Polarização

Bolsonaro, Lula, a imprensa e a pandemia

A que nos levará essa guerra na imprensa, travestida de prestação de serviço?

Publicado em 14/05/2021

Amigos da Coluna Por Trás da Tela, eu escrevi sobre a pandemia de covid-19 no ano passado e me vejo na obrigação de falar mais um pouco. Primeiro porque atravessamos a pior parte de uma jornada árdua, cansativa, depressiva, a ponto de não ser mais possível imaginar o quão melhor estaríamos se tivéssemos comprado vacinas com antecedência e não na bacia das almas.

Segundo porque o papel da imprensa não satisfaz meus anseios como cidadão. Eu sou jornalista, cidadão e me sinto confortável em criticar a imprensa, até porque é uma crítica à minha pessoa. Mas, eu nunca pequei por omissão e as casas antigas nas quais eu servi sabem disso, principalmente aqueles que estão nelas e se acomodaram no trabalho.

Quando eu acompanho a imprensa como brasileiro, sinto uma guerra política que atrapalha a nossa conscientização sobre a covid-19. Eu vejo muitos colegas que querem divulgar números para condenar ou absolver o presidente Jair Bolsonaro. O Brasil é polarizado entre direita e esquerda, mais precisamente entre Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva, no momento. E o lugar do candidato moderado está sendo disputado cabeça a cabeça.

O candidato de centro-esquerda, ou centro-direita, ou ‘centro-centro’, sabe que tem chances ao pegar os restos da polarização e disputa um lugar no partido como candidato – nem que seja para investir até o ultimo centavo no papel de protagonista da guerra à doença. Aquele que será o Messias, o homem que erradicou a covid-19 no Brasil.

Mas, enquanto o nome moderado não surge, a briga é entre Lula e Bolsonaro mesmo – acho que Lula sai candidato ou segura na mão de alguém, como fez com Dilma. Bolsonaro não vai aceitar ninguém no lugar dele, a não ser que os inimigos consigam tirar o coelho da cartola e o derrubem judicialmente – acho improvável.

Então, há os jornalistas que querem ou são comandados a praguejar contra o governo, não adianta disfarçar que todos percebem. E os jornalistas que enaltecem a direita. Quem perde com isso? Os doentes, os hospitais, a economia, a psicologia. Psicologia? Sim. O número de depressivos com a vinda da covid19 é tão preocupante quanto a doença.

As pessoas estão temerosas quanto à covid-19 e quanto à fome. O Brasil padece do básico, que é saúde, moradia e educação. Saúde não temos, ainda mais com hospitais lotados. Moradia vamos perder sem dinheiro. E a educação já perdemos todas as vezes em que a única solução é aula on-line. Nossas crianças não têm aula, não têm computador, não têm wi-fi, não têm lanche, não têm professores, não têm dignidade.

E qual o papel da imprensa? Atacar Bolsonaro ou Lula. De um lado os jornalistas que mamaram nas tetas do rebanho de Lula, que encarnou a paz, o amor e o conchavo. Não importavam os desafetos políticos de Lula, mas quais as alianças que seriam feitas em nome do dinheiro e da saudação das dívidas dos jornalistas empresários.

Do outro lado a imprensa ‘bolsonarista’, que, como em uma guerra, combate sem piedade os inimigos. Tampouco tem misericórdia com aqueles que indiretamente sofrem as consequências dos atos ilícitos, praticados em nome de Deus, família (não a nossa) e das pseudovantagens éticas e morais.

De um lado a direita, do outro a esquerda e no meio disso tudo o povo. Como sempre a guerra destruindo civilizações. E hoje o Brasil não enfrenta a guerra bélica, mas é tão ruim quanto ver sangue.

A guerra da imprensa travestida de prestação de serviços é uma das piores que pude ver e sentir. Então, os ‘Bolsonaristas’ dizem que as vacinas estão chegando e os ‘lulistas’ dizem que não. Há um desespero insano na divulgação de números.

A velha tática de desestabilizar o povo, com caos e medo, para em um futuro próximo reinar sobre as cinzas. De um lado o governo que fala que está tudo bem, de outro a oposição que desmente, com a opção de trazer um futuro melhor. Que futuro?

Impossível acreditar em números, verdades, comoções, coragem. A discordância sempre fez parte do mundo jornalístico, desde que apurada a informação. Como eu posso crer em notícias editadas, comentários tendenciosos, de empresas que precisam de dinheiro e pensam primeiro em se manter, não falir, não quebrar ou não se endividar mais ainda?

O que eu sei de covid-19, sei por própria experiência. Eu fiquei doente, contraí a doença, fui tratado em um hospital de excelência e pude ver o esforço dos profissionais de saúde que mal dormiam para atender a demanda. Eu fui abençoado por ter a oportunidade de ter um hospital. E quem não tem ajuda médica?

Eu passei a respeitar ainda mais a doença e no filtro de notícias infundadas, tenho a certeza que devemos lavar as mãos, manter distância, não se aglomerar, usar máscara, álcool em gel, esperar a vacina, quietos, como se estivéssemos em uma moradia pós-apocalíptica, esperando a poeira radioativa passar.

A vacina vai chegar, pessoas em situação de pobreza vão precisar ainda mais de ajuda, um dia a pandemia vai passar e teremos que recolher os cacos da esperança. A reconstrução física e moral será hercúlea. Dentre as várias lições que aprendemos: “devemos escolher muito bem quem são os jornalistas, e as empresas que nos passam a informação”.

A vacina será o primeiro passo de um País que ainda chora seus mortos. Mas ainda estamos preocupados em combater Bolsonaro ou Lula. Mesmo que para isso tenhamos que acordar em uma terra devastada por dor.

Como em um final de conflito bélico, nas próximas eleições presidenciais veremos gente sorrindo e gente chorando. Os que sorriem esconderão o gosto amargo que as mortes provocaram em seus espíritos, amputados pela vaidade e a necessidade de poder.

*As informações e opiniões expressas nesse texto são de total responsabilidade de seu autor e podem ou não refletir a opinião deste veículo.

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