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Bolsonaro é “caluniador e mentiroso”, diz protagonista de briga histórica no Roda Viva

À coluna, jornalista Rui Xavier relembra bate-boca com Orestes Quércia na TV Cultura: "Ouvi 14 xingamentos"

Publicado em 29/09/2021

Duas palavras resumem o sucesso do Roda Viva, que completa 35 anos nesta quarta-feira (29): “caluniador” e “mentiroso”. As ofensas proferidas por Orestes Quércia (1938-2010) ao jornalista Rui Xavier, em 1994, transformaram o tradicional programa da Cultura em palco de uma das brigas mais famosas da TV. O barraco conquistou a internet, virou meme e ainda está na memória do “rival” do político, que topou relembrar o momento histórico em entrevista exclusiva à coluna.

Rui Xavier era editor de política do jornal O Estado de S. Paulo quando foi convidado a participar do Roda Viva com candidatos à Presidência da República em 1994, entre eles Quércia, pelo PMDB. Ao ser indagado sobre as denúncias de enriquecimento ilícito do ex-governador de São Paulo, ele se descontrolou e, com o dedo em riste, repetiu sucessivas vezes que o jornalista era “caluniador e mentiroso, mentiroso e caluniador!”.

Quase três décadas depois, o arranca-rabo ganhou ainda mais relevância nas redes sociais em vídeos, montagens, gifs, redublagens e outros formatos. “Caluniador e mentiroso” virou meme, e Rui Xavier não se incomoda: “Isso não desaparece. Na época, o Quércia era um político importante no Brasil. Além de ter sido governador, era um expoente do PMDB. É normal que apareça”.

Um fã do meme chegou a contar a quantidade de ofensas ditas por Quércia: foram 125 “caluniador”, 78 “mentiroso”, 45 “safado”, 27 “canalha” e 16 “cala a boca”. O jornalista alvo dos gritos “sofreu” com as gozações até da família: “Tenho um sobrinho que, quando era mais novo, olhava para mim apontando o dedo e falava: ‘Caluniador e mentiroso!’. Mas ele me xingou de 14 nomes: puxa-saco, malandro, vagabundo, safado, pilantra… falou tudo! Foram 14 nomes. Isso mostra que o cara perdeu completamente o controle”.

“Pensei que Quércia fosse me bater”

Também chamou a atenção do público a reação de Rui Xavier, que não ficou calado e devolveu os xingamentos para Quércia. Em um momento do embate, o candidato à Presidência deixou seu assento e se aproximou do jornalista do Estadão. O apresentador Heródoto Barbeiro chamou o intervalo comercial para conter os ânimos.

“Chegou um momento em que ele levantou, parecia querer brigar comigo. Achei que ele iria me bater. Eu também me levantei porque me senti acuado. Depois vi que foi uma bobagem pensar que ele fosse me agredir, ele não tinha muita saúde já na época”, recorda o convidado do Roda Viva.

No intervalo, não houve pedido de desculpas nem outra aproximação mais amistosa por parte do ex-governador. “Cada um ficou de um lado do ringue”, brinca Rui Xavier. Os telespectadores, contudo, suspeitaram que os dois trocaram socos no estúdio da TV Cultura em razão de um pedaço de guardanapo grudado no rosto de Quércia, confundido com um curativo.

“Um assessor pegou um guardanapo e enxugou a testa dele, só que um pedaço de papel ficou colado e o programa voltou. No dia seguinte, o pessoal queria saber o que era aquele papel, porque todo mundo achou que no intervalo houve uma briga e ele saiu machucado, e era só um papel grudado”, conta.

Rui Xavier em 1994 e atualmente
Rui Xavier em 1994 e atualmente (Montagem/Reprodução/TV Cultura/Faixa Livre)

“O ‘caluniador e mentiroso’ de hoje é Bolsonaro”

A repercussão da briga foi imediata. Na mesma noite, Rui Xavier foi reconhecido e cumprimentado por clientes de um restaurante onde foi jantar após o Roda Viva: “Eu não sabia que o programa era tão visto nem que o Quércia era tão odiado”. Depois do episódio, o jornalista e o político nunca mais se encontraram.

Atualmente com 76 anos e afastado das redações, Rui Xavier trabalha como freelancer e integra o conselho da ABI (Associação Brasileira de Imprensa). Telespectador do Roda Viva, costuma ouvir de colegas que falta ao programa jornalistas mais contundentes como ele, principalmente na edição com Jair Bolsonaro, em 2018. Para o “rival” de Quércia, o presidente é o “caluniador e mentiroso” da vez.

“Como diria Chico Buarque, ele ‘inventou a tristeza’ [trecho da música Apesar de Você]. É pior do que Orestes Quércia, sem nenhuma dúvida. O que este cidadão está fazendo com o Brasil, destruindo o que foi conquistado a duras penas. Está acabando com a economia e, principalmente, com a auto-estima do brasileiro. Nosso povo está mais triste, mais preocupado não só com a inflação. Nunca um político se manifestou tão ostensivamente contra pobres, negros, LGBTs, contra tudo. Acho que o presidente Jair Bolsonaro é um mentiroso, caluniador”.

Rui Xavier, jornalista

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