômodo do Globo Esporte

Emissora demorou três anos para ter um repórter negro em seu principal programa esportivo

Publicado em 23/04/2021

O Dia de São Jorge nunca mais será o mesmo para o jornalista Luiz Teixeira. Com a bênção de Ogum, ele estreou nesta sexta-feira (23) como repórter do Globo Esporte em São Paulo e rompeu um “padrão” injustificável. Há três anos, a redação paulista do principal programa esportivo da TV brasileira não tinha um profissional negro empunhando o microfone da emissora.

A chefia de esporte da Globo em São Paulo tem provado com ações que passou a se preocupar não apenas com a qualidade, mas também com a diversidade de seus jornalistas. Em março, promoveu a repórter Gabriela Ribeiro a apresentadora e escalou, pela primeira vez em seis anos, uma mulher para comandar a tradicional atração diária da hora do almoço.

Faltava quebrar outro tabu inexplicável: por que não há repórteres negros no Globo Esporte em São Paulo? Desde Abel Neto, que em abril de 2018 deixou a emissora e estreou no Fox Sports, apenas homens brancos, com cabelos curtos e bem aparados, trabalharam nesta função no programa. E assim o programa seguiu durante longos três anos. Duas mulheres negras ganharam espaço na reportagem: Camila Silva, demitida em novembro daquele ano, e Denise Thomaz Bastos, que começou como produtora.

Além de trabalhar com competência, Luiz Teixeira resgatou ao Globo Esporte paulista algo que telespectadores negros só sentiam quando Thiago Oliveira, outro bom exemplo de representatividade, apresentava o programa: orgulho. Este sentimento não pode ser desprezado em um país com 56% da população preta ou parda, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Este público, ao sintonizar a TV na hora do almoço desta sexta, viu um repórter da mesma cor, usando dreads e oriundo da “quebrada” (Taboão da Serra, na Grande São Paulo).

Da periferia à periferia. O jornalista de 32 anos começou pisando no terrão de um campinho de futebol em Cidade Tiradentes, bairro do extremo leste da capital paulista, para apresentar ao público uma ação solidária de um time de várzea. A trilha sonora do material, concluída ao som de Emicida, “entrega” outra dedicação de Luiz Teixeira. Ele não é somente um repórter negro no Globo Esporte. É um ativista. Há um ano, decidiu deixar seu cabelo crescer. Já teve black power e, em seguida, dreads. Na rádio BandNews FM, onde trabalhava antes da Globo, lançou o podcast Pretoteca, exaltando a cultura negra.

<em>Reportagem de Luiz Teixeira no Globo Esporte ReproduçãoTV Globo<em>

A reportagem que abriu o Globo Esporte desta sexta tirou a ansiedade de Luiz Teixeira, que passou os últimos dois meses ensaiando e treinando antes de finalmente aparecer na TV. Acompanhou colegas na cobertura dos times paulistas e durante jogos, já que também deverá ser escalado para transmissões do SporTV e do Premiere.

Vestido e armado com as armas de São Jorge, Luiz Teixeira reforça como é necessária a representatividade, ideia tão importante quanto ignorada por quem não enxerga preconceito a um palmo de distância. Assistir ao Globo Esporte e não liga se todos os jornalista seguem o “padrãozinho homem-branco-do-cabelo-cortado” é um sintoma do racismo estrutural, aquele que está enraizado na sociedade como um costume. Mau costume. Com ações, o jornalismo da emissora promove a sua reparação histórica.

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