Luto

Opinião: Tarcísio Meira e a dor da perda do meu primeiro namorado

Galã de tantos filmes, novelas e histórias, ator refletia nossas aspirações de romance e aventuras na tela

Publicado em 12/08/2021

Não haverá outro galã como Tarcísio Meira. Herdeiro direto dos astros de Hollywood para a nossa TV, ele atraiu várias gerações para os sonhos românticos das telenovelas. Tal como os atores do cinemão norte-americano, fazia com que não apenas as mulheres mas também os homens prestassem atenção na sua voz potente, porte físico e largo sorriso num rosto marcante.

Começo dos anos 1970 e a novela em cartaz na TV Globo era a clássica Irmãos Coragem, a trama de Janete Clair que se tornaria um clássico tupiniquim — a novela que está para o romance televisivo brasileiro como Os Irmãos Karamázov, de Dostoiévski, está para a literatura russa.

Tarcísio viveu o protagonista, João Coragem. De acordo com a TV Globo, a novela foi um sucesso tão retumbante que o seu penúltimo capítulo rendeu mais audiência do que a final da Copa do Mundo de 1970.

Eu era muito, muito pequena, mal começara a andar e ainda estava aprendendo a falar. Mas bastava a TV estar ligada na novela em preto e branco, ou passar alguma chamada durante a programação, para eu chegar perto da TV, apontar para o João Coragem de Tarcísio Meira e mostrar para todo mundo: “É o meu namorado”! E ai de quem negasse, pois eu começava a chorar.

Eu dizia isso para quem aparecesse em casa. Tenho apenas vaga lembrança dessas imagens, soltas, dispersas na memória difusa que é a da nossa primeira infância. Mas minha mãe (e como sinto falta dela e dessas histórias!) contou e recontou essa passagem ao longo de toda minha vida, da adolescência até a fase adulta, daquele jeito que só as mães sabem. Até no dia quando os namorados de verdade começaram a aparecer em casa!

Relato aqui essa breve história pessoal, pedindo licença à magnífica dama Glória Menezes, para ilustrar o papel do galã na nossa vida e como ele vira referência para a construção de um ideal de romance no nosso imaginário.

Tarcísio Meira
Tarcísio Meira na novela Cavalo de Aço de 1973 Foto DivulgaçãoTV Globo

Tarcísio Meira não era apenas um rosto bonito. Teve escola de atuação: começou fazendo teatro em São Paulo com nomes como Sérgio Cardoso e Antunes Filho, foi para a televisão e fez cinema.

Foi o Irmão Coragem valente e honesto, foi a nossa mais marcante imagem de Dom Pedro I no cinema, no filme Independência ou Morte (1972, de Carlos Coimbra). Fez par romântico com as maiores beldades — Vera Fischer, Sônia Braga, Luma de Oliveira, Bruna Lombardi, entre tantas outras –, além da única esposa ao longo da vida, Glória Menezes. O casal estreou como par romântico em 25499 Ocupado , a primeira novela diária na nossa televisão, em 1963.

Verdadeiro ícone de nossa cultura, Tarcísio Meira ganhou dois troféus APCA de melhor ator de Televisão (prêmio concedido à categoria a partir de 1972). O primeiro deles, em 1975, foi como intérprete na novela Escalada. E novamente no ano 2000, foi premiado pelo seu desempenho na minissérie A Muralha, de Maria Adelaide do Amaral, que também levou o Grande Prêmio da Crítica no ano.

Ele encarnou papéis de vilão, fazendo-se feio em muitos momentos. Por meio dele, vivemos tantos sonhos, deixando-nos levar por personagens sedutores, maldosos, enigmáticos, engraçados. Tarcísio Meira viveu todos eles e até a idade mais avançada.

Assim como boa parte do Brasil, estou triste hoje com sua morte, aos 85 anos de idade. Permanecem nos acervos, arquivos e catálogos de filmes todos os personagens que ele nos deu de presente ao longo da carreira. Para mim, fica a doce saudade de um tempo quando ele era mesmo o meu namorado.

© 2024 Observatório da TV | Powered by Grupo Observatório
Site parceiro UOL
Publicidade